A colher de pau de Charlie Papazian agora está no acervo do Museu Smithsonian de História Americana.
Papazian é um ícone. É o cervejeiro caseiro mais famoso do mundo. Fundou o Great American Beer Festival, um dos principais festivais de cerveja do mundo, realizado anualmente nos EUA há 35 anos; fundou a Associação Americana de Cervejeiros Caseiros e, depois, a Associação de Cervejeiros, que, em 2005, se fundiu com a Brewers Association (BA), da qual ele é presidente e reúne mais de 50 mil membros (entre caseiros e artesanais). No fim do mês passado, a BA anunciou que ele deixa o cargo de presidente em janeiro do ano que vem, quando completa 70 anos.
A colher de pau que ele usava para preparar suas cervejas em casa foi para o projeto The American Brewing History Initiative, do Museu de História Americana. O projeto, iniciado em 2016, está coletando documentos e objetos para registrar e preservar a história da cerveja, das cervejarias artesanais e da indústria cervejeira norte-americana. O objetivo é “explorar como a cerveja e sua história se conectam a temas maiores da história americana”.
“Especialmente nos últimos 30 anos, a produção de cerveja se tornou muito ligada a significativos movimentos sociais, culturais econômicos e ambientais em todo o país”, afirma o documento oficial da iniciativa. Fica clara a importância que a Revolução Cervejeira tem nos Estados Unidos.
Sábado em Nelson, Virgínia
No último sábado (17) fui visitar a cervejaria Blue Mountain, que fica na zona rural do distrito de Nelson, nos pés dos montes Apalachians, na Virgínia. A cervejaria é bem regional e tem um rótulo irresistível, a Full Nelson, uma american pale ale fresquíssima e equilibrada, com cascade cultivado na própria cervejaria (a Virgínia tem produção própria de lúpulo). Mas está longe de ser uma cervejaria famosa, como Three Floyds ou Russian River.
Estava chovendo e a previsão dizia que em duas horas começaria uma tempestade de neve. E a cervejaria estava lotada de gente. No restaurante, as mais de trinta mesas estavam todas ocupadas e em cada uma delas ao menos uma pessoa (quase sempre todas) tinha diante de si o sampler – aquela régua de degustação – com todos os rótulos disponíveis nas torneiras naquele dia. Eram dez: iam de uma lager simples e correta a uma stout com chocolate e café, passando por uma kolsch, uma american pale ale, três IPAs, uma (excelente!) ESB e duas doppelbock. No estacionamento, 100% dos carros tinham placa da Virgínia. Verdade que podiam ser todos alugados, mas a proximidade entre garçons e clientes sinalizava para uma clara fidelidade, uma demonstração do lema “support your local brewer” – apoie seu cervejeiro local.
Sabe o que essas duas histórias contam para mim? Que temos muito chão pela frente. E está na mão dos cervejeiros e dos consumidores – como bebedor de cerveja artesanal, não adianta jogar a responsabilidade só para o cervejeiro. Como cervejeiro, não adianta jogar a responsabilidade só para o bebedor.
Selo de cervejaria independente brasileira
Seguindo os passos da BA, que lançou no ano passado um selo de Independent Craft Brewer, ou seja, cervejeiro artesanal independente, a Abracerva anunciou nesta semana o selo de Cervejaria Independente Brasileira. A ideia da criação dessas marcas e do uso do termo independente é sinalizar para o consumidor se aquela cerveja é produzida por uma cervejaria artesanal independente ou se é uma marca criada ou absorvida pelos grandes conglomerados cervejeiros. No Brasil, o selo deve começar a ser usado a partir de março.