Desde que a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) foi implantada em 2010, para organizar a forma com que o País lida com o lixo, as empresas começaram a corrida para criar estratégias e adaptar processos a fim de atender às novas demandas da lei, que determinou que os setores público e privado gerenciem seus resíduos.
Entre os temas que passaram a fazer parte da agenda de sustentabilidade dos negócios, a logística reversa é um dos principais desafios. Antes, quando uma pessoa descartava uma embalagem de forma inadequada, ninguém sabia de quem era a culpa.
Com a PNRS, a responsabilidade passou a ser dividida entre o cidadão, o poder público e a empresa que colocou a embalagem no mercado e precisa cuidar para que, de alguma forma, ela volte, seja reciclada e entre novamente no ciclo da economia.
Por ano, quase 80 milhões de toneladas de lixo são geradas no País, mas reciclamos somente 4% desse total, segundo dados da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe). Enquanto as grandes empresas lideraram o movimento de cuidar desse montante, com a construção de parques de reciclagem próprios, pequenos e médios negócios vêm apostando em criatividade, comunicação e educação dos consumidores para implantar seus processos de logística reversa.
Um exemplo é a Popai, marca carioca de snacks saudáveis criada em 2016 pelo engenheiro de produção e especialista em inteligência artificial Arthur Vaz. Ao lado de um time de sócios que compartilham a paixão por esporte e vida saudável, ele desenvolveu quatro linhas de produtos (cubos de frutas energéticos, cubos de frutas proteicos, granola premium e chips de mandioca). Mas aí foi preciso achar um jeito de fazer com que os clientes devolvessem as embalagens, feitas de plástico retornável.
“O primeiro trabalho que publiquei para o Congresso de Inovação e Sustentabilidade, quando estava na faculdade, foi sobre logística reversa no Brasil”, conta Vaz. “Que bom que consegui trazer esse aprendizado para a Popai e desenvolver um projeto inovador.”
Ele explica que a empresa pratica logística reversa em círculo aberto, destinando as embalagens a cinco cooperativas associadas. “A gente fecha um quilo mínimo que é economicamente viável para mandar para eles, garantindo o descarte”, fala.
Para conseguir as embalagens de volta, a Popai criou vários incentivos ao consumidor. Lojas parceiras oferecem descontos na próxima compra para os clientes que trazem de volta as embalagens dos produtos da marca. No caso de compras pelo site, foi lançado o Projeto Volta Embalagem, em que as pessoas enviam as embalagens diretamente para a fábrica.
“A gente valorizou a nossa embalagem. Ela virou uma nova moeda, a moeda da Popai, como se fosse um bitcoin”, diz o empreendedor, que fez um estudo para entender qual o valor que essa moeda teria no mercado, pensando em todo o processo de operação da logística reversa.
“Aí a gente aplica em produtos da Popai Outfit, que são itens como boné, caneca, chinelo e blusas de treino que você pode comprar no nosso e-commerce ou ganhar juntando uma quantidade mínima de embalagens.” As “embalagens-moeda” também podem render até R$ 30 de desconto em compras de snacks pelo site.
Parceiros da eureciclo
Fazer parceria com selos que garantem a compensação dos resíduos colocados no mercado é o caminho adotado por muitas PMEs (pequenas e médias empresas) para somar na logística reversa. Uma delas é a Lowko, marca de sorvetes de baixa caloria que tem a expectativa de vender 600 mil potes e faturar R$ 10 milhões até o final do ano.
Segundo o CEO, Rodrigo Stuart, que usa papel cartão e plástico na produção das embalagens, a empresa optou por um plano de compensação que recicla 100% do que é produzido no ano. “Foi a melhor solução que encontramos para conseguir dar esse passo”, diz o empreendedor.
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É também o caso da marca de alimentos plant-based We Nutz, que atende os canais B2B e B2C em todo o território brasileiro e usa sistema de rastreamento com os parceiros logísticos para acompanhar em tempo real o status de todas etapas da produção até os clientes, e da mineira Vida Veg, que tem o maior portfólio de produtos veganos do País. Além de pagar o selo da eureciclo, a empresa usa copos biodegradáveis de mandioca para fazer degustação em suas ações de marketing.
Como a eureciclo oferece diferentes planos de compensação a partir de 22% (mínimo exigido pela lei), os clubes de assinatura são outro segmento que embarcaram na ideia. A Veroo, marca nativa digital que opera inicialmente um clube de assinatura de cafés especiais, se preocupou com o assunto e aderiu ao selo, destinando recursos para reciclar pelo menos 22% das suas embalagens e cápsulas de café.
Já a Leiturinha, que envia livros infantis para assinantes do Brasil inteiro, optou pelo plano que recicla o dobro do material que usa em seus kits. “Nossa parceria com a eureciclo permite que, para cada embalagem da Leiturinha, duas do mesmo material sejam recicladas”, afirma Caroline Lara, coordenadora de curadoria e conteúdo da empresa, que também eliminou o plástico bolha e agora só usa papel reciclável.
O CEO Guilherme Martins também conta que um dos pilares da Leiturinha é levar às crianças a importância da preservação do ambiente. “Por isso temos todos os anos o Mês do Pequeno Consciente, que entrega às famílias livros e materiais sobre sustentabilidade social e ambiental”, diz. “Contribuímos para que a Leiturinha não esteja presente apenas nos momentos em família, mas também na preservação da casa de todos nós, que é o planeta.”
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