Nascido em Salvador (BA), Fritz Paixão, hoje com 39 anos, teve uma infância em família de classe média baixa. Formou-se em fisioterapia, mas não se manteve muito tempo na profissão: “a conta não fechava”. Decidiu ir para o Rio de Janeiro, para tentar seguir o sonho de se tornar ator. Começou a dar certo na TV, mas como apresentador de programas locais e nichados.
O pulo do gato, porém, veio no empreendedorismo. Primeiro, lavando veículos em condomínios de luxo. Depois, sofás - o que se tornou o grande filão do negócio. Entre idas e vindas, tendo quase perdido a marca para um grupo de franqueados, a rede CleanNew faturou R$ 65 milhões em 2023, com uma projeção de receita bruta para este ano de R$ 100 milhões. Conheça, a seguir, a trajetória dele.
“O segredo do sucesso não é o que eu faço, é a trajetória.” Paixão diz acreditar com muita convicção nessa frase.
A mãe dele saiu de Sergipe, de uma cidade chamada Capela - que, no último Censo, do IBGE, figurou com uma população de pouco mais de 30 mil pessoas - para Salvador, em busca de melhores condições de vida.
Neste período, conseguiu ingressar em um curso de engenharia - profissão que, posteriormente, a ajudou a custear os estudos do filho, que se formou em um colégio particular da região.
Depois do ensino médio, Paixão decidiu cursar fisioterapia. O problema, segundo ele, é que não lhe foi ensinado a empreender na faculdade - o que ocasionou em dificuldades na transição para o mercado de trabalho. “Eu tinha um planejamento para conseguir ganhar cerca de R$ 5 mil por mês, mas a conta nunca fechava”, diz.
Por conta disso, resolveu ir para o Rio de Janeiro, em busca de um sonho antigo: ser ator. Ou “aparecer na Globo”, nas palavras dele.
Vendeu o carro que havia conseguido comprar ainda na cidade natal e foi morar sozinho.
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Com 23 anos, começou a ter aulas de atuação. Depois, passou a ter aulas para se tornar apresentador de TV. No tempo livre que tinha, tentava criar novos programas para a televisão. Com os contatos que conseguiu fazer neste período de estudos, passou a enviar roteiros para diferentes produtores e diretores, tentando vender o conteúdo. “Se alguém comprasse os direitos, mudava minha vida.”
Mas as respostas não vieram. Por alguns meses, alguns cafés eram marcados - e desmarcados na mesma frequência. Até que um dos diretores o convidou para que apresentasse o projeto pronto que tinha em mãos.
Apresentador de reality show
Essa conversa aconteceu, mas o intuito não era o roteiro em si e, sim, a habilidade de frontman de Paixão. “Depois entendi que ele estava me avaliando como potencial apresentador. Ali mesmo me convidou para um teste para no programa ‘Operação S2′, do Multishow”, comenta.
Foi fazer o teste e passou como apresentador do programa, quer era um reality show focado em relacionamentos. A estreia foi em meados de 2009 - mas a participação do empresário foi curta, de apenas uma temporada. A visibilidade foi boa, conta, mas o desemprego voltou à realidade dele.
Em uma festa, ainda no RJ, conheceu a atual esposa - que também é de Salvador. Como estava desempregado, voltou para a cidade natal com ela. Neste ínterim, a mãe dele se acidentou, demandando cuidados - o que fez com que ele ficasse um pouco mais de tempo do que o planejado por lá. Ao levá-la ao hospital, porém, uma surpresa: encontrou uma antiga colega de sala da época dos cursos de teatro.
Descobriu que havia um teste disponível para trabalhar como apresentador de um programa de sorteios e foi arriscar. Deu certo. “Comecei a apresentar um programa chamado Bahia dá Sorte, em uma rede local afiliada do SBT, todo domingo”, conta.
Confira, a seguir, trecho do programa:
Lavou carros para comprar apartamento
Como já estava empregado novamente, com um relacionamento estável e na cidade natal, decidiu comprar um apartamento. Mas, para isso, precisaria de uma renda extra.
Foi neste momento, em 2013, que viu uma oportunidade de negócio. Durante a estada no Rio de Janeiro, percebeu que existia um serviço de limpeza de veículos em condomínios de luxo - setor que ainda era muito incipiente em Salvador. Resolveu apostar nesta área.
