Para quem achava que Tarcísio de Freitas (Republicanos) iria se afastar do bolsonarismo ao assumir o comando do Palácio dos Bandeirantes, os primeiros sete meses de governo serviram para mostrar que o atual governador paulista ainda está preso ao ex-chefe em ações da gestão e também no discurso político. Mas não por acaso. Ao afirmar nesta quarta, 9, que seguirá as ordens do ex-presidente na eleição de 2026, apoiando o candidato que Jair Bolsonaro (PL) indicar, Tarcísio agrada o padrinho político, seus seguidores e, de quebra, os eleitores mais tradicionais do Estado que estão cansados de eleger um governador que só pensa no Palácio do Planalto.
Se de fato Tarcísio é um técnico, basta analisar as estatísticas. Os dois representantes paulistas que decidiram abrir mão da reeleição no Estado pela ambição de tornar-se presidentes não alcançaram tal feito. Em 2010, José Serra (PSDB) foi avisado por aliados que renunciar a um governo bem avaliado para confrontar a candidata à sucessão do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva seria arriscado. O tucano conseguiu chegar ao segundo turno, mas perdeu para Dilma Rousseff.
Ano passado, João Doria nem sequer obteve apoio para trilhar o mesmo caminho. Renunciou ao cargo para iniciar uma pré-campanha que, isolada, culminou em aposentadoria da vida pública. Vale lembrar aqui que também seu candidato a sucessor em São Paulo, Rodrigo Garcia (PSDB), saiu derrotado, assistindo a Tarcísio assumir o posto de antipetista entre os eleitores paulistas. No caso de Geraldo Alckmin, hoje vice-presidente de Lula, as decisões foram mais fáceis. Em suas duas tentativas nacionais, o ex-tucano cumpria segundo mandato em São Paulo.
Se não conhecia, o histórico de derrotas acumulado por governadores paulistas em campanhas presidenciais já foi apresentado ao carioca Tarcísio, que agora parece seguir os conselhos de seu secretário de Governo, Gilberto Kassab (PSD), e dedicar-se à reeleição. Ao podcast “Flow”, o ex-ministro de Bolsonaro declarou que não será candidato e que “está mais do que realizado com a chegada ao comando de São Paulo”.
O discurso se alinha às ações tomadas por Tarcísio nas últimas semanas. Em tom bem mais radical do que moderado, o governador classificou as mortes praticadas pela Polícia Militar no Guarujá - foram ao menos 16 -, após o assassinato de um agente do grupo de elite da PM, como “efeito colateral”. Também respaldou a decisão de seu secretário de Educação, Renato Feder, de rejeitar 10 milhões de livros didáticos fornecidos pelo Ministério da Educação aos estudantes paulistas para oferecer ensino baseado em conteúdo digital e próprio.
Como é sabido, até 2026 muita coisa pode mudar. Lula, por exemplo, pode se assumir candidato à reeleição e Bolsonaro pode passar a responder não apenas eleitoralmente, mas criminalmente por suas ações na Presidência. De olho nas possibilidades, Tarcísio segue na lista de apostas.
Assumir-se interessado em disputar o Planalto dias depois de seu colega mineiro, Romeu Zema (Novo), afirmar que os Estados do Sul e do Sudeste devem se unir contra a força política do Norte e Nordeste, numa fala que ganhou conotação separatista, não seria estratégia acertada nem para um técnico, quanto mais para o agora político Tarcísio.
Na dúvida, o governador segue batendo continência a Bolsonaro, que tem frequentado mais São Paulo e também o Bandeirantes, onde passou a se hospedar a convite do dono da casa. Ambos, aliás, já se encontraram ao menos seis vezes em terras paulistas desde que o ex-presidente perdeu e Tarcísio ganhou poder.
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