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Agiotas e corretores: Inquéritos da PF mostram esquema usado para desviar recursos de emendas

Polícia Federal já concluiu maior parte das investigações, mas até agora Procuradoria-Geral da República ofereceu denúncia em apenas um caso: a Operação Emendário; procurados, deputados envolvidos não se manifestaram

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Foto do author Vera Rosa

BRASÍLIA – Um sofisticado esquema de compra e venda de emendas parlamentares ao Orçamento, envolvendo até mesmo agiotas, está na mira da Polícia Federal. Embora recentemente a Procuradoria-Geral da República (PGR) tenha apresentado denúncia ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra três deputados, ao menos outros dois inquéritos, concluídos pela PF há cerca de dois anos, continuam à espera de uma decisão.

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A investigação que vasculhou os negócios dos deputados do PL Josimar Maranhãozinho (MA), Bosco Costa (SE) e Pastor Gil (MA) ganhou um sugestivo nome: Operação Emendário.

O Estadão apurou que o caso, sob sigilo, é uma espécie de laboratório de como funciona a aliança entre parlamentares, prefeitos e empresas para desviar recursos públicos. A denúncia está nas mãos do ministro do STF, Cristiano Zanin.

O deputado Josimar Maranhãozinho foi denunciado pela Procuradoria-Geral da República na Operação Emendário.  Foto: Câmara dos Deputados/Divulgação

No celular de Maranhãozinho, a Polícia Federal encontrou troca de mensagens com os outros dois deputados denunciados e também com o empresário Josival Cavalcanti da Silva, o Pacovan, sobre a negociação de emendas para o município de São José de Ribamar (MA).

Além disso, agentes da PF descobriram o que chamam de “planilha da corrupção”, indicando a fatia que cabia a cada um no esquema. Maranhãozinho, Bosco Costa e Pastor Gil foram procurados, mas não responderam.

Agiota foi assassinado em junho

Pacovan era conhecido como agiota eleitoral e foi morto a tiros, em 14 de junho, na cidade de Zé Doca (MA), a 310 quilômetros de São Luís. De acordo com a Polícia Civil do Maranhão, porém, o assassinato não tem relação com o esquema batizado de “feirão das emendas”, mas, sim, com uma briga entre antigos sócios por causa de dívida.

A distribuição de emendas ao Orçamento tem sido objeto de uma queda de braço em Brasília depois que o ministro do STF Flávio Dino suspendeu a liberação desses recursos. O Palácio do Planalto e o Congresso ainda não chegaram a um acordo sobre como será o novo modelo de pagamento.

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Dino deu prazo para que a Câmara e o Senado estabeleçam regras de transparência e rastreabilidade no processo, mas até hoje não há consenso sobre o que fazer. Diante das divergências, a tentativa de resolução do imbróglio foi empurrada para depois das eleições municipais, que têm o primeiro turno marcado para este domingo, 6.

O ministro do STF Flávio Dino suspendeu o pagamento de emendas impositivas até a edição de novas regras que permitam rastrear o destino dos recursos. Foto: WILTON JUNIOR/Estadão

Atualmente, há 13 inquéritos sobre desvio dessas verbas tramitando no Supremo, além de apurações na Controladoria-Geral da União (CGU). No primeiro relatório enviado a Dino, a CGU concluiu que as emendas de comissão repetem o mecanismo do orçamento secreto, prática revelada pelo Estadão.

As operações feitas até agora pela PF indicaram que o esquema tem várias ramificações. Existe compra de emendas por parte de agiotas eleitorais, que financiam campanhas de candidatos e depois fazem negócios com prefeitos que ajudaram a eleger.

Além disso, há parlamentares que pagam uma espécie de “pedágio” para que colegas de outros Estados destinem o dinheiro de suas emendas para onde eles querem.

No mercado em que se transformou essa fatia do Orçamento, a intermediação desses valores também pode ser feita por um corretor, lobista do Congresso que ganha comissão.

Ao chegar na prefeitura selecionada, o dinheiro acaba sendo desviado para um cipoal de empresas encarregadas da obra, como pavimentação de estradas. Muitas dessas firmas são do próprio parlamentar, mas estão em nome de “laranjas”, ou de seus parentes.

Nesse esquema, as prefeituras acabam funcionando como fontes geradoras de recursos para deputados e senadores. É por isso que, nas eleições municipais, como as que vão ocorrer neste mês de outubro, congressistas tentam eleger os “seus” prefeitos.

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Em tese, a verba do Orçamento é destinada por parlamentares para obras e serviços em seus redutos eleitorais. A liberação dos recursos muitas vezes acaba virando moeda de troca no Congresso durante votações de interesse do Palácio do Planalto.

Emendas Pix estão no centro das investigações

Antes de oferecer denúncia contra Maranhãozinho, Bosco Costa e Pastor Gil, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, moveu no Supremo uma ação direta de inconstitucionalidade contra as emendas Pix. Trata-se de uma modalidade de repasses orçamentários na qual não se sabe onde e nem para quê as quantias serão usadas.

O Orçamento de 2024 reservou R$ 8,2 bilhões para esse tipo de emenda, que está no centro das investigações. Para os agentes da PF, rastrear o caminho do dinheiro que circula por esse instrumento criado em 2019, no governo de Jair Bolsonaro, é praticamente impossível. No caso das prefeituras, por exemplo, a verba “desvinculada” cai num fundo onde são depositados recursos de várias áreas.

Outras duas diligências que também envolvem Maranhãozinho ainda aguardam despacho na Procuradoria-Geral da República. O inquérito mais antigo é resultado da Operação Descalabro, de dezembro de 2021. À época, o deputado foi flagrado manuseando maços de dinheiro, que, segundo a PF, tinha como origem o desvio de recursos de emendas.

A Operação Engrenagem mostra, por sua vez, que Maranhãozinho recorreu a dois ministérios com o objetivo de enviar dinheiro para a mesma obra. A PGR, no entanto, ainda não se manifestou sobre nenhum dos dois inquéritos.

O ministro-chefe da Secretaria de Relações Institucionais (SRI), Alexandre Padilha, disse ao Estadão que não tem conhecimento desses fatos. “Nunca chegou à SRI denúncias sobre compra e venda de emendas, agiotagem ou corretagem”, afirmou Padilha. “Quem inicia de imediato o processo de apuração, em casos assim, é a CGU e a PF”, insistiu ele.

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