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Aventuras lácteas entre o Brasil e a França

Só queijo

Só queijo

Quer comer queijo suíço, verifique se foi feito por lá

Nos supermercados, não se deixe enganar por queijos industriais feitos no Brasil, que confundem dizendo que têm origem na Suíça

Terminei ontem uma missão técnica  na Suíça com 15 brasileiros que vieram se inspirar na tradição queijeira milenar deste pequeno país de 42.000 quilômetros quadrados, um pouco maior que a Ilha de Marajó.

Paisagem da Suíça germânica Foto: Marco Guede/SerTãoBras

 

Tanto na região da Suíça que fala alemão quanto na que fala francês, mergulhamos na história, cultura e organização de oito queijos de massas duras e cozidas, que derretem na boca: gruyère, emmental, etivaz, appenzeller, vacherin fribourgeois, mont-vully, sbrinz e tête de moine.

Kaltbach, caverna de cura de queijos Foto: Marco Guede/SerTãoBras

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Eles dão êxtase na alma, conforto no paladar e tivemos o privilégio de provar em todas as suas curas, em fondue, em pratos quentes e frios, sempre terminando na sobremesa crocante-ternura de merengue com creme de leite bem espesso.

Sala de cura de queijo emmental Foto: Marco Guede/SerTãoBras

 

Essa imersão deu para os brasileiros entenderem porque os "queijos da Suíça" são os queijos da Suíça e ponto final. Artesanais, autênticos e naturais, a maioria feito de leite cru de vaca, feitos em tachos de cobre, com o calor da mão do queijeiro suíço, a beleza da sua paisagem, os gostos e aromas que só as bactérias dos seus ambientes dão nos seus queijos, que fazem com que sejam únicos no mundo.

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Queijo mont-vully Foto: Marco Guede/SerTãoBras

 

Porque não é só tentar copiar a receita. Na Suíça, o leite é de vaca a pasto, sem alimentação fermentada, que rumina contemplando as montanhas e florestas.

Sala de cura da cooperativa de l'etivaz Foto: Marco Guede/SerTãoBras

 

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Com todo respeito ao enorme "savoir-faire" e boa intenção dos técnicos das indústrias do Brasil, é impossível reproduzir isso nos nossos apocalípticos trópicos sertanejos. A realidade é que, nem com todos os pacotes de bactérias boas do mundo, nosso leite brasileiro vira queijo suíço.

Gato por lebre: não compre queijo brasileiro como se fosse suíço

Depois do acordo entre Mercosul e União Europeia, que resolveu que os industriais brasileiros não podem enganar os consumidores com os rótulos "tipo gruyère" e "tipo emmental", ou qualquer raio de queijo "tipo europeu" que seja, do brie ao gorgonzola... E depois da derrogação, diga-se enrolação, dessa cadeia do queijos industrial para acatar o tal acordo, o Ministério da Agricultura - MAPA começou a pressionar laticínios para que tirem das suas etiquetas as denominações de origem protegida.

Vacas desfilando na "desalpe", festa do final do verão quando elas descem das montanhas coradas de flores Foto: Débora Pereira/SerTãoBras

 

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A solução encontrada para o embate em torno do nome nós já podemos ver nos supermercados: estão substituindo o antigo queijo "tipo gruyère", por exemplo, por "queijo tipo suíço". Como se o queijo fosse de origem Suíça. Isso significa que os agentes agropecuários, pagos com dinheiro dos nossos impostos para defender nossos direitos de transparência enquanto consumidores, concordam em ludibriar sobre a origem do queijo.

A brasileira Anais, que trabalha na queijaria Moleson, na região de Gruyère Foto: Marco Guede/SerTãoBras

 

Não adianta qualquer pessoa do cafundó do sertão do Brasil querer falar que seu queijo é tipo Suíço. As propagandas são ainda mais descaradas, olha essa que encontrei em um site de um industrial: "Emmental com 6 meses de cura e olhaduras lindas, que tornam seu sabor tão característico. Emmental é um queijo originário da Suíça. Ele tornou a expressão "Queijo Suíço" conhecida mundialmente e possui características similares ao Gruyère."

Brasileiros da missão queijeira na sala de cura do queijo sbrinz Foto: Marco Guede/SerTãoBras

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Essa propaganda ainda confunde a cabeça do consumidor, misturando dois queijos diferentes, emmental e gruyère, como se fossem similares, como se queijo suíço fosse tudo uma coisa só. A verdade é que eles têm uma diversidade gigante nos formatos, sabores e modos de fazer.

Os missionários do queijo em degustação dos queijos mont-vullly Foto: Marco Guede/SerTãoBras

 

Por mais queijo da mamãe Jurema e menos "queijos tipo"

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É uma enganação geral da nação permitir que laticínios brasileiros que fazem queijo com leite pasteurizado, de vacas que comem silagem, com outro clima, com microbiota completamente diferente e que dão outros sabores, muito longe do reais sabores suíços, mencionem o nome de um país que não tem nada a ver com isso.

O lindo seria poder colocar nos nossos queijos os nomes das nossas montanhas, rios, cidadezinha, das nossas lendas, do saci pererê, da mamãe Jurema, sem ter que enfiar nenhuma expressão gringa. Respeitar o nosso terroir começa respeitando o terroir do outro. Depois não reclamem que já tem americano e português fazendo "queijo minas artesanal".

E quem quiser comer queijo suíço no Brasil, verifique na etiqueta se ele foi feito lá. Vai custar mais caro porque ele tem impostos e atravessou o oceano para chegar, mas só assim para ter esta verdadeira experiência. Senão, prefira um queijo artesanal brasileiro cru-cru.

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