As pesquisadoras Larissa Souza, 31, e Daniela Vieira, 36, estudavam as propriedades da pimenta-rosa, quando resolveram investir nas utilidades do grão ainda subaproveitadas no mercado: as ações bactericida e fungicida. À base do fruto, elas desenvolveram um spray que ajuda a limpar a superfície de vasos sanitários e uma espuma para higienizar as mãos.
A ideia surgiu quando Vieira, ao levar a filha ao banheiro público de um centro comercial, se viu obrigada a segurá-la para que não encostasse no assento do vaso sanitário. A dificuldade, compartilhada por diversos pais, motivou as colegas, ambas formadas em Química, a procurar uma solução.
A Bendita Pimenta surgiu no início de 2023, após cerca de um ano de testes até chegar à formulação final do spray – primeiro produto da marca. Na época, Souza tornou-se MEI (microempreendedora individual) para formalizar o negócio. Ocupada com outras duas empresas, Vieira consta como colaboradora na empresa.
Spray de pimenta não tem relação com produto usado como arma
Muitas pessoas confundem o spray à base de pimenta-rosa com o famoso spray de pimenta, usado como arma de defesa pessoal. No entanto, não há nenhuma semelhança, diz Souza: “A pimenta-rosa não tem a substância capsaicina, que causa irritação; é uma especiaria bem suave.”
A pimenta-rosa é um grão tradicional em São Mateus, no Espírito Santo – cidade natal das criadoras da Bendita Pimenta. O município foi reconhecido em 2023 pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) como centro produtor da especiaria.
“A pimenta-rosa é muito comercializada como tempero, para aromaterapia e fabricação de óleos essenciais. Mas, durante as nossas pesquisas, vimos que ela também tem características bactericidas e fungicidas pouco exploradas, então pensamos em um produto com esses ativos”, explica Souza.
O spray tem 60 ml e custa R$ 21. “É feito para caber na bolsa das mulheres”, que representam quase 100% do público consumidor.
Além do vaso sanitário, o spray da Bendita Pimenta é indicado para outros tipos de superfície, exceto eletrônicos porque tem água na sua composição. “Nossos clientes usam o produto em trocadores de fraldas, maçanetas, mesas de restaurantes e praças de alimentação, malas e mesinhas do avião”, declara Souza.
Convencer clientes a usar spray de pimenta é desafio
Imersa no mundo acadêmico, Larissa Souza pouco sabia sobre empreender. Para conseguir tocar o negócio, ela e Vieira participaram de programas do Sebrae e estudaram mais a fundo o mercado de produtos naturais.
“Foi tudo muito novo para mim”, admite Souza. “Como Daniela já tinha outros negócios, ela também me auxilia muito na parte operacional”, acrescenta.
Para Souza, o maior desafio deles é convencer as pessoas da importância dos seus produtos. “Manter a higiene fora de casa tornou-se comum na pandemia, com o álcool em gel. Depois que a crise passou, sentimos que isso ficou de lado. Então nossa principal dificuldade é mostrar a necessidade de mantermos esses hábitos”, explica.
À frente do marketing da empresa, Souza conseguiu parcerias com pequenos criadores de conteúdo para divulgar a Bendita Pimenta. “Não tivemos grandes resultados relacionados a vendas por enquanto, mas houve um crescimento de visualizações na página da marca”, analisa.
A conta da Bendita Pimenta no Instagram tem mais de 1.800 seguidores, e alterna entre conteúdos educativos e que mostram a praticidade dos produtos. Um dos vídeos publicados na página tem mais de 2 milhões de visualizações. Ele replica imagens de um experimento que mostra como microorganismos se espalham facilmente em lugares fechados.
O spray da Bendita Pimenta é eficaz contra a Escherichia coli, uma bactéria que o álcool não elimina. Essa bactéria pode causar infecções gastrointestinais e é muito encontrada em banheiros públicos porque pode estar presente nas fezes. “Muitas pessoas não têm os cuidados devidos na área da higiene e isso pode passar despercebido na limpeza de banheiros públicos”, destaca Souza.
Por outro lado, o produto não tem eficácia comprovada contra vírus e outras bactérias, para os quais o álcool funciona. “Ainda não conseguimos fazer essa comprovação porque são testes caros”, diz.
A pesquisadora ressalta que não encostar no assento do vaso sanitário também pode oferecer perigo porque a posição, além de desconfortável, tensiona o músculo pélvico das mulheres. Isso impede que a bexiga seja completamente esvaziada, gerando o risco de contrair uma infecção urinária.
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Espuma para higienizar as mãos
A empresa nasceu com o spray para a limpeza de superfícies. Souza e Vieira passaram a divulgar o produto nas redes sociais, amigas da universidade também passaram a comprar. Em pouco tempo, clientes começaram a utilizá-lo para a limpeza das mãos.
Elas fizeram testes hipoalergênicos e, no início de 2024, lançaram a espuma para a higienização das mãos – responsável hoje por 50% das vendas. “Fizemos um novo produto para garantir a segurança e criamos a espuma também pelo aspecto, pela sensação na pele”, explica Souza.
Segundo a capixaba, o produto é seguro tanto para adultos, quanto para crianças. Sem álcool na fórmula, ele promete não ressecar as mãos. A espuma custa R$ 25; o kit com o spray e espuma fica em R$ 40.
