No começo de sua jornada, no século passado, o alimento orgânico representava principalmente uma opção de saúde individual para um nicho de consumidores urbanos de renda média-alta. Nos últimos 15 anos, esse mercado passou da infância para a adolescência, crescendo globalmente mais de 500% como área cultivada e como valor comercializado, além de 12 vezes em número de produtores. Ao sair do nicho, o produto orgânico também mudou sua narrativa, afirma o monumental relatório global O Mundo da Agricultura Orgânica 2018, que acaba de ser lançado pela IFOAM – Organics International, resultado do trabalho de mais de 300 pesquisadores em 120 países.
Seu crescimento na próxima década, que promete continuar em ritmo superior aos 10% ao ano, será fomentado por atributos indiretos. Por um lado, a crescente preocupação do consumidor por origem, segurança e qualidade pode ser atendida com a transparência proporcionada pela certificação do produto orgânico. Por outro, as práticas da agricultura orgânica podem oferecer algumas soluções aos dilemas ambientais que ameaçam a agricultura como um todo, desde a qualidade da água até as mudanças climáticas.
A recente e crescente associação de orgânico com qualidade é confirmada pelo destacado desempenho, na produção, dos três países tradicionalmente líderes na cadeia da gastronomia, ou seja, Itália, França e Espanha.
Outra novidade recente foi a entrada da China no mercado, tanto em termos de produção – com 2,2 milhões de hectares de área cultivada – quanto de consumo, com movimentação superior a R$ 25 bilhões em 2017, com crescimento de 42% sobre o ano anterior. Movida principalmente por preocupações de segurança sanitária, a demanda chinesa parece explodir. Contribui assim para a principal incerteza que, de acordo com o relatório, dominará o mercado nos próximos anos: a capacidade da oferta acompanhar o crescimento da demanda. Recentemente, a demanda por orgânicos cresceu 1,5 vez em relação à área cultivada, e logo a defasagem poderia pressionar os preços.
Ao contrário do que muitos imaginam, o frequente diferencial de preço não guarda muita relação com os supostos maiores custos do sistema de produção orgânico. O principal elemento que influencia o preço diz respeito à escala e à infraestrutura desse mercado, enquanto o segundo está vinculado ao tempo em que velhos e novos produtores se adaptam à crescente demanda, pois não há estoques equivalentes aos do mercado convencional.
De acordo com o relatório, as duas megaoperações de consolidação que ocorreram nos últimos dois anos – compra da Whole Foods pela Amazon e a da Whitewave pela Danone, atingindo mais de R$ 100 bilhões no total – logo geraram uma tendência de redução nos preços ao consumidor, por enquanto nos Estados Unidos, que seguem como o maior consumidor de orgânicos do mundo.
Um elemento a ser monitorado é o aparecimento de uma nova atividade, a da aquacultura orgânica. Dominada por enquanto pela China, e com realidades significativas na Islândia, no Vietnã e na Escandinávia, promete crescimento principalmente nos setores do salmão, dos frutos do mar e das algas.
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Quanto ao Brasil, parece crescer em ritmo mais modesto em relação à média global, mas com a ressalva de que o relatório encontrou dificuldade em contabilizar alguns dados e, portanto, os valores totais devem ser inferiores à realidade, especialmente no setor do café. Estima-se, contudo, uma área de pelo menos 750 mil hectares de produção e um mercado superior a R$ 4 bilhões.