Agora que não restam dúvidas de que chocolate branco é, sim, chocolate, nada mais justo do que a gente se redimir com uma espécie de reparação histórica: organizar um grande teste, nos moldes do Paladar - coisa que os fãs do estilo sempre pediram, mas nós, por puro preconceito, nos recusávamos a fazer.
Para organizar a degustação às cegas, garimpamos barras de chocolate branco em mercados, lojas especializadas e fábricas de chocolate bean to bar. Escolhemos 12 amostras, todas de chocolate branco puro, sem adições como frutas, castanhas, flocos de arroz. A receita poderia abarcar, no máximo, uma baunilhazinha para aromatizar, já que as opções industrializadas usam e abusam do tal do aroma artificial.
A prova ocorreu no quintal do Preto Cozinha, em Pinheiros, na tarde da última segunda-feira. O júri, escolhido a dedo, foi formado pelo chocolatier Caio Corrêa, pelo jornalista Diego Ortiz, pela sommelière Lena Mattar, pela chef do AE Cozinha, Walkyria Fagundes, e por Rhaiza Zanetti, que é sous chef do Tuju.
As barras foram avaliadas quanto ao aspecto visual, ao aroma, à textura e ao sabor. E o resultado é categórico: menos é mais. Quanto menos aromatizantes artificiais, gorduras vegetais (que não a própria manteiga de cacau) e emulsificantes, melhor. Chocolates feitos apenas com açúcar, leite em pó e manteiga de cacau deixaram seus pares cheios de aditivos (cá entre nós, desnecessários) para trás.
O uso de gorduras vegetais alternativas dá-se para baratear o produto. “A manteiga de cacau é um ingrediente nobre e caro”, ressalta Zelia Frangioni, degustadora certificada de chocolates e autora do Chocólatras Online. Segundo as normas da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), o chocolate branco “deve ser constituído de, no mínimo, 20% de sólidos totais de manteiga de cacau” - o que é muito pouco. Marcas de chocolate bean to bar usam de 35 a 40% de manteiga de cacau (de qualidade) em suas receitas.
Por não ser desodorizada (como é a versão utilizada na grande indústria), a manteiga de cacau natural empresta ao chocolate os sabores e aromas do cacau - tornando desnecessária a adição de aromatizantes na receita. “Como nós nos acostumamos a consumir chocolates com aromatizantes, é normal estranhar um chocolate sem isso. Mas esse é o chocolate verdadeiro. Então, depois de um tempo, a gente se acostuma e não quer voltar para o artificial”, pondera Zelia.
As melhores barras de chocolate branco
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As 12 marcas avaliadas em ordem alfabética
O aroma artificial de baunilha e a gordura persistente na boca deram pistas aos jurados de que se tratava de uma amostra industrializada. Mesmo assim, eles gostaram do que provaram. “Comparada aos seus pares, é um produto bom”, concordaram os jurados (R$ 15,90; 100g)
Foi por muito pouco que a amostra não conquistou um lugar no pódio. Ela agradou quanto à textura - macia, cremosa e com bom derretimento -, ao aroma de cacau e à doçura equilibrada. Só perdeu pontos pelo sabor excessivo de baunilha que, apesar de ser de boa qualidade, tornou a barra um tanto enjoativa (R$ 16; 40g)
O sabor equilibrado, com notas de leite e de manteiga de cacau e açúcar na medida, rendeu à amostra o terceiro lugar no pódio. Os jurados também elogiaram o bom derretimento na boca. “Dá para ver que se trata de um chocolate menos industrializado”, arriscou um jurado (R$ 16,90; 90g)
O chocolate apresentou defeitos como textura arenosa e baixo derretimento em boca. Tem aroma artificial típico das amostras industrializadas, assim como um excesso de gordura que persiste na boca. Um retrogosto amargo, como destacaram alguns jurados, fez a amostra cair muitas posições no ranking (R$ 7,31; 80g)
O excesso de açúcar da receita apareceu até na textura do chocolate, cheia de cristais. Apesar do bom derretimento em boca, a amostra perdeu ainda mais pontos pelo sabor, “muito artificial”, e pelo residual de gordura (R$ 5,41; 82g)
Apesar da textura áspera e do aroma artificial, é um chocolate que certamente tem o seu público. O sabor é de leite em pó (aquele mais famoso, sabe?!), concordaram os jurados (R$ 27,90;100g)
Cadê a manteiga de cacau? Cadê o leite? Segundo o júri, o chocolate apresentou aroma e sabor muito artificiais, além da doçura em excesso. “Não tem gosto de nada, só de açúcar”, resumiu um dos jurados (R$ 7,21; 80g)
O chocolate faz mesmo jus ao nome: “muuuito cremoso”, elogiaram os jurados com unanimidade. A textura é macia, com bom derretimento. Enquanto no nariz, sobressai o ótimo aroma de cacau, na boca, quem manda são as notas lácteas, além do açúcar na medida certa (R$ 25,50; 80g)
O chocolate, que os jurados perceberam como “artesanal”, tinha muito potencial. Textura macia e cremosa, com bom derretimento, aroma de cacau e açúcar equilibrado. Só deslizou no sabor, que se resume à manteiga de cacau, além de deixar um retrogosto levemente amargo. (R$ 18; 42g)
O produto surpreende antes de chegar à boca, com o aroma intenso (e gostoso) de cacau. Tem sabor suave de manteiga de cacau e leite, é doce na medida e apresenta bom derretimento, sem deixar um residual de gordura na boca. “É fácil perceber que se trata de um produto de qualidade” (R$ 22; 60g)
“Muito artificial, muito gorduroso, muito doce, muito ruim”, resumiu um dos jurados. A barra apresentou defeitos que eram esperados nas opções industrializadas, mas o sabor, “estranho”, que não era de leite nem de cacau, desagradou ao júri e tirou qualquer chance do chocolate passar na média. (R$ 15,90; 100g)
“Sem graça”, definiram os jurados. Além da cor pálida, os jurados reclamaram da falta de sabor do chocolate e do excesso de açúcar. A textura arenosa fez a amostra perder ainda mais pontos e despencar no ranking (R$ 7,31; 80g)
Conheça o júri
Caio Corrêa
Chef pâtissier e chocolatier, em 2014, foi campeão na degustação de ovos de Páscoa do Paladar com o seu ovo crocante. Como professor de confeitaria, deu expediente na Le Cordon Bleu e na Chocolate Academy. Hoje, atua como consultor em sua área.
Diego Ortiz
Jornalista e sneakerhead, declarou-se um grande conhecedor das marcas de chocolate branco disponíveis no mercado. Na degustação, mostrou ao que veio quando cravou: “esse é o Laka, tenho certeza”. Acertou em cheio.
Lena Mattar
Comunicadora gastronômica, sommelière e autora da newsletter de receitas que leva seu nome, gosta mais de chocolate branco do que das versões mais escuras. “Quando quero comer chocolate, vou de branco.”
Rhaiza Zanetti
Sous chef do restaurante Tuju - que, aliás, está prestes a reabrir as portas -, já adoçou a vida de muita gente com seus bombons refinados.
Walkyria Fagundes
Chef do AE Cozinha, é ela quem assina as sobremesas caprichadas do restaurante. No teste, conta que se surpreendeu com a variedade de amostras brancas disponíveis. “É um mundo vasto de possibilidades.”