Ele foi animador de festa junina, vigia de escola e agora é dono de faculdades e ganha milhões

Jouberto Uchôa criou o Colégio Tiradentes na década de 1960 e foi o responsável por abrir a primeira faculdade particular de Sergipe, que deu origem ao Grupo Tiradentes e faturou R$ 380 milhões em 2024

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Foto do author Geovanna  Hora

Ao conseguir um emprego em um colégio de Aracaju (SE), na década de 1950, o professor Jouberto Uchôa, de 88 anos, não imaginava que um dia teria a sua própria escola. Ele passou por várias funções - de vigilante a diretor - até deixar o emprego e fundar o Colégio Tiradentes em 1962.

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O que começou como uma instituição de ensino básico se tornou o Grupo Tiradentes, responsável pela Faculdade Tiradentes (Fits), Centro Universitário Tiradentes e Universidade Tiradentes (Unit), que faturou R$ 380 milhões em 2024.

Uchôa nasceu em Aracaju, passou sete anos com os avós em Alagoas e voltou para a sua cidade natal. “Foi nessa época que comecei a me desenvolver, primeiro com estudos e depois com trabalho”, conta. Ele fez um curso de tecelagem e conseguiu um emprego em uma fábrica de tecidos.

Jouberto Uchôa foi marcador de quadrilha junina antes de trabalhar em escola.  Foto: Divulgação/Grupo Tiradentes

Na época, o professor também trabalhava como marcador de quadrilha junina em um grupo escolar local. O marcador atua como um maestro nas quadrilhas juninas: é o responsável por guiar as duplas, interagir com o público, conduzir a apresentação e anunciar os passos tradicionais da dança, com comandos como “olha a cobra… é mentira” e “caminho da roça”.

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Uchôa conseguiu emprego em escola ao trabalhar em festa junina

A carreira como marcador de quadrilha junina levou Uchôa ao seu primeiro emprego em uma escola. Depois de uma apresentação, ele conseguiu uma vaga como vigilante em um colégio, na década de 1950.

“Eu fui vigilante, bedel [inspetor de alunos] e secretário. Me envolver com o dia a dia da escola me motivou a pensar em ser diretor, mas nunca imaginei que chegaria a ter um colégio próprio”, afirma o sergipano.

Uchôa chegou ao cargo de diretor, mas saiu do emprego em 1960. Com a ideia de abrir um negócio, ele diz que alugou um imóvel e contou com o bom relacionamento que tinha com os alunos da escola onde trabalhou para conquistar os primeiros estudantes do Colégio Tiradentes, inaugurado em 1962.

Nos primeiros anos, a instituição oferecia ensino fundamental e médio, além de cursos profissionalizantes. Quem ajudou o sergipano a construir esse sonho foi a professora Amélia Uchôa, de 78 anos, com quem ele se casou em 1964.

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Cinco anos depois da abertura, o Colégio Tiradentes recebeu uma ordem de despejo. “A proprietária queria o imóvel de volta. Ela entrou de noite e colocou todos os móveis na rua”, afirma.

Para dar sequência às aulas para cerca de 600 alunos, o professor usou um espaço cedido até terminar de construir a nova sede da escola, em um terreno próprio, em 1969.

Expansão para faculdade

Depois de inaugurar a nova sede do Colégio Tiradentes, Uchôa quis expandir o negócio e criar uma faculdade, já que a única instituição de ensino superior da região era a Universidade Federal de Sergipe (UFS), fundada em 1963. Ele conta que um dos principais desafios foi conquistar a confiança dos alunos.

“As pessoas não queriam ser as iniciantes da instituição. Para superar, nós precisamos investir em um corpo docente que fosse reconhecido”, afirma.

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O projeto levou três anos para ser finalizado e a Fits - na época, chamada de Faculdades Integradas Tiradentes - foi aprovada pelo Ministério da Educação (MEC) em 1972, como a primeira instituição privada de ensino superior de Sergipe.

Os primeiros cursos oferecidos foram Ciências Econômicas, Administração e Contábeis, mas o negócio só deslanchou depois da oferta do curso de Direito.

