A Constituição de 1934 veta tribunais de exceção. Mas em 1935 surge a Lei de Segurança Nacional contra crimes militares e a favor do Estado. O Supremo Tribunal Federal decide que o Tribunal de Segurança Nacional é conforme à Carta de 34. Erro da Suprema Corte cujos frutos no século 20 foram amargos. A ditadura Vargas trouxe censura à imprensa, perseguições, exílios (os responsáveis pelo jornal O Estado de S. Paulo são vítimas e testemunhas), torturas. Tal regime seria menos feroz sem a lei em questão. No governo não democrático de 1967 é assumida, com acréscimos à lei, a Doutrina de Segurança Nacional como base do Estado brasileiro, o que se amplia em 1969.
O fato internacional relevante após 1964 era a disputa pela hegemonia planetária entre EUA e URSS. Mas a gênese da LSN é anterior à Guerra Fria. Ela teve impulso no reforço do poder estatal que se espalha pela Europa com os totalitarismos. No Brasil o texto alicerça o Estado Novo, forma de poder que põe no presidente da República as decisões relevantes para o País. A voga de um jurista na época, Carl Schmitt, atingiu intelectuais como Francisco Campos, o redator da Constituição de 1937, a Polaca. Como Schmitt o fizera em livros como o Guardião da Constituição, Campos entrega o poder decisório à Presidência da República.
Os frutos da LSN são venenosos quando se trata da liberdade cidadã. Nela, o Estado deixa de ser um acordo entre brasileiros e se torna o direito de o Executivo impor políticas, formas de pensar, alvos nacionais. Ideada para situações extremas, ela pode gerar o contrário do que promete: a perene insegurança dos poderes e do povo soberano. Se banalizada tendo em vista proibir críticas ao presidente da República, de remédio heroico ela se degrada à licença para o assassinato da República, vedando qualquer veleidade democrática no Brasil. Que o STF tome cautela e não erre novamente, que ela não ignore atentados contra a livre expressão do pensamento como as que assistimos no momento atual.
*PROFESSOR DE ÉTICA E FILOSOFIA DA UNICAMP
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