Sexta-feira, 13 de dezembro, enquanto alguns ainda discutiam se é o dia do azar ou apenas mais uma data para evitar gatos pretos, o Alcohol and Tobacco Tax and Trade Bureau (TTB) dos Estados Unidos resolveu dar uma tacada que muitos de nós já aguardávamos: oficializou o American Single Malt Whiskey como uma categoria distinta no vasto universo dos destilados. A nova regulamentação, publicada no 27 CFR Part 5, entra para a história como um marco que promete sacudir não só o mercado americano, mas o mundo inteiro. E aqui, do nosso lado do balcão tropical, resta perguntar: quando o Brasil vai começar a jogar esse jogo de gente grande?
Primeiro, vamos ao que interessa: o que é, afinal, esse tal de American Single Malt Whiskey? Segundo o TTB, para carregar esse rótulo tão pomposo, o destilado precisa ser produzido em uma única destilaria nos Estados Unidos, feito 100% de cevada maltada, destilado a não mais de 160 proof (80% ABV), envelhecido em barris novos ou usados de carvalho, e engarrafado com no mínimo 40% ABV. Simples, direto e com um toque de "toma essa, Escócia!", porque até então, single malt era praticamente sinônimo de Highlands e destilarias centenárias que mais parecem cenários de filmes da BBC.
Mas não se engane: essa decisão do TTB não veio apenas por iluminação divina ou por inspiração patriótica. Foi fruto de um lobby muito bem orquestrado por destilarias artesanais, como a Shanahan's, do Colorado, que produz seu American Single Malt Whiskey desde 2004. Sim, meus amigos, há 20 anos esses pioneiros vinham lutando para que o termo American Single Malt ganhasse o reconhecimento oficial. Segundo o Difford's Guide, esse movimento foi encabeçado pela American Single Malt Whiskey Commission, uma organização criada em 2016 com o objetivo claro de pressionar as autoridades para regularizar a categoria. E, convenhamos, eles fizeram um trabalho digno de nota: com um mercado crescente e destilarias artesanais explodindo de criatividade, o TTB não teve muita escolha além de ceder.
O movimento é genial porque coloca os americanos no jogo dos whiskies premium de forma mais consistente. Imagine só: você está em um bar em Nova York, diante de uma carta de bebidas que lista desde bourbons encorpados do Kentucky até ryes picantes de Indiana, e agora, um single malt americano com aquele sotaque texano ou vibe californiana. É uma jogada de marketing tão certeira quanto uma tacada de golfe de Tiger Woods. E convenhamos, os americanos são mestres em contar boas histórias.
Enquanto isso, no Brasil... Aqui, o nosso mercado ainda tenta engatinhar no quesito regulamentação. Temos a cachaça, que felizmente foi devidamente protegida e definida como categoria própria (e com razão, diga-se de passagem), mas fora isso, vivemos uma espécie de "Velho Oeste" das normas. A produção de whisky no Brasil, por exemplo, segue regras soltas, sem a rigidez e a especificidade que vemos em outros mercados. Enquanto o TTB cria categorias com precisão cirúrgica, por aqui mal sabemos diferenciar o que é whisky de qualidade e o que é "bebida com gosto de madeira líquida". Pela nova regra, é exigido o envelhecimento por no mínimo 2 anos, em barris de carvalho de até 700L, sem a adição de qualquer produto ou substância - exceto o caramelo, que deve estar mencionado no rótulo. E aqui no Brasil, seguimos permitindo que nossa cachaça seja transformada em um "chá de madeira" com a utilização de lascas e pedaços de pau no lugar de barris e o precioso tempo.
Voltando aos americanos, a decisão é também uma resposta a um movimento que vem ganhando força no mundo dos destilados: a valorização do local e do artesanal. Pequenas destilarias americanas, como a Shanahan's e outras de estados como Oregon e Washington, começaram a experimentar com single malts, misturando técnicas tradicionais escocesas com uma pitada de ousadia americana, como envelhecimento em barris de vinho californiano ou acabamento com madeiras nativas. Agora, com a benção do TTB, elas podem finalmente colocar no rótulo algo que faça sentido e comunique valor.
E o consumidor brasileiro, como fica? Fica na torcida, como sempre. Porque enquanto nos EUA eles regulamentam até o tamanho do sorriso do bartender, por aqui seguimos lutando para educar o público sobre a diferença entre whisky e whisky paraguaio. A chegada dos American Single Malts ao Brasil deve ser lenta, já que a importação de destilados premium ainda enfrenta preços proibitivos e uma carga tributária que faria qualquer um de nós derramar uma lágrima sobre o copo. Mas, para os entusiastas dispostos a pagar o preço (e eu sei que vocês existem), vale a pena ficar de olho. Esses single malts americanos prometem não só surpreender, mas também expandir os horizontes de quem já acha que viu tudo.
No final das contas, a decisão do TTB é mais do que uma questão de mercado; é uma lição de como criar valor com clareza, estratégia e, claro, um bom lobby. Se os americanos conseguiram transformar uma ideia em um padrão mundialmente reconhecido, por que nós, com nossa riqueza de sabores e criatividade, não conseguimos fazer o mesmo? Enquanto refletimos sobre isso, vou ali abrir um single malt americano que estava guardado, só para brindar essa sexta-feira 13 que entrou para a história. Quem sabe, com sorte, a próxima novidade seja nossa.