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Restaurantes e Bares

‘É crucial recuperar a mão de obra da gastronomia’, diz restaurateur Marcelo Fernandes

Dono de marcas como Kinoshita, Mercearia do Francês e Tradi fala sobre os oportunidades e desafios do mercado de gastronomia

Marcelo Fernandes no Kinoshita. Foto: Alex Silva/EstadãoFoto: Alex Silva/Estadão

Marcelo Fernandes é uma figura emblemática no cenário gastronômico brasileiro. Restaurateur e dono de marcas como Kinoshita, Attimino, Tradi e Mercearia do Francês, ele também faz parte da história da gastronomia: fundou, em 1999, ao lado de Alex Atala, o restaurante D.O.M.. Ao longo dos anos, Fernandes testemunhou e moldou as transformações do setor que, hoje, traz desafios acerca de qualidade de produtos e retenção de talentos.

A seguir, confira a entrevista com Fernandes da série Paladar Convida, onde discutimos os mesmos assuntos com entrevistados que passeiam por diferentes setores da gastronomia.

Como vê a chegada da inovação no setor de gastronomia? Há receptividade?

Estamos cada vez mais atentos às inovações e à tecnologia, acompanhando de forma dinâmica o que acontece em nível mundial. Hoje, temos acesso a informações e conteúdo que nos permitem interagir com colegas até no Japão, como é o meu caso. Enquanto isso, na prática, a inteligência artificial pode influenciar na cocção, tornando-a mais rápida. Os chefs podem agora buscar conteúdo de pesquisa de maneira mais dinâmica e rápida, encontrando informações com apenas um toque no celular. No entanto, eu ainda incentivo os chefs a se dedicarem aos livros antes de verificar algumas informações na internet. Os equipamentos também estão mais avançados, o que acelera os processos. Por exemplo, na Mercearia do Francês, vi uma situação em que o chef programou o forno combinado e só voltou quatro horas depois, quando o prato já estava pronto. Mas é crucial não perdermos nossas raízes, já que muitas coisas ainda são feitas de forma artesanal.

Ambiente do restaurante Kinoshita, de Marcelo Fernandes Foto: Alex Silva/Estadão

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Quais os principais desafios que existem, hoje, no setor de gastronomia? Como superar isso?

O que está me impactando muito, e preciso dizer isso, são duas áreas: os colaboradores e a dinâmica da política de aumento de preços. São as questões que demandam nossa atenção. No que diz respeito aos profissionais, é essencial unirmos esforços e investirmos em escolas profissionalizantes para reintegrar aqueles que estão fora do mercado, restaurando assim a qualidade que nosso mercado já teve no passado: um ambiente de formação, rico em conteúdo e transmissão de conhecimentos. Devemos fornecer suporte aos profissionais, incluindo aulas de inglês e outras condições que muitas vezes não são devidamente reconhecidas. É crucial recuperar a mão de obra da gastronomia, desviada para setores como o Uber e os call centers. No nosso ramo, é essencial que os profissionais estejam dispostos a se dedicar genuinamente, mesmo que isso signifique trabalhar à noite ou nos feriados. Mas é fundamental comunicar isso às pessoas e investir em capacitação por meio de escolas e pequenos grupos, estabelecendo uma base sólida para o futuro.

Hoje, o que faz a diferença no setor? Como se destacar? Qual dica daria para quem está começando?

A principal dica que destaco em minhas aulas e conversas é a importância da resiliência, dedicação e comprometimento genuíno. O mercado está passando por muitas mudanças e instabilidades, o que levou muitas pessoas a saírem do segmento. Aqueles que se dedicarem e demonstrarem comprometimento terão destaque em meio a essas flutuações.

Outro produto do cardápio de Marcelo Fernandes: a hamburgueria Tradi Foto: João Erbert Lima

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O que falta para o setor de gastronomia ganhar mais força no Brasil e se igualar com outras potências globais?

Aprendemos muitas coisas com colegas europeus e da América Latina, mas também exportamos muito conhecimento. Há uma troca significativa acontecendo. O Brasil está fazendo avanços notáveis na qualidade dos insumos. Anteriormente, não tínhamos a mesma qualidade que temos agora. Acredito que nós estamos nos aproximando do padrão europeu e japonês, o que abre oportunidades de igualdade no mercado lá fora.

Muito se fala de uma transformação digital, com as pessoas indo cada vez menos aos restaurantes e pedindo mais comida de casa. Vê isso como uma realidade?

Vejo essa questão de uma maneira diferente. Embora a conveniência de permanecer no conforto do lar e utilizar aplicativos que entregam comida em casa facilite a vida doméstica e cotidiana, bem como o dinamismo do comércio e das empresas, nunca substituirá a experiência presencial. Os restaurantes oferecem um ambiente único, com clima, energia e uma atmosfera acolhedora que não pode ser replicada em casa. A experiência de restauração, a forma como nos revitalizamos, precisa acontecer presencialmente, não em casa. Os restaurantes precisam se reinventar nesse sentido, criando ambientes mais descontraídos e acolhedores para os clientes. No pós-pandemia, não se trata apenas de hospitalidade, mas também de proporcionar acolhimento e encantamento aos clientes.

Por fim, como vê sua empresa daqui cinco, dez, quinze anos? Como acredita que ela vai se transformar para se adequar às novas gerações?

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Como profissional do segmento, sempre traço uma linha do tempo para compreender como as coisas estarão daqui a 20 anos. Prevejo uma integração crescente de tecnologia nas cozinhas, automação nos serviços, mas também a criação de ambientes mais democráticos, interativos e abertos. Imagino a oportunidade de interação entre diferentes culinárias no mesmo espaço. Este é o caminho. A curto prazo, ainda podemos esperar uma certa resistência à mudança, ligada à formação e à cultura estabelecidas. Acredito que ainda teremos de três a cinco anos para navegar na forma atual das coisas. O hábito de se alimentar em casa e no escritório crescerá, mas não se limitará apenas à entrega. As pessoas buscarão mais oportunidades de eventos em casa e no trabalho, desfrutando do conforto de suas casas, casas de praia ou de campo. Equipes qualificadas levarão a experiência do restaurante para dentro do lar, proporcionando uma experiência única.

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