Focado no público feminino que não tinha tempo para lavar carros, o negócio foi pegando uma boa tração, atuando nas garagens dos prédios durante a madrugada. Até que, em um determinado momento, uma das clientes fez uma pergunta que o instigou. “Ela me falou: ‘vocês lavam sofá?’. E eu disse que não, nosso foco era automóveis. E ela me pontuou uma coisa interessante: ‘se você lava estofado de carro, você lava estofado residencial’”, relembra. “Fazia sentido.”
Foi a partir daí que, em 2015, uma oportunidade ainda mais interessante apareceu, e o foco passou a ser limpeza e impermeabilização de sofás. “Eu levava uma hora para ganhar R$ 250 com lavagem de veículos. Com sofá, passei a fazer 10 vezes mais que isso, com menos esforço e menos mão de obra. Foi aí que eu fechei a empresa automotiva, mesmo dando dinheiro”, conta.
Com tudo caminhando minimamente bem, recebeu um convite para ter um sócio - amigo dos tempos de televisão - no Rio de Janeiro. Topou. E isso o levou a começar a atender celebridades, prestando serviços para personalidades como Rodrigo Faro, Bruna Marquezine, Sabrina Sato, entre outras - o que deu uma visibilidade por meio de rede social muito relevante.
O negócio começou a escalar ainda mais. O caminho natural para o empreendimento, visando aumentar capilaridade, era expansão por meio de franquias. “Não tinha dinheiro para abrir mais dez filiais, mas, formatando bem as unidades franqueadas, era possível.”
Confira, a seguir, raio-x completo da franquia da CleanNew
- Investimento inicial total estimado: a partir de R$ 59,9 mil
- Faturamento médio mensal: de R$ 14 mil a R$ 30 mil
- Lucro médio mensal: 30%
- Prazo de retorno: de 6 a 12 meses
- Prazo de contrato: 5 anos
- Royalties/mês: R$500 ou 10% do faturamento bruto
- Número de unidades em operação: 53, sendo 40 no Brasil e 13 internacionais
Em algumas unidades, porém, ele não franqueou de imediato: optou por entrar como sócio, tendo 60% de cada loja - com os outros 40% pertencentes a amigos que administrariam o dia a dia. Com o tempo, seguindo o planejamento de transformar as lojas em franquias, doou sua parte com a condição de que se tornassem franqueados da marca. A transição foi feita.
Porém, segundo Paixão, em 2018, parte destes novos franqueados se reuniu questionando o modelo de negócio. “Diziam que eu mentia em contrato”, fala. Em resumo, de acordo com o empresário, os franqueados queriam comprar produtos com outros fornecedores. A questão virou judicial, a CleanNew conseguiu manter o nome original, mas perdeu cerca de metade dos franqueados, representando 70% do faturamento. Além disso, uma nova marca surgiu em dissidência, proveniente, segundo ele, deste grupo de franqueados.
Segundo o vice-presidente de consultoria da 300 Ecossistema de Alto Impacto, Lucien Newton, isso não é tão comum no mercado do franchising, mas possíveis discordâncias podem sempre aparecer entre franqueador e franqueado. E, mesmo este extremo não sendo tão recorrente, é um risco que está presente no setor. A grande causa, de acordo com o especialista, é a falha na comunicação entre as partes.
“Neste caso especificamente, pode ser que, inicialmente, tenha havido uma formatação inadequada para a marca, com um começo meio turvo, não pensado como franquia. Provavelmente, saíram de uma relação societária para uma relação entre franqueado e franqueador, o que deixa um pouco mais complicado o desenho do negócio”, explica o consultor. Nestes cenários, complementa, o ideal é conseguir resolver as pendências com uma comunicação clara e eficiente, para evitar a judicialização - cenário que tem ônus para todos os lados.
“A judicialização é o leite derramado, é o último passo - e o pior deles. Em resumo, a boa comunicação é responsabilidade da franqueadora, de ter aberto canal com os franqueados, para que não se associem com outros porque não se sentem ouvidos.”
O baque foi razoável, mas a marca conseguiu se restabelecer.
Em meados de 2020, a empresa começou a construir a primeira fábrica própria, em Sorocaba (SP). A inauguração foi em 2023.
No ano passado, o faturamento da rede foi de R$ 65 milhões e, para 2024, a projeção é de R$ 100 milhões.
TikTok impulsionou atuação internacional
O fundador da marca também conta que um post feito na rede social TikTok impulsionou a divulgação da CleanNew em outros países.
De acordo com ele, o vídeo com resultado de um processo de impermeabilização viralizou e rendeu novos contatos - que levaram a novas franquias a países como Argentina, Espanha, Arábia Saudita, entre outros.
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