“Era tudo muito humilde no começo, inclusive o espaço. Não tinha ninguém para ajudar com dinheiro, então a parte financeira era um desafio. A cada dois anos, a gente lançava um curso, mas a faculdade só ganhou relevância na cidade depois de Direito”, comenta Amélia.

Outra estratégia utilizada por Uchôa foi apostar em áreas que ainda não estavam disponíveis na UFS, como Jornalismo. Com o crescimento da procura por ensino superior, o Colégio Tiradentes deu lugar à Fits.

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O Grupo Tiradentes ainda oferece aulas de educação básica, no Núcleo de Educação da Unit, para cerca de 400 alunos do 1º ao 5º ano do ensino fundamental, sem nenhum custo.

Universidade Tiradentes nasceu na década de 1990

A ideia de transformar a Faculdade Tiradentes em uma universidade nasceu em 1990. Diferente das faculdades, que geralmente são focadas em áreas de conhecimento específicas e voltadas ao ensino, as universidades podem abranger diferentes áreas de conhecimento e, além do ensino, precisam investir em pesquisa e extensão. As universidades também têm mais autonomia na relação com o MEC em comparação com as faculdades.

O processo de regularização da Unit foi finalizado depois de quatro anos. O filho de Uchôa, Jouberto Uchôa Júnior, de 55 anos, que acompanhou o crescimento do negócio, tinha acabado de se formar em Direito quando passou a ajudar no projeto de estabilização da Unit.

“O sonho dos meus pais virou o meu sonho também, mas foi desafiador, porque era uma universidade ainda em implantação. A gente precisava de consistência acadêmica, senão seria uma simples faculdade”, afirma.

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Jouberto Uchôa (à esquerda), reitor da Unit, Amélia Uchôa, membro do Conselho de Administração do Grupo Tiradentes, e Jouberto Uchôa Júnior, vice-reitor da Unit. Foto: Divulgação/Grupo Tiradentes

Uchôa Júnior ocupa os cargos de vice-reitor na Unit e diretor-geral no Grupo Tiradentes - atualmente, o pai dele é reitor da Unit, e a mãe é membro do Conselho de Administração do Grupo Tiradentes.

Ele também participou do projeto de interiorização da instituição, que começou em 2001: “As pessoas vinham estudar em Aracaju, e o meu pai pensou que o caminho era levar o ensino para o interior”.

As primeiras faculdades foram instaladas em Estância (SE), em 2003, Itabaiana (SE), também em 2003, e Propriá (SE), em 2004.

Em 2005, a empresa decidiu avançar para outros Estados, a começar por Alagoas e depois Pernambuco. Foi nesse momento que o Grupo Tiradentes começou a tomar forma, para representar a faculdade, a universidade e o centro universitário.

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Atualmente, a empresa conta com campus em quatro cidades de Sergipe e dois municípios de Pernambuco, além de 27 polos de Educação a Distância (EAD), que atendem a cerca de 20 mil alunos.

Duas unidades foram vendidas por R$ 825 milhões em 2022

Em 2022, o Grupo Tiradentes vendeu o Centro Universitário Tiradentes de Alagoas e a Faculdade Tiradentes de Jaboatão dos Guararapes (PE) para a Afya, grupo de educação médica, por R$ 825 milhões. As duas unidades tinham cerca de 340 vagas para Medicina.

“Fizemos esse movimento para conseguir recursos e reinvestir nas unidades que permanecem”, afirma Uchôa Júnior.

No final do ano passado, a empresa inaugurou o Complexo de Especialidades em Saúde, que leva o nome de Amélia Uchôa.

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O espaço teve investimento de R$ 20 milhões e é utilizado por estudantes dos cursos de Medicina, Odontologia, Fisioterapia, Enfermagem, Psicologia, Biomedicina, Nutrição e Farmácia.

Complexo de Especialidades em Saúde leva o nome de Amélia Uchôa e custou R$ 20 milhões.  Foto: Divulgação/Aluizio Accioly/Grupo Tiradentes

“A ideia foi pegar todas as clínicas de apoio às aulas práticas, que funcionavam separadas, e juntar em um ambiente só, para que o aluno possa interagir com pessoas de outras profissões”, explica o vice-reitor. Além de ajudar na formação, o centro também atende os moradores de Aracaju, com capacidade para até 7 mil atendimentos grátis por ano.

