Folhas secas + água quente = chá. Simples? Não. Nada no Oriente é tão simples. Foto: Alex Silva/AE
Um bom chá verde tem um certo amargor, não vamos negar. Mas tem também doçura e adstringência. Se for da mais alta qualidade, esses sabores estarão equilibrados. Mas o resultado final, assim como o do café, depende de como a bebida foi preparada e da variedade de chá usada - elas são muitas, como você vai ler abaixo.
Entre os orientais, o hábito de tomar chá verde é milenar, principalmente no Japão, onde as folhas chegaram no século 8. Foram fundamentais para a formação da cultura nacional. No país, o chá verde é assunto tão sério que existe até uma organização mundial sediada na província de Shizuoka, a maior produtora.
O Japão se especializou no preparo e na diferenciação entre os chás verdes. No período Muromachi (do século 14 ao 16), os samurais faziam competições para adivinhar de onde vinha cada chá - nos moldes das provas de vinho às cegas de hoje.
Produzido com folhas da Camellia sinesis, mesma planta com a qual se faz o chá preto, o verde difere-se pelo processamento. Suas folhas não são fermentadas, como as do preto, e sim secas no vapor, um método desenvolvido no século 18, em Uji, onde é possível fazer o roteiro da bebida, próxima à antiga capital Kyoto (leia na próxima página). Essa técnica previne a oxidação, fazendo com que a folha verde preserve seus nutrientes.
O que permite a existência de cerca de dez tipos de chá verde, apesar de a folha ser sempre a mesma, é a época e a maneira como são colhidas. Quanto mais jovens as folhas, menos amargo será o chá depois de pronto.
“Ao beber chás de folhas jovens, como o gyokuro ou o sencha de qualidade, aprecia-se o sabor suave e a fragrância dessas folhas”, afirma Atsushi Oka, porta-voz da Organização Mundial do Chá Verde. “Já no caso do sencha comum ou do bancha, sente-se mais o sabor adstringente. E, no do genmaicha, principalmente o aroma.”
É por isso que o chá de primeira colheita - ichiban cha -, colhido na primavera, é o mais valorizado. Pode custar até 10 mil ienes (cerca de R$ 200). No inverno, a folha concentra mais nutrientes e tem sabor mais intenso. Há também colheitas no verão (junho) e no outono (outubro). Portanto, fique atento às datas antes de comprar.
Quando o ‘chá’ se sobrepôs ao ‘tea’
Por que quase todo o mundo se refere às bebidas feitas com Camellia sinensis usando a palavra “tea” (ou outras com sonoridade parecida) e no Brasil o chamamos de “chá”?
Segundo Shigehiro Kodomari, da Associação Mundial do Chá Verde, por volta de 760, surgiu na China o ideograma “cha”. E a pronúncia “cha” teria chegado à língua portuguesa por uma coincidência histórica.
"Cha" era um termo usado na Província Guandong, onde os mercadores ibéricos (os primeiros a levar a bebida para a Europa) estabeleceram seu comércio. A pronúncia "tea" vem do contato com a província de Fujian, porta usada pela maioria dos países europeus para o negócio do chá chinês.
Copo para os quatro sentidos
A pequena peça de cerâmica ou porcelana yunomi (que significa "tomar água quente") não tem alça, como a xícara ocidental.
E é por isso que ela permite apreciar a bebida recorrendo-se a quatro sentidos, começando pelo tato, para sentir o calor do chá - além deles, perfume, sabor e o olhar.
Há dois tipos de yunomi, um em forma de tigela e outro com formato de tubo.
Junpei Yokoi, da Associação Mundial do Chá, explica que para segurá-la sem queimar os dedos, deve-se seguir a tradição: uma mão apoia o copinho embaixo e a outra, do lado.
A de cerâmica mantém melhor o calor que a de porcelana, o que a torna mais apropriada para o inverno. Recomenda-se servir o chá mais refinado em yunomi menores e de design delicado - no bairro paulistano da Liberdade, há uma profusão de yunomi, das mais variadas estampas. “Os japoneses escolhem o yunomi pensando na estação do ano, no tipo de chá e na personalidade do convidado", diz Yokoi.