Bendita Pimenta quer lançar mais produtos
Os produtos da Bendita Pimenta são fabricados na sede de uma das empresas de Daniela Vieira, em Vila Velha, na Grande Vitória. O seu desenvolvimento recebeu recursos de editais estaduais de incentivo à pesquisa.
No momento, a venda dos produtos é feita por meio do WhatsApp e do Instagram. Os envios são feitos para todas as regiões do Brasil. Em 2024, a Bendita Pimenta chegou a ter um site para automatizar as vendas, mas ele teve um problema e está fora do ar no momento.
Para 2025, os planos da dupla são fortalecer a empresa e validar o negócio. Elas também querem expandir a cartela de produtos, com pretensão de lançar um lenço umedecido e novos aromas.
Infectologista diz que importante é lavar bem as mãos
O médico infectologista Gleuber Sousa, especialista pelo Hospital Couto Maia, de Salvador (BA), e intensivista em UTIs, afirma que o contato com a superfície de vasos sanitários públicos pode gerar riscos, mas “não são tão grandes quanto a maioria das pessoas acredita”.
Esse contato não oferece risco elevado para infecções mais comuns, como gripe e pneumonia. Os riscos são maiores para doenças gastrointestinais causadas por vírus e bactérias “Quanto mais pessoas utilizam, maior a chance”, explica. Outras infecções fúngicas, como micoses, também são uma possibilidade.
O spray de higienização da Bendita Pimenta tem ação comprovada contra a bactéria Escherichia coli. De acordo com Gleuber Sousa, este microrganismo, habitual nas fezes, pode causar quadros gastrointestinais e infecção urinária.
No entanto, ele acredita que haja contaminações mais importantes a serem evitadas em ambientes como o banheiro público, causadas por Salmonella e Shigella, por exemplo, ou por norovírus e rotavírus – todas eliminadas pelo álcool.
O infectologista reforça que as mãos são o maior veículo de transporte de bactérias, vírus e parasitas. “A pessoa pega no local contaminado (na maçaneta, vaso, copo, superfície) e coloca a mão na boca em seguida, ou a leva ao nariz. Assim se contrai a maioria das doenças: ingerindo o microrganismo.”
Mais do que a higienização dos ambientes e objetos, a recomendação mais eficaz é a de lavar as mãos com frequência, especialmente antes e depois das necessidades fisiológicas. “Se lavar adequadamente as mãos com água e sabão, não vai se contaminar”, diz.
O famoso “malabarismo” das mulheres ao usar banheiros públicos para evitar encostar no vaso sanitário não é recomendado, destaca o médico.
Além da possibilidade de causar infecção urinária por não eliminar a urina adequadamente, a posição também favorece o prolapso vaginal ou retal -- quando os músculos que sustentam a vagina e o reto são enfraquecidos, fazendo com que essas estruturas “cedam” e, em alguns casos, saiam parcialmente para fora do corpo.
Mercado de higiene está aquecido, avalia consultor de negócios
O consultor de negócios do Sebrae-ES Pedro Rigo avalia que o mercado de higiene permanece aquecido. Segundo ele, ainda que a higienização constante fora de casa não seja mais uma exigência com o fim da pandemia, são comportamentos que “ficaram na cabeça dos brasileiros”.
No mercado, somente o hábito não é suficiente. Segundo Rigo, é preciso que a marca crie uma “conexão” com o consumidor. Para isso, é ideal que os empreendedores estudem o público que querem atingir. No caso da Bendita Pimenta, ele sugere uma campanha de conscientização para estimular que as pessoas entendam a necessidade dos produtos.
A pesquisa de público é um dos pontos do plano de negócio – etapa primordial para qualquer empresa, desde a mais iniciante. “Todo negócio precisa ter perspectivas: do que quer vender, do quanto quer faturar, da quantidade de despesas, da relação com o mercado, do preço de venda, de como será feita a comunicação. Tudo isso precisa ser definido para uma boa gestão”, afirma o especialista.
Além disso, o cuidado com as finanças deve ser redobrado. “O descontrole financeiro é um dos maiores erros de quem está começando”, afirma Rigo. É simples: “O dinheiro que entra na receita da empresa tem que ser maior do que o que o empreendedor quer tirar para usos pessoais.”
Para começar a empreender, Rigo acredita que a melhor alternativa é o MEI. Atualmente, o limite anual de faturamento para o modelo é de R$ 81 mil por ano, equivalente a cerca de R$ 6.750 por mês.
“O registro é fácil, feito pela internet; não há necessidade de contador ou de empregados; tem garantias previdenciárias; e facilita a relação com fornecedores e clientes, com a formalização do CNPJ e a possibilidade da emissão de notas fiscais”, destaca o consultor.
Ao passo em que o faturamento da empresa cresce, o empreendedor pode passar para outros modelos de inscrição formal. O próximo passo é o ME (microempreendedor), que exige uma estrutura um pouco mais completa, e permite o faturamento anual de até R$ 350 mil.
Avaliações de clientes
Por ser uma empresa ainda em período inicial, a Bendita Pimenta não tem avaliações de clientes no Google nem no Reclame Aqui.