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Seleção carioca

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Servindo famoso banquete russo, restaurante Dona Irene faz 60 anos em Teresópolis

Fundado por casal de imigrantes o lugar tem uma história épica que passa pelos principais acontecimentos do século passado

Arenque à la creme Foto: Bruno Agostini / Estadão

Você chega e é recebido por moças com trajes típicos da Rússia. No salão há objetos que remetem ao país, com itens de decoração como matrioskas, louças e quadros. Há nas paredes uma coleção de prêmios, como as placas com as duas estrelas atribuídas à casa pelo Guia 4 Rodas, quando este era o mais importante louro da gastronomia brasileira.

Logo que nos sentamos à mesa tem início o serviço, com uma rodada de entradas frias que tem cerca de dez itens, um deles alcoólico, a deliciosa vodca feita na casa, melhor companhia para esta etapa da refeição: estamos no restaurante Dona Irene, em Teresópolis, fundado em agosto de 1964 por um casal de imigrantes/refugiados russos. Portanto, está completando 60 anos.

Os zakuskis abrem a refeição Foto: Bruno Agostini / Estadão

Poucos restaurantes no mundo possuem uma história tão épica, passando por alguns dos momentos históricos mais marcantes do século passado. Antes de contarmos como acontecem os banquetes ali, um aperitivo histórico que ajuda a aguçar o interesse em fazer uma refeição neste restaurante verdadeiramente especial, que frequento regularmente há mais de 40 anos, desde o início dos anos 1980.

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A vida do casal Mikhail Flegontovich Smolianikoff  e Eupraxia Wladimirovna Smolianikoff foi uma grande aventura. Tudo começa em 1917, quando ele era capitão do exército czarista, na Sibéria. Foi expulso de seu país com a Revolução Russa. O casal atravessou o deserto de Gobi a pé e chegou até a China. Prosperaram, fazendo negócios com couro. Mas, então, em 1949 outro episódio histórico afetou Miguel e Irene, como vieram a ser conhecidos no Brasil, muitos anos depois. Sim, a Revolução Chinesa de Mao Tsé-Tung. Foram expulsos do país, por conta de seu passado ligado aos monarcas russos. Cruzaram o mundo. Com muitas paradas no caminho. Chegaram a Teresópolis. Viviam de fazer linguiças e vodca. Miguel também dava aulas de russo, me contou Hisbello.

Borscht e pirozhkis Foto: Bruno Agostini / Estadão

Então, em 1964, vem o Golpe Militar no Brasil. Aulas de russo não eram uma atividade profissional recomendada, por óbvias razões. Com poucos recursos, Eupraxia passou a cozinhar algumas de suas especialidades para vender, como os pirozhkis, fofos bolinhos fritos de carne moída. Seus vizinhos, Maria Emília e Hisbello Campos, começaram a ajudar a levar clientes do Rio, em pequenos grupos. A casa dos dois siberianos acabou virando um restaurante informal, que logo ganhou fama, essa que reverbera até hoje. Os brasileiros ficaram sócios dos russos, que morreram entre os anos 1980 e 1990. Em 2021, foi Hisbello que nos deixou.  Mas Maria Emília, aos 90 anos, completados em julho, continua firme e forte à frente da casa, ao lado da filhos, Ângela e Paulo.

Vodca artesanal feita na casa Foto: Bruno Agostini / Estadão

Para a nossa sorte. Assim, é dada continuidade a essa história, e continuamos a nos esbaldar com o banquete inspirado nos nababescos anos czaristas pré-revolulçao russa. Tudo tem início com o serviço de entradas frias. São os chamados zakuskis: canapé de ovo com caviar, arenque à la creme, salmão defumado, pasta de ovo com raiz forte, canapé de ovo com ovas, salada (russa, é claro), mousse de alho, patê de fígado e outras coisinhas que variam regularmente, porque há sempre alguma novidade no menu. São, pelo menos, 13 porções diferentes.

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Principais: estrogonofe e varênique Foto: Bruno Agostini / Estadão

Depois chegam à mesa as entradas quentes, hora de mandar descer uma garrafa de vinho tinto. Asinhas de frango crocantes, rolinho de abobrinha com queijo e outros delicados pratinhos são servidos antes do grand finale desta etapa: chegam os pirozhkis, bolinhos de carne de massa leve e delicada (receita aprendida na China, com o mordomo que cuidava da casa dos russos) e o borsch, uma sopa de beterraba que faz um bem danado ao corpo e à alma, benefícios ainda maiores quando mergulho os tais bolinhos no caldo rosado e os levo à boca gotejando (melhor evitar camisas claras).

Daí, chega o prato principal, que você escolheu lá no início, na hora da reserva, entre as sete opções disponíveis. As mais famosas e recomendáveis são o estrogonofe, o frango à Kiev e o varênique, espécie de ravióli de batata e cebolinha com molho de creme de leite, servido com escalopinhos de mignon e guarnecido com cebola frita crocante. Outra boa pedida é o pojarsky, que são escalopes de mignon e frango, com cogumelos, batatinhas noisette e ervas, flambados e gratinados.

Não é mesmo fácil escolher.

Supremo de nozes: não deixe de pedir Foto: Bruno Agostini / Estadão

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E, entre as sobremesas, o supremo de nozes com chocolate é a minha preferida, mas é linda também a cassata de pitanga (não sei se este o nome, mas é por aí, um doce gelado e cremoso com esta frutinha brasileiríssima).

Assim como a História da casa, o banquete servido ali tem contornos épicos. Só visitando o lugar para entender sua grandeza.

SERVIÇO Dona Irene: Rua Tenente Luiz Meirelles 1800, Bom Retiro, Teresópolis. Tel.: 21-2742-2901 e (21) 97149-1952 (WhatsApp) Site: donairene.com.br

 

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