SÃO PAULO – Com as atenções voltadas para São Paulo — importante bastião do PSDB no País —, tucanos apostam que uma eventual chegada de Rodrigo Garcia ao segundo turno contra o petista Fernando Haddad vai acirrar o debate interno em torno da disputa presidencial, o que será crucial para o futuro da legenda. A expectativa é que o candidato à reeleição cole em Jair Bolsonaro (PL) em busca do eleitor antipetista, enquanto os velhos caciques apoiem Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
A mais recente pesquisa Datafolha animou tucanos, que já esperam pelo crescimento de Garcia. O levantamento mostrou uma reação do tucano, que subiu e alcançou 19% das intenções de voto. Agora, o governador está tecnicamente empatado com Tarcísio de Freitas (Republicanos), ex-ministro e candidato de Bolsonaro, que tem 22%. Ex-prefeito de São Paulo, Haddad segue na liderança. Enquanto os números mudam, os três candidatos partem para ataques mútuos.
Com a expectativa de crescimento nas pesquisas, o chefe do Executivo paulista, já avaliam aliados, vai usar sua força política para evitar qualquer manifestação oficial do PSDB em defesa de Lula. “O futuro do PSDB vai depender do resultado da eleição em São Paulo. Se o Rodrigo for para o segundo turno, ele vai dar o tom do discurso nacional. Não teria a menor viabilidade de o partido apoiar Lula”, disse o prefeito de São Bernardo do Campo, Orlando Morando, que integra a Executiva tucana.
Sem candidato próprio à Presidência pela primeira vez desde sua fundação, o PSDB está na coligação da senadora Simone Tebet (MDB-MS), mas já se divide nos bastidores entre o apoio a Bolsonaro e Lula. No cenário dos estados, o PSDB apoia formalmente Bolsonaro no Mato Grosso do Sul e Lula no Rio de Janeiro. Em São Paulo, a legenda, por sua vez, venceu todas as eleições desde 1994.
O assunto ainda é tratado com cautela, mas em conversas reservadas líderes preveem uma reedição da divisão entre “cabeças brancas”, ala dos tucanos históricos e que devem apoiar o petista, e os “cabeças pretas”, corrente dos parlamentares mais jovens, conservadores e antipetistas. O radar da cúpula partidária captou um movimento de tucanos históricos rumo ao palanque do petista — nomes como Aloysio Nunes, Tasso Jereissati, José Serra, Fernando Henrique Cardoso, José Gregori e José Aníbal devem aderir à frente ampla de oposição liderada por Lula.
Após receber o apoio público de Nunes, ex-chanceler no governo Michel Temer (MDB), Lula já costura mais apoios tucanos e, para isso, conta a ajuda do ex-governador Geraldo Alckmin (PSB), ex-tucano. Há expectativa até de abertura de espaço em um eventual primeiro escalão petista no governo federal. Em um jantar para Alckmin na segunda-feira, 12, com integrantes da sociedade civil e do setor cultural, Gregori discursou e manifestou apoio a Lula.
O anúncio da adesão de Marina Silva (Rede-SP) a Lula, após anos de distanciamento e mágoas, reanimou petistas sobre a possibilidade de mais nomes engrossarem a lista de “frente ampla” anti-Bolsonaro. Um dos principais aliados de Lula afirma, sob a condição de reserva, que a candidatura de Simone empaca que anúncios sejam feitos antes do primeiro turno.
Com a saída da emedebista do páreo no segundo turno, avaliam os petistas, tucanos históricos se sentirão liberados para liderar o movimento a favor de Lula. A expectativa na campanha do PT, segundo o mesmo interlocutor, é que a própria senadora declare seu apoio.
A campanha do ex-presidente, no entanto, não jogou a toalha e continua buscando apoio de tucanos ainda na primeira fase da eleição. Especialmente nos dias que antecedem a votação, aliados de Lula avaliam que o movimento ajudaria a dar um impulso na busca pelo voto útil, que já começou.
A lista de nomes que saíram candidatos à Presidência em eleições passadas e que apoiam Lula — ou ao menos já anunciaram voto no petista — circula na campanha do ex-presidente como um trunfo: Marina, Haddad, Alckmin, Guilherme Boulos (PSOL), Cristovam Buarque (Cidadania) e Henrique Meirelles (União Brasil) — o último se disse “inclinado” a votar no petista no primeiro turno.
A resistência ao movimento, porém, não se limita a Garcia. “Se o PSDB fizer uma loucura dessas, de se juntar com o PT, eu saio na hora (do partido)”, disse em entrevista recente ao Estadão a senadora Mara Gabrilli (PSDB-SP), candidata a vice na chapa de Simone Tebet.
A previsão de mais uma nova guerra fratricida no PSDB levou cardeais a prever um futuro melancólico para a sigla que polarizou a política brasileira com o PT até 2014. Um dos fundadores do PSDB em Minas e aliado de Aécio Neves, o candidato ao governo local, Marcus Pestana, não descartou o fim do partido para que uma legenda “mais ampla e mais democrática” seja criada.
“Sou fundador do PSDB, mas não tenho paixão irreversível, eu fico preocupado com a aglutinação, com a social democracia. Precisamos de racionalização partidária”, disse Pestana em entrevista à rádio Super 91,7 FM. “O PSDB abriu mão do protagonismo, nós temos de pensar no quadro seguinte, em um projeto em 2026, que pode, inclusive, passar por um fim do PSDB com a criação de um partido mais amplo de centro democrático”, afirmou.
A declaração já causou desconforto no partido, apesar de a maioria dos candidatos tucanos pelo Brasil esconder a sigla PSDB nos comerciais de TV e materiais de campanha. Os petistas esperam que a ala pró-Lula pressione a cúpula partidária a fechar questão contra Bolsonaro e a favor do ex-presidente, mas admitem que a maioria da atual Executiva do PSDB é refratária à ideia.
Debate pelo governo de São Paulo
Bruno Araújo, atual presidente do PSDB, tem mandato até maio e depois disso pretende se afastar da vida partidária. A escolha do novo comando e o futuro do partido passarão, desse modo, por Garcia, se ele vencer a eleição em São Paulo. Caso contrário, a ala mais velha ganha força, assim como a tese de aproximação com um eventual governo petista. Depois de ver frustrada a tentativa de candidatura à Presidência, o ex-governador João Doria se retirou da vida política e, embora mantenha conversas pontuais com líderes políticos, ele não pretende influir na sucessão de Araújo.
Candidato a deputado federal em São Paulo, o ex-senador José Aníbal, que integra a ala histórica do partido, evita se posicionar neste momento sobre um eventual segundo turno entre Lula e Bolsonaro, mas defende que a legenda retome as raízes da social democracia. “A nova bancada vai ser mais sintonizada com a social democracia. O PSDB não pode ser um apêndice”, afirmou Aníbal.
Para a cientista política Vera Chaia, professora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), seja qual for o resultado das eleições, o PSDB está desaparecendo enquanto força política. “Não sei se esse grupo (pró-Lula) vai ter força, mas a tendência é o partido ir mais para a direita. As lideranças históricas estão sendo deixadas de lado”, disse.
Cobertura especial das eleições
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.