Segundo Uchôa Júnior, o segredo para manter uma empresa de 60 anos nos trilhos começa com parcerias. Como exemplo, ele cita que o Grupo Tiradentes investe em relações com instituições internacionais para permitir que os alunos façam intercâmbios durante o curso.

O diretor também afirma que é importante se manter relevante, ter uma boa empregabilidade e usar a tecnologia como aliada.

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Ele aponta que um dos caminhos para o futuro da instituição é o desenvolvimento de um parque tecnológico, com o apoio de bancos, empresas de tecnologia, petróleo e gás. “A relevância vem quando o aluno entende que ali é um ambiente de crescimento profissional”, conclui.

Avaliação dos alunos

A Universidade Tiradentes de Sergipe, em Aracaju, recebeu uma classificação média de 4,6 de 5 estrelas no Google, com 1.311 avaliações até a publicação desta matéria. Os comentários positivos elogiam a infraestrutura do campus e a qualidade dos professores, e os negativos abordam problemas no atendimento.

Os autores das notas concedidas não podem ser verificados. Eventualmente, avaliações positivas ou negativas podem ser uma ação a favor ou contra a empresa.

No Reclame Aqui, a Unit tem uma reputação classificada como ruim, com nota média de 5,2 de 10 nos últimos 12 meses e 41 reclamações registradas no período. Os comentários negativos abordam problemas com diplomas e no atendimento.

A Unit afirmou, em nota, que acredita no relacionamento com o cliente como pilar fundamental, mas prefere utilizar as suas plataformas oficiais. Por essa razão, os problemas registrados no Reclame Aqui são direcionados para a Ouvidoria Digital, que recebeu 1.628 manifestações no último ano, envolvendo denúncias, elogios, reclamações e sugestões.

A empresa diz que também oferece o Serviço de Atendimento ao Consumidor (SAC), por um sistema de telefonia, que recebeu, nos últimos 12 meses, 112.109 conversas, das quais 111.901 foram resolvidas, resultando em uma satisfação final do cliente de 94%.

“Assim, a Universidade Tiradentes reforça seu compromisso inegociável com a ética, inovação, cooperação e valorização do ser humano”, completa a instituição.

Procura por ensino superior é oportunidade de negócio

O gerente da Unidade Cultura Empreendedora do Sebrae-SP, Paulo Marcelo Tavares Ribeiro, avalia que o aumento do interesse dos brasileiros pelo ensino superior é um dos principais motivos que tornam o setor de educação atrativo para quem quer empreender.

O Censo de Educação Superior, realizado pelo MEC, apontou que, em 2023, havia 9,9 milhões de alunos matriculados em cursos de ensino superior no Brasil, o que representa um crescimento de 5,6% em relação ao ano anterior.

“O ponto é que existe uma demanda, seja por parte das pessoas que cresceram e querem se especializar ou dos profissionais que querem mudar de carreira”, afirma.

Ribeiro também aponta que as opções vão além da educação básica e superior, já que a empresa pode investir em aulas que atendam a alguma necessidade do seu público-alvo. Um exemplo são os cursos pré-vestibulares, criados para ajudar estudantes a chegarem até as faculdades.

Mas para fazer a melhor escolha é preciso ter alguns cuidados, como avaliar a concorrência e realizar um planejamento financeiro.

Tudo começa com entender quem você quer atender e onde você quer estar. “Definir onde a sua empresa vai ser instalada é fundamental, mas isso depende de definir quem é o seu cliente. Se o empreendedor não identificar o seu consumidor, os riscos de o negócio dar errado são maiores”, analisa.

Ele diz que é preciso ter atenção às áreas que já estão saturadas pelo excesso de alternativas no mercado e as normas para regulamentação de alguns cursos.

Ribeiro destaca ainda que o crescimento do interesse dos estudantes por educação a distância (EAD) também é uma oportunidade de negócio, mas que as empresas precisam se preocupar em oferecer qualidade, além da praticidade.

“A grande crítica ao EAD é que existem muitas opções de cursos, mas com qualidade baixa. Como eu crio cursos bons, mas que funcionam no formato remoto? O empreendedor precisa responder a essa pergunta para fazer uma boa oferta aos alunos”, conclui.

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