BRASÍLIA - O engenheiro eletricista Renan Senna é um dos líderes da manifestação de domingo, 3, em Brasília, para pedir a destituição do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e a expulsão dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Senna é a pessoa que foi flagrada, dois dias antes, no dia 1º de maio, agredindo uma enfermeira que participava de um ato pacífico de sua classe, a favor do isolamento social, por causa da pandemia do coronavírus.
Ligado a grupos de direita que pedem ações como o fechamento do STF e que seus ministros sejam julgados por crimes por uma “corte militar”, Renan Senna teve participação direta na organização do ato e estava presente na Praça dos Três Poderes no domingo. Sua atuação foi confirmada ao Estado pela Polícia Militar do Distrito Federal, que detinha, inclusive, o contato de Senna como um dos representantes da manifestação. O caso é investigado pela Procuradoria da República no Distrito Federal. Renan pode pegar até um ano e quatro meses de prisão (ver abaixo).
Na sexta-feira, no Dia do Trabalho, ele agrediu uma enfermeira que participava de um ato pacífico. Nas imagens gravadas por pessoas que estavam no local, Senna aparece xingando e indo para cima da mulher, que é empurrada. Outros entram em sua frente para protegê-la. Senna estava acompanhado de outros dois bolsonaristas. Todos foram identificados pelo Conselho Regional de Enfermagem do DF, que já informou que vai processá-los.
Histórico
Renan Senna também é o responsável pela colocação de faixas com ofensas e xingamentos contra o presidente da China, Xi Jinping, no dia 20 de março. Os cartazes posicionados na frente da Embaixada Chinesa em Brasília traziam fotos do presidente Xi Jinping e xingamentos em inglês e português, com a hashtag “China Lied People Died (China mentiu pessoas morreram)”.
Dois dias antes desse episódio na representação diplomática, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente Jair Bolsonaro, tinha ido às redes sociais para culpar a China pela disseminação do coronavírus e omissão de informações. O mal-estar provocou a uma forte reação da Embaixada da China, levando Bolsonaro a procurar Xi Jinping quatro dias depois, para tentar amainar a crise diplomática. Durou pouco. Alguns dias depois a China era atacada novamente por Eduardo Bolsonaro e pelo ministro da Educação, Abraham Weintraub, que fez uma publicação considerada racista nas redes sociais.
A reportagem procurou Renan Senna diversas vezes, mas não obteve retorno. Segundo o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, comandado por Damares Alves, ele trabalhou como funcionário terceirizado na pasta até o mês passado. Em nota, o ministério informou o ex-colaborador atuava como assistente técnico administrativo na Coordenação-Geral de Assuntos Socioeducativos, onde cumpriu tarefas até o dia 7 de abril.
De acordo com a pasta, Senna não possui acesso à rede de dados nem a informações internas desde a sua saída. Ele foi contratado no dia 5 de fevereiro como prestador de serviços terceirizado, após processo seletivo realizado pela empresa G4F. “Não há, portanto, qualquer vínculo direto com administração pública federal”, diz a nota.
O engenheiro eletricista estava em trabalho remoto por causa da pandemia e, segundo o ministério, deixou de responder contatos telefônicos e e-mails da unidade. Diante disso, a pasta solicitou a substituição do funcionário no dia 23 de abril e, conforme a nota, a rescisão contratual foi concluída nesta segunda-feira, 4. A informação de que Senna trabalhava no ministério foi revelada pelo portal UOL.
No fim da nota, o ministério repudia “qualquer ato de violência e agressão, principalmente contra profissionais de saúde em um momento que eles devem ser ainda mais respeitados e valorizados” e destaca as ações desenvolvidas para o “enfrentamento a todos os tipos de violência” e também às consequências sociais da pandemia do novo coronavírus.
Parceiro de Senna na organização da manifestação de domingo, o militar reformado Winston Lima também confirmou a atuação do amigo para mobilizar o ato e disse que ele esteve presente na manifestação.
No domingo, a equipe de profissionais do Estado também foi alvo de agressões físicas e verbais. O repórter fotográfico Dida Sampaio e o motorista Marcos Pereira foram agredidos fisicamente enquanto registravam a presença de Bolsonaro na rampa do Palácio do Planalto e tiveram de deixar o local escoltados pela Polícia Militar.
Questionado sobre o que achou das agressões contra a equipe do jornal, Winston Lima disse que não estava no local, e que não tinha como saber se, de fato, houve violência. Diversas imagens foram registradas por profissionais que estavam ao redor e mostram o momento em que Dida é empurrado e cai no chão. Antes disso, alguns manifestantes já haviam tapado a lente de sua câmera, para que não pudesse fotografar. Dida e Marcos deixaram o local às pressas, com uma turba de manifestantes gritando palavras ofensivas e dando chutes.
Winston Lima recorreu ao que disse o presidente Jair Bolsonaro. “Eu fiquei muito triste. Não sei quem fez isso. Pode ser um infiltrado, o cara chegar lá e partir para cima, para arrastar a massa. É o efeito manada, né. Não sei te dizer. Mas com certeza temos que repudiar qualquer tipo de agressão.”
Procurador da República envia notícia crime para apuração
O procurador da República João Paulo Lordelo, por delegação do procurador-geral da Repúbliaca, Augusto Aras, enviou uma notícia crime para a Procuradoria da República no Distrito Federal, pedindo apuração sobre o homem que agrediu profissionais de saúde na Praça dos Três Poderes. A PGR aponta como suspeito Renan da Silva Senna.
A apuração do caso é de competência do Ministério Público Federal no primeiro grau, porque é solicitada com base na Lei de Segurança Nacional. A agressão ocorrida pode levar à tipificação dos crimes previstos na Lei 7.170/1983, a Lei de Segurança Nacional,
O agressor pode responder por promover ações violentas ou ilegais para alteração da ordem política ou social, discriminação racial, de luta pela violência entre as classes sociais. A pena é de detenção, de 1 a 4 anos, conforme previsto no artigo 22 da lei.
Pode ainda pegar o mesmo tempo de prisão por promover subversão da ordem política ou social, animosidade entre as Forças Armadas ou entre estas e as classes sociais ou as instituições civis e luta com violência entre as classes sociais, como previsto no artigo 23. A pena é de reclusão de 1 a 4 anos.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.