Práticas verdes e ESG movimentam certificações e atraem investimentos

Empresas certificadas pelo Sistema B crescem quase 260% entre 2017 e 2022; maioria são pequenos e médios negócios, que usam selos como trampolim para buscar investidores

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Foto do author Ludimila Honorato
Atualização:

A comprovação de práticas sustentáveis por meio de certificações tem ajudado empresas na captação de investimentos. Pequenos e médios negócios são maioria nesse movimento e apostam na chancela para expandir, buscando fundos específicos para empreendimentos verdes. Nessa toada, estão o crescimento das discussões sobre ESG e conscientização do público na hora de escolher um produto.

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No Sistema B, que avalia aspectos de meio ambiente, comunidade, governança, funcionários e clientes, cresceu quase 260% o número de negócios certificados entre 2017 e 2022, indo de 60 para 215 empresas. As certificações concedidas a cada ano também vêm aumentando e ganharam fôlego nos dois últimos anos: foram 29 em 2019, 39 no ano seguinte e 45 no ano passado.

A Sociedade Vegetariana Brasileira concedeu o selo de produto vegano a 240 empresas entre 2017 e 2021. Destas, cerca de 44% são de pequeno porte, 32% são médias e 24% são grandes. O cenário combina com o interesse do público. As buscas no Google por ESG (princípios sociais, ambientais e de governança) vêm numa crescente desde meados de junho de 2020, atingindo pico de popularidade na última semana de abril deste ano.

“A pandemia gerou muitos questionamentos e combinou com momentos políticos e socioambientais muito fortes”, diz Cinthia Gherardi, diretora de relacionamento e marketing do Sistema B. “O conceito do ESG traz essa visão de que sustentabilidade não é só embalagem clara, ação pontual, é algo integrado, que inclui social, ambiental e governança.”

Giulio Peron, do grupo Casa Feito Brasil, afirma que aliar sustentabilidade à inovação é ponto forte para buscar investimento. Foto: Rafael Saes

Empresas de pequeno e médio porte representam 86,5% das B certificadas, o que Cinthia considera natural, pois elas já nascem com o propósito de mudança. Mas a executiva observa que o movimento engaja todas e, embora a proporção de grandes companhias seja menor que 2%, “o poder de transformação delas é grande”. Além disso, é mais desafiador passar pela verificação, que inclui um questionário com mais de 200 perguntas e o envio de documentos detalhados que comprovem o que é declarado. Isso pode demorar anos.

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Em busca do dinheiro

Os empreendimentos menores ganham agilidade e usam o endosso da certificação como atrativo para investidores. É no que vai apostar o grupo Casa Feito Brasil, composto pelas marcas Feito Brasil e Quintal Dermocosméticos. O negócio se arquiteta para receber o primeiro aporte, com início das negociações em meados do próximo semestre. Empresa B desde 2019, após oito meses de trâmites, a companhia ainda tem o selo EcoCert de cosméticos orgânicos e naturais, que atesta uma cadeia produtiva sustentável.

Para o CEO Giulio Peron, as empresas do futuro são sustentáveis e o futuro do grupo é a expansão, então ambos estão atrelados. “A pauta ESG é muito importante para os fundos de investimento, nossos parceiros estão olhando isso com muita cautela e existem fundos específicos. A pauta de sustentabilidade vai pesar muito e a gente está de olho especificamente nisso, que é um dos nossos principais diferenciais quando se fala de crescimento”, afirma.

Além da bandeira verde que reflete o ambiental, ele diz ser essencial ter sustentabilidade social e financeira, outros pontos de atenção para os investidores. Na hora do pitch, o destaque como indústria são tecnologia, visão vanguardista e busca por inovação e novos ingredientes. Desde 2018, a empresa praticamente dobrou o faturamento ano a ano e, de 2019 para cá, obteve crescimento de 82% a cada ano, sendo 28% advindos do e-commerce direto ao consumidor.

O grupo planeja investir na expansão comercial - novos produtos, foco no digital e entrar no canal farmacêutico - e nas áreas de pesquisa, desenvolvimento e indústria. Os planos futuros incluem fortalecer a internacionalização da marca, hoje com exportação já feita para França, Austrália e Estados Unidos. Ter lojas próprias é mais uma aposta, que começou com o primeiro ponto físico da Feito Brasil inaugurado em 1º de maio no CJ Shops Jardins, região nobre da capital paulista. A data coincidiu com o aniversário de 18 anos da marca fundada por Lena Peron, mãe de Giulio.

