Diante de uma Suprema Corte extremamente polarizada, com cinco votos para cada lado, em relação ao início da execução da pena de um condenado, se a partir da segunda instância ou apenas após o trânsito em julgado, o ministro Dias Toffoli desperdiçou a grande janela de oportunidade de fazer História.
Refiro-me especificamente à chance de que seu voto decisivo pudesse dar continuidade ao alinhamento do sistema de Justiça com o anseio da maioria da população brasileira de combate à corrupção e à impunidade. Com o voto de minerva do presidente da Corte, foi vencedora por uma maioria mínima (6x5) a interpretação de que a execução da pena se dará apenas após o trânsito em julgado.
O Supremo que em 2016 havia chamado para si a responsabilidade de flexibilizar a regra do trânsito em julgado em favor da execução da pena após condenação em segundo grau agora prefere deixar com o Congresso essa responsabilidade de mudar a Constituição. Ficou claro na interpretação da maioria dos ministros que foