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Uber, Airbnb e UFC: quando quebrar as regras faz parte do plano de negócios

Estudo mostra como muitas organizações prosperam ao desrespeitar abertamente ou adotar violação a leis e regras vigentes como uma estratégia

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Por Academy of Management Insights
Atualização:

De armas inteligentes e substitutos de salsicha a drogas psicodélicas e robôs para fins sexuais, algumas empresas rompem convenções sociais e infringem leis abertamente. Algumas se safam e até mesmo conquistam leis elaboradas a seu favor. Outras podem ser multadas e inclusive fechadas.

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Embora pesquisadores “enfatizem há muito tempo a importância da conformidade com as normas, regras e leis vigentes, muitas organizações contemporâneas parecem prosperar desrespeitando-as abertamente, adotando a violação delas, de fato, como uma estratégia”, de acordo com um artigo da Academy of Management Review.

Alessandro Piazza, da Universidade Rice; Patrick Bergemann, da Universidade da Califórnia em Irvine; e Wesley Helms, da Universidade Brock; deram vários exemplos desse comportamento em “Getting Away with It (Or Not): The Social Control of Organizational Deviance” (Saindo impune – ou não: O controle social da transgressão de empresas, em tradução livre).

Como os autores observaram, “em 2010, uma startup recém-fundada na área da Baía de São Francisco, chamada UberCab, começou oferecendo um serviço por meio do qual os usuários podiam chamar um carro preto luxuoso usando um aplicativo em seus smartphones. Apesar de ter se tornado popular imediatamente, a legalidade das atividades da empresa passou a ser contestada, pois a UberCab recebia ordens das autoridades municipais de São Francisco para parar e desistir do negócio, sob o argumento de que ela estava operando um serviço não autorizado de táxi e limusine.

Entretanto, em vez de recuar, a empresa dobrou a aposta e, em 2012, lançou a opção UberX, que permitia praticamente qualquer pessoa dirigir veículos não luxuosos para a empresa, tendo como exigências apenas os documentos do carro e a verificação de antecedentes. Ao fazer isso, a startup se deparou com inúmeros problemas, tanto com as empresas de táxi, como com as autoridades municipais, devido às possíveis ameaças à concorrência e à segurança pública. A empresa, hoje conhecida como Uber, entendeu que enfrentaria desafios legais e regulatórios, mas escolheu seguir em frente de qualquer forma. Embora o comportamento da Uber possa parecer chocante à primeira vista, dificilmente ele é um caso isolado na economia contemporânea”.

Airbnb desrespeita regulamentações municipais por todo o mundo há anos Foto: Reuters

Piazza, Bergemann e Helms também escreveram que “o Airbnb – talvez a maior e mais conhecida plataforma on-line para hospedagem de curta duração – há muito desrespeita regulamentações municipais por todo o mundo. E fora do setor de tecnologia, a Ultimate Fighting Championship (UFC) – empresa que promove os combates esportivos de contato total conhecidos como Artes Marciais Mistas (MMA, na sigla em inglês) – prosperou apesar da controvérsia, usando estrategicamente embates com políticos e outros reguladores globalmente para conquistar a aceitação geral”.

“Nos casos da Uber e do Airbnb, as autoridades municipais em todo o mundo entraram em cena para fazer cumprir as leis que as empresas tinham violado. No caso da UFC, muitos estados americanos se mexeram para proibir o MMA, enquanto órgãos profissionais proeminentes, como a Associação Médica Americana e a Associação Nacional de Televisão a Cabo, recomendaram uma proibição geral. As organizações transgressoras podem, portanto, encarar a escolha de se adequar ao status quo, ou encerrar as atividades completamente.

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Ao mesmo tempo, ir contra as normas pode ser frutífero – como foi, no fim das contas, para a Uber, o Airbnb e a UFC –, pois marca o início de um processo que às vezes pode levar a resultados que são vantajosos para essas empresas. Essa compensação destaca o fato de que as organizações que quebram regras podem – e conseguem – sair vitoriosas desses confrontos. Nos casos mais favoráveis, elas são capazes de continuar seguindo sua estratégia sem se deixar abater, às vezes até mesmo ganhando influência sobre como as regras são formuladas”.

O setor de tecnologia – “como exemplificado pelos mantras do Vale do Silício, como ‘mexa-se rápido e quebre as coisas’ e ‘peça perdão, não permissão’” – também oferece exemplos.

A ascensão e queda da Napster – empresa pioneira no compartilhamento de arquivos lançada em 1999, que permitia aos indivíduos compartilhar e baixar livremente músicas protegidas por direitos autorais por meio de uma rede peer-to-peer – é um exemplo relevante. Embora tenha se tornado imensamente popular e atraído uma cobertura enorme da mídia, a empresa fechou as portas depois de perder um processo movido contra ela pela Associação da Indústria Fonográfica dos Estados Unidos (RIAA, na sigla em inglês)”, escreveram os autores.

“As empresas de tecnologia, como a Apple, há muito são criticadas pelo envolvimento em evasão fiscal, mantendo no exterior centenas de bilhões de dólares em lucros. Entretanto, depois de pressionar fortemente o governo durante anos, em 2017, elas conseguiram um belo negócio na forma de um imposto único e baixo sobre os lucros repatriados, gerando a economia de, apenas no caso da Apple, US$ 40 bilhões em impostos.”

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Os autores focaram em organizações que adotavam uma estratégia de negócios deliberada e abertamente “em desacordo com as expectativas da sociedade, as normas informais ou a legislação”. Eles escreveram que “a lei é um controle social, assim como a etiqueta, os costumes, a ética, a burocracia... o escopo do controle social como um fenômeno é extraordinariamente amplo – não apenas inclui tipos de penalizações legais e bastante formalizadas, como confiscos de bens, sentenças de prisão e penas de morte, mas também pressão entre pares e ostracismo informal”.

Apesar de todos os exemplos recentes, Piazza disse que ainda é difícil para os líderes de negócios saber quando quebrar as regras pode ser uma receita para o sucesso.

“Existe uma percepção segundo a qual as pessoas acham que, em muitos casos, quebrar as regras compensa. Mas, na realidade, em muitos casos, simplesmente não fazemos ideia. Porque geralmente quebrar as regras vem com uma reação negativa. Mas nosso artigo descreve uma forma mais estruturada de pensar sobre isso, no sentido de considerar: ‘se quebrar as regras, o que poderia acontecer com você?’”, explicou.

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Piazza mencionou uma série de consequências.

  • Em 2017, o Camboja proibiu o Ambrosia Labs, com sede em Utah, de exportar leite materno de mulheres cambojanas pobres para pasteurização, distribuição e vendas nos Estados Unidos.
  • Houston impediu a KinkySdollS, com sede em Toronto, de abrir um “bordel de robôs” para alugar bonecas sexuais por hora.
  • Boicotes obrigaram os fabricantes dos EUA a desistir das armas de fogo com reconhecimento de digitais.
  • Lobistas agrícolas pressionaram os estados americanos a vetar que alimentos à base de plantas fossem rotulados como “salsicha” ou “hambúrguer”.
  • Empresários dos EUA estão vendendo a droga psicodélica à base de plantas, ayahuasca, como um tratamento para depressão e ansiedade, registrando-se como organizações religiosas tradicionais.
  • A princípio, São Francisco proibiu as empresas de patinetes elétricos de operarem sem licença, mas depois autorizou suas atividades.

“Isso também é relevante para os investidores. Por exemplo, há muito burburinho agora entre os capitalistas de risco a respeito de investir em psicodélicos como tratamentos, como a cetamina. Tentar prever e calcular quais serão as consequências é altamente relevante para avaliar se a decisão de investimento faz sentido”, observou Piazza.

“Independentemente de ser de fato mais comum ou não, quebrar as regras, a retórica sobre a disrupção, parece ser cada vez mais glorificada hoje. A disrupção é vista de forma positiva e bastante prevalente em todos os lugares”, disse ele.

“Para os líderes de negócios considerando quebrar regras, há sempre uma compensação inerente. Transgredir, em alguns casos, permite a você fazer coisas que não foram feitas antes, ou entrar em territórios muitas vezes desconhecidos. Ao mesmo tempo, obviamente, há uma razão para outras pessoas não terem feito isso antes. Essas coisas com frequência são acompanhadas por um preço à reputação ou ao bolso. É importante ir além do mantra ‘você precisa se mexer rápido e quebrar as coisas’, blá, blá, blá. Pense no que você está infringindo e quem talvez reaja a isso. Tente pensar nisso de forma estruturada: quais são as consequências específicas? E muitas delas, é claro, não podem ser previstas com clareza. Mas, apesar disso, acho que é importante tentar e imaginar a questão dessa forma”, disse Piazza./TRADUÇÃO DE ROMINA CÁCIA

© 2023 / Academy of Management / Distributed by The New York Times Licensing Group

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