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Dicas de veteranos

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Há oito anos no mercado, a Insecta Shoes é a única Empresa B de calçados no Brasil, certificada em 2016 após seis meses de verificação. “O Sistema B traz um questionário muito legal que nos desafia a cada recertificação e nos guia para criar novas metas de sustentabilidade”, diz Barbara Mattivy, CEO e sócia-fundadora. A recertificação é feita a cada três anos e sempre há atualização nas perguntas. Desde 2017, houve 38 descertificações, ou seja, empresas que perderam o selo.

Em 2018, a empresa recebeu cerca de R$ 300 mil de investimento, um smart money que levou investidores qualificados para o dia a dia do negócio, ajudando a profissionalizá-lo. “Eu comecei a conversar com eles antes do certificado, em 2016, mas com certeza ele validou todo nosso posicionamento e trouxe mais seriedade para os nossos desafios de sustentabilidade.”

No ano passado, a Insecta captou R$ 1,8 milhão em três meses numa rodada de equity crowdfunding (financiamento coletivo de investidores) por meio da Platta, que atua com negócios de impacto. “Para a gente, foi superestratégico, porque queria trazer sócios que fossem alinhados com nosso propósito de sustentabilidade. Ter sido a primeira empresa de calçados a se tornar Empresa B no Brasil foi algo que, de novo, trouxe mais seriedade e validação para o nosso case e pitch”, afirma.

Barbara Mattivy, fundadora e CEO da Insecta Shoes, vê as certificações como um guia para melhorar as práticas sustentáveis da empresa. Foto: Gabriela Biló/Estadão - 19/04/2018

O próprio Sistema B ajudou a divulgar a campanha de investimentos da marca, assim como contribui para o crescimento das que integram o movimento, conta Cinthia Gherardi. “A gente tem encontros de líderes e rodadas de negócio. Também somos procurados por Empresas B em fase de captação e que gostariam de ter rodada com empresas na rede que são de investimento de impacto.”

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Quem também aproveitou esse ecossistema foi a empresa de leites veganos Nude. O fundador Alexander Appel conta que se conectou com distribuidores e e-commerces para ampliar o alcance dos produtos. A foodtech usufruiu de outro benefício: ser, primeiro, uma Empresa B Pendente.

“Se a empresa ainda não tem um ano fiscal, pode entrar com pedido dessa certificação, uma recomendação que faço às empresas que estão começando, porque ajuda a pensar em várias coisas que a princípio não estão no radar”, diz a CEO e cofundadora Giovanna Meneghel. Lançada em dezembro de 2020, a marca tornou-se oficialmente uma Empresa B em outubro do ano passado.

Alexander Appel e Giovanna Meneghel, fundadores da Nude, incentivam uma economia de baixo carbono por meio da marca. Foto: Mariana Valverde

A executiva comenta que as certificações abrem espaço para melhorias e avançar “de verdade” nas práticas sustentáveis, não só como “um discurso de marketing”. Em janeiro, a empresa recebeu aporte de R$ 25 milhões, vindos de um fundo de impacto. “Como marca de bem de consumo, já é difícil levantar capital no Brasil, poucos fundos olham. Falei com 90 e metade declinou porque não olha o setor”, conta Appel, que recomenda pesquisar por fundos internacionais.

Para conquistar o montante, ele diz que o diferencial da foodtech é estimular o consumidor para uma economia de baixo carbono, algo que a empresa rastreia na cadeia produtiva e estampa nas embalagens. Ter a certificação do Sistema B, selos de produto vegano e orgânico e ser membro do Programa Brasileiro GHG Protocol também contribuíram para garantir o papel da startup diante dos investidores.

O empenho não escapa aos olhos do consumidor, dizem os empreendedores. “Na oferta, o desafio da Nude é distribuição. Como convenço o consumidor? A sustentabilidade acaba sendo um drive de crescimento pela demanda”, diz Appel, que já mira nova rodada de investimento em 2023. Barbara, da Insecta Shoes, completa: “Falando do Sistema B, no aspecto do consumidor, é algo que traz mais segurança e distância do greenwashing (falsa sustentabilidade). No site, dá para ver a pontuação da empresa, onde pontua mais.”

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Como se tornar empresa do Sistema B

Avaliação Faça a avaliação de impacto disponível no site do Sistema B (clique aqui, em inglês) para entender o desempenho da sua empresa e compará-lo com o de outras.

Ajuda Aproveite os programas do Sistema B que auxiliam empresas de todos os portes a construírem um caminho de impacto positivo.

Convencimento Engaje a liderança, pois o processo de certificação requer evidências sólidas e envolvimento de quem guia a empresa na jornada de impacto.

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