PUBLICIDADE

Blogs

Aventuras lácteas entre o Brasil e a França

Só queijo

Só queijo

Batizaram o comerciante de queijo: agora é queijista

Semiótica queijeira: inventando novos significados para dar nome aos bois na cadeia do queijo artesanal brasileiro

A Associação de Comerciantes de Queijos Artesanais Brasileiros - Comerqueijo lançou um vídeo para a divulgação do trabalho do "queijista".

Essa palavra, que ainda não existe no dicionário português, é uma tentativa de definir quem é o sujeito que não somente vende queijo, mas vende história, cultura e paixão em cada fatia.

"O termo é um neologismo mesmo" justifica Falco Bonfadini, presidente da Comerqueijo, comerciante em São Paulo e quem teve a ideia:

"há alguns anos criamos um grupo para discutir um nome para a nossa profissão: sommelier de queijos é muito francês e a sua variação "queijelier" é horrível.

PUBLICIDADE

Cheesemonger é em inglês. Queijeiro já é usado pelo produtor ou o atravessador. Queijista remete à noção de adepto (liberalista), de ocupação ou ofício (jornalista), de estudioso ou especialista (dentista)".

Finalmente, o termo "queijista" ganhou na votação interna da associação, que financiou um vídeo para ajudar a explicar ao público.

Falco e Márcia da Galeria do Queijo. FOTO: Falco Bonfadini/Acervo Pessoal  

Essa iniciativa é muito nobre para explicar ao consumidor final que vender queijo não é igual vender laranja ou kiwi. Os sabores e perfumes inebriantes têm origem complexa, do clima ao terroir, passando até pela temperatura das mãos do produtor.

PUBLICIDADE

Um queijo sintetiza em seus sabores as batalhas de vida de uma família rural, a geografia de uma montanha, a tipicidade de um riachinho que corre dentro da fazenda. Tudo isso dá um gostinho único a cada queijo como um autêntico artesanal brasileiro, que o protege de ser copiado em outras condições.

Loja Deguste Queijo, em Vila Velha-ES. FOTO: Lucia Vasconcellos/Deguste Queijo  

Mas o termo não tende a se limitar somente aos donos de lojas físicas. É o caso de comerciantes de queijos de feiras, como os mineiros Lúcia Vasconcellos e Arthur Andrade que se mudaram para Vila Velha em 2014.

Depois de passar anos vendendo queijos em feiras, eles finalmente abriram a loja Deguste Queijo na praia da Costa, em outubro de 2021. "Estar em contato com os produtores e valorizar seu trabalho é muito importante. Temos 60 rótulos de queijos, todos nacionais, de produtores que conhecemos" disse Lúcia.

PUBLICIDADE

Lúcia Vasconcellos e Arthur Andrade da Deguste Queijo, em Vila Velha-ES. FOTO: Lucia Vasconcellos/Deguste Queijo  

As ações se multiplicam. Muitos queijistas animam degustações pela internet e os clientes recebem em casa a caixinha de queijos selecionados para seguir o evento. Outros, como Flávia Rogoski da loja Bon Vivant no mercado municipal de Curitiba, fazem o club do queijo. Ela envia uma seleção de queijos por mês com uma cartinha contando a história de cada um.

"Comecei em abril de 2020, no comecinho da pandemia, quando a loja precisou ficar fechada. Os assinantes são sazonais, uma média de 70 por mês, mas em alguns meses já cheguei a 110. Entrego com uma logística particular, os clientes recebem os queijos no mesmo dia que são embalados, porque muitas vezes o correio acaba com todo capricho que o produtor teve para fazer e curar o queijo".

PUBLICIDADE

Flávia Rogoski, 2ª da direita para a esquerda, e seus colaboradores. FOTO: Flavia Rogoski/acervo pessoal.  

Outro conceito que se aplica ao queijista é de "loja dentro da loja". Josi e Paulo Zillmer propõem a empórios gourmets fornecer uma gama de queijos junto com um treinamento dos funcionários, que aprendem a falar do queijo e conserva-los nas condições ideais.

"Através da gestão do estoque e pedidos, treinamento dos funcionários, cardápios e marketing, este modelo se tornou extremamente viável para todos, principalmente no momento pandêmico no qual passamos" conta Paulo. Eles são parceiros do empório Emporio Seo Lúcio em Barretos e da Casa 9 Gastronomia em Araraquara.

Josi treina os funcionários do Empório Santa Ângela, em Barretos. FOTO: Paulo Zillmer/acervo pessoal.  

PUBLICIDADE

O termo poderia se aplicar também a figura do comerciante que coleta queijos nas fazendas e distribui nos centros urbanos. Na Serra da Canastra por exemplo, só na cidade de São Roque de Minas temos muitos deles que visitam uma vez por semana os produtores para recuperar todos os queijos e distribuir em São Paulo.

Percorrem até 300 km de estradas de terra por dia e depois os queijos seguem em caminhões refrigerados, sendo São Paulo o destino principal. Este tem a vantagem de ser bem próximo do pequeno produtor, muitas vezes é quem leva a cesta básica, a receita da farmácia da vovó, o correio... Eles representam, para as famílias que moram muito longe da cidade, o contato com o meio urbano.

Em Minas Gerais são chamados de queijeiros, precisa esperar um pouquinho pra ver se queijista pega lá.

Não dá para ser queijista sem muito estudo. O ofício exige aprender o "queijobulário" para saber a falar de queijo (outro neologismo!), a história e cultura das regiões produtoras, a geografia das paisagens queijeiras.

E isso, só com muita paixão e desprendimento. Se não tiver essa paixão e essa entrega, vira um discurso frio e sem poder para contagiar os clientes.

PUBLICIDADE

PUBLICIDADE