Terminei ontem uma missão técnica na Suíça com 15 brasileiros que vieram se inspirar na tradição queijeira milenar deste pequeno país de 42.000 quilômetros quadrados, um pouco maior que a Ilha de Marajó.
Tanto na região da Suíça que fala alemão quanto na que fala francês, mergulhamos na história, cultura e organização de oito queijos de massas duras e cozidas, que derretem na boca: gruyère, emmental, etivaz, appenzeller, vacherin fribourgeois, mont-vully, sbrinz e tête de moine.
Eles dão êxtase na alma, conforto no paladar e tivemos o privilégio de provar em todas as suas curas, em fondue, em pratos quentes e frios, sempre terminando na sobremesa crocante-ternura de merengue com creme de leite bem espesso.
Essa imersão deu para os brasileiros entenderem porque os "queijos da Suíça" são os queijos da Suíça e ponto final. Artesanais, autênticos e naturais, a maioria feito de leite cru de vaca, feitos em tachos de cobre, com o calor da mão do queijeiro suíço, a beleza da sua paisagem, os gostos e aromas que só as bactérias dos seus ambientes dão nos seus queijos, que fazem com que sejam únicos no mundo.
Porque não é só tentar copiar a receita. Na Suíça, o leite é de vaca a pasto, sem alimentação fermentada, que rumina contemplando as montanhas e florestas.
Com todo respeito ao enorme "savoir-faire" e boa intenção dos técnicos das indústrias do Brasil, é impossível reproduzir isso nos nossos apocalípticos trópicos sertanejos. A realidade é que, nem com todos os pacotes de bactérias boas do mundo, nosso leite brasileiro vira queijo suíço.
Gato por lebre: não compre queijo brasileiro como se fosse suíço
Depois do acordo entre Mercosul e União Europeia, que resolveu que os industriais brasileiros não podem enganar os consumidores com os rótulos "tipo gruyère" e "tipo emmental", ou qualquer raio de queijo "tipo europeu" que seja, do brie ao gorgonzola... E depois da derrogação, diga-se enrolação, dessa cadeia do queijos industrial para acatar o tal acordo, o Ministério da Agricultura - MAPA começou a pressionar laticínios para que tirem das suas etiquetas as denominações de origem protegida.
A solução encontrada para o embate em torno do nome nós já podemos ver nos supermercados: estão substituindo o antigo queijo "tipo gruyère", por exemplo, por "queijo tipo suíço". Como se o queijo fosse de origem Suíça. Isso significa que os agentes agropecuários, pagos com dinheiro dos nossos impostos para defender nossos direitos de transparência enquanto consumidores, concordam em ludibriar sobre a origem do queijo.
Não adianta qualquer pessoa do cafundó do sertão do Brasil querer falar que seu queijo é tipo Suíço. As propagandas são ainda mais descaradas, olha essa que encontrei em um site de um industrial: "Emmental com 6 meses de cura e olhaduras lindas, que tornam seu sabor tão característico. Emmental é um queijo originário da Suíça. Ele tornou a expressão "Queijo Suíço" conhecida mundialmente e possui características similares ao Gruyère."
Essa propaganda ainda confunde a cabeça do consumidor, misturando dois queijos diferentes, emmental e gruyère, como se fossem similares, como se queijo suíço fosse tudo uma coisa só. A verdade é que eles têm uma diversidade gigante nos formatos, sabores e modos de fazer.
Por mais queijo da mamãe Jurema e menos "queijos tipo"
É uma enganação geral da nação permitir que laticínios brasileiros que fazem queijo com leite pasteurizado, de vacas que comem silagem, com outro clima, com microbiota completamente diferente e que dão outros sabores, muito longe do reais sabores suíços, mencionem o nome de um país que não tem nada a ver com isso.
O lindo seria poder colocar nos nossos queijos os nomes das nossas montanhas, rios, cidadezinha, das nossas lendas, do saci pererê, da mamãe Jurema, sem ter que enfiar nenhuma expressão gringa. Respeitar o nosso terroir começa respeitando o terroir do outro. Depois não reclamem que já tem americano e português fazendo "queijo minas artesanal".
E quem quiser comer queijo suíço no Brasil, verifique na etiqueta se ele foi feito lá. Vai custar mais caro porque ele tem impostos e atravessou o oceano para chegar, mas só assim para ter esta verdadeira experiência. Senão, prefira um queijo artesanal brasileiro cru-cru.