A cada dois meses nós colocamos o pé no caminho atrás de histórias queijeiras geniais: eu e meu companheiro de trabalho e vida Arnaud Sperat Czar somos jornalistas da Profession Fromager, revista francesa, e da Profissão Queijeira, sua versão brasileira, ambas voltadas para o público profissional do queijo. Temos a sorte de viajar uma média de 3.000 km para escrever cada edição.
Preferimos, sempre que possível, fazer o jornalismo artesanal, aquele que visita suas fontes, que sente o cheiro dos estábulos, das salas de fabricação e prova os queijos. Isso tudo durante o dia, para de noite salvar as fotos e videos e organizar as notas das inúmeras entrevistas. Mas ainda acho tempo para escrever esse blog que adoro tanto, é a possibilidade de compartilhar inspirações e ideias com os compatriotas brasileiros.
No verão gostamos de viajar mais pela Europa. Porque quatro da manhã o dia ja nasce e as dez da noite o sol ainda não se pôs. As pessoas e os animais estão mais felizes e os queijos têm mais sabores.
Saímos de Lille no norte da França e nossa primeira parada foi a Normandia, para ver como o queijo camembert de denominação de origem protegida e leite cru está tentando automatizar sua fabricação artesanal sem perder a alma.
O camembert é enformado com ajuda de uma concha, como mostrei em uma viagem anterior. Cada queijo é feito com 5 conchas de massa que devem ser colocas delicadamente na forma com intervalo de 40 minutos cada.
A queijaria Gillot, que faz 1.800 toneladas de camembert por ano, com o leite cru de 96 produtores, precisa de um batalhão de uma centena de queijeiros que trabalham 5 horas por dia para enformar uma média de 1.200 queijinhos de 250 gr por turno. É um trabalho super penoso.
"Nosso principal problema é a mão de obra, a tarefa é repetitiva e não é fácil," disse Emilie Flechard, dona da queijaria. "Então, para aumentar o volume criamos um robô com braços para imitar o trabalho humano. O resultado é interessante, o robô faz mais erros que os humanos e os queijos são mais tortinhos. Quando fazemos degustação às cegas com os clientes eles acham que os queijos dos robôs são os dos humanos, e vice versa, é impossível descobrir a diferença".
Isso tudo porquê o consumidor tende a achar que queijos com defeitos podem ser perdoados porque são artesanais. Muito produtor justifica seus defeitos dizendo "sou artesanal", discurso que devemos desconfiar...
Por outro lado, deveria ser o consumidor alertado que o camembert foi feito por um robô? É indispensável para o momento atual, onde queremos saber tudo, até o nome da vaca!
Ótimo tema para ser discutido no Brasil, por exemplo, nas regiões queijeiras de Minas, muitos produtores estão com problemas nos pulsos de tanto espremer queijo, porque a receita tradicional não permite fazer de outra forma... Quando eles faziam dez queijos por dia isso não era problema, mas com o aumento da demanda, depois do sucesso dos queijos em concursos internacionais, já tem produtor fazendo mil queijos por dia. Como aliviar humanos e manter uma produção artesanal sem perder sua essência manual? Questão para muita reflexão...