Nada é por acaso. Guilherme Mora nasceu sem distinguir a própria casa da Cabaña del Asado, restaurante que o pai, Alexandre Mora, tinha no bairro do Butantã. Dormir no banco de espera, servir mesa e entrar na cozinha oscilavam entre rotina e brincadeira. Clientela, amigos e família se confundiam. E continuam se confundindo.
Vai daí que, ser CEO do Grupo Ás (também do Osso, Carne, Incêndio e Drunks) aos 22 anos, pareceu normal. Hoje, aos 25, Gui é a cara do Cór, primeiro restaurante especializado em carnes maturadas a seco, isso é, dry aged, do Brasil.
Afinal de contas, o casarão no Alto de Pinheiros foi descoberto por ele mesmo, numa dessas coisas do destino: “Eu estava no banco detrás do carro e gritei, nossa, pai, que lugar lindo. Dá para fazer um restaurante aí!”.
No caso, o imóvel tinha sido um, o Fidel, mas a placa para alugar não emocionou mais ninguém além do adolescente. Obstinado, não se deu por vencido e passou semanas negociando por conta com a imobiliária.
O contrato orgulhosamente logrado coincide com os 7 anos do Cór. Ou 62 e meio em idade de cachorro, numa comparação bastante justa para quem sabe como é o corre e a evolução de um restaurante.
Para desenvolver o conceito, o jovem Mora foi audacioso: fez o pai ir à Espanha comer a “melhor carne do mundo”, a do El Capricho. Em Jimenez de Jamuz, o templo carnívoro é idolatrado por abater os próprios animais e maturá-los em arcas a temperatura controlada durante pelo menos três meses.
Fosse pouco, ele seduziu Renzo Garibaldi a implementar o projeto. Chef e carnívoro confesso, o peruano teve a pachorra de abrir um açougue-restaurante (o Osso Original) no país com menor consumo per capita de carne bovina da América do Sul. Com isso, tornou-se referência mundial em maturação a seco de carne in natura e foi convencido a trazer sua expertise para São Paulo.
Campeão de poker, Guilherme é um jogador voraz. Tanto assim que sucesso assegurado, agora reajusta o conceito da casa: “No começo o desafio era fazer o público acostumado à carne fresca, até pela fartura de gado no país, pensar em dry aged para além de kobe beef ou de eventos como a Churrascada”.
Com o obstáculo vencido, por que não lançar novas dificuldades à própria partida? “Não sabíamos como o público reagiria ao dry aged, reagiu melhor que o esperado. Agora que também temos o Osso, pensei qual seria a próxima etapa e para mim é clara a escolha por vaca velha”, explica ele.
Nessas, o Cór converte-se em uma embaixada de vaca velha. Com todo respeito. Senhoras de ao menos 7 anos, com vida decente e apelativo excesso de gordura localizada: “No momento tenho uma tonelada e meia de animais entre 8 e 14 anos na câmera, a maior parte com mais de 11 anos”.
Muitas das idosas damas também passam por um tratamento de maturação, que agrega ainda mais valor: “Outro dia provamos um t-bone de 720 dias, que de 16 quilos passou para 2. É invendável, porque custaria mais de R$ 4 mil o quilo”, exemplifica Guilherme.
Em compensação, já botou na roda um corte especial de wagyu puro de 9 anos de idade, maturado por 90 dias, por quase R$ 1000 o quilo. Hoje, mantém à disposição dos comensais preciosidades como 80 quilos de picanha de mais de 11 aninhos, outros 300 quilos de bife de chorizo, uns 200 de fraldão e pouco mais de 100 quilos de ancho (a partir de R$ 240 o quilo).
Que conste: a tendência é que vacas velhas sejam mais macias, suculentas e imponentes ao paladar. Como acontece com o vinho de vinhas mais antigas, elas desenvolvem aromas e sabores mais complexos. No Cór, a dica é combiná-las à cebola assada (R$ 38) e ao arroz biro-biro com alho-poró (R$ 42).
O atrevido Mora, sentado no banco que lhe serviu de berço e hoje auxilia a fila de espera do restaurante, porém, vai além. Bem além – gosta de harmonizar os cortes com champanhe e vinhos naturais e, sempre que possível, cobri-los, sem dó, com caviar.
Cór Gastronomia
Praça São Marcos, 825, Alto de Pinheiros. Qua. a sex., das 12h às 15h e das 18h às 23h; sáb., das 12h às 00h; dom., das 12h às 18h. Tel.: (11) 3726-2908