Quando um empreendedor adquire uma franquia, existe a possibilidade de ele não ser o único interessado pela marca em determinada região. Ou, então, a própria franqueadora pode querer abrir uma unidade nos arredores do ponto dele. Isso pode colocar um concorrente da mesma marca perto do seu negócio e afetar seu desempenho?
Para evitar dúvidas sobre o tema, a lei 13.966/2019, que rege o sistema de franchising no Brasil, determina que a territorialidade seja descrita na Circular de Oferta de Franquia (COF). Esse documento precisa obrigatoriamente ser entregue pela marca franqueadora ao possível franqueado com, no mínimo, dez dias de antecedência em relação a uma eventual assinatura e/ou pagamento.
E o que é essa territorialidade? Ela tem a ver justamente com o espaço de atuação de uma loja. Ou seja, um franqueado, assim que adquirir uma unidade, vai receber a delimitação de área na qual poderá atuar com ações de marketing, vendas, prospecção, entre outros tópicos.
Divisão de espaço tem de estar clara no contrato
Todo esse conceito está muito atrelado à concorrência. Por exemplo, se uma marca possui três unidades franqueadas em um bairro, cada uma dessas lojas vai ter um determinado número de quarteirões, ruas ou quilômetros para angariar clientes.
Porém, se o espaço recortado não comporta a quantidade de unidades que já existe, uma poderá tirar vendas da outra - o que é prejudicial para os franqueados e para a marca.
Na lei, é possível ver os seguintes itens referentes à territorialidade, que precisam constar na COF:
- Existe exclusividade ou preferência sobre território de atuação? O franqueado será o único da marca a operar em determinado local ou haverá divisão?
- Há possibilidade de vendas ou prestação de serviços fora deste território? Ou tudo é limitado apenas ao espaço combinado anteriormente?
- Quais são as regras de concorrência territorial entre unidades próprias e franqueadas?
Tema é um dos principais em disputas judiciais
De acordo com o vice-presidente de consultoria do Grupo 300 Ecossistema de Alto Impacto, Lucien Newton, este assunto está entre os três principais em disputas jurídicas entre franquias e franqueados.
“A territorialidade tem que estar ligada diretamente ao modelo do negócio e ao perfil do público, alinhando tudo com estratégias de geomarketing e características demográficas de uma determinada região”, explica o especialista. Por conta disso, tudo deve ser muito bem estudado e estipulado entre as partes.
Na prática, a eficácia do negócio vai depender, segundo Newton, da adequação do modelo à realidade. “Não adianta simplesmente fazer um raio de um quilômetro. Muito menos dar uma cidade inteira, para tentar evitar discussão. Um bairro pode mudar de característica, de perfil de consumo (na rua ao lado)”, afirma.
Ele complementa que é necessário entender essas variações para conseguir delimitar as regiões de maneira vantajosa para ambas as partes - franqueado e franqueador.
Muito espaço também pode ser prejudicial
Tão ruim quanto dar um território insuficiente ao franqueado é entregar um espaço em excesso, comenta o especialista.
Se a marca atua em uma cidade em que cabe mais de uma unidade, mas cedeu o município inteiro com exclusividade para apenas um empreendedor, a operação poderá ficar “presa” com essa pessoa.
“Se a territorialidade é importante para o franqueado, ela é questão de vida ou morte, determinando o sucesso ou fracasso de uma franqueadora.”
Todas essas explicações servem para contextualizar o que talvez seja o principal quando falamos de franquia: o prazo de retorno, chamado no mercado de payback.
Todo empreendedor está de olho nesse valor que será embolsado no futuro. Newton ressalta que uma delimitação precisa é essencial para que esse tempo seja atingido.
O mercado local vai ser suficiente para que o franqueado recupere o investimento no prazo estipulado anteriormente? “É isso que determina um território.”
Se esses territórios delimitados não forem respeitados, poderá haver punições, como multas e até rescisão de contrato, em casos mais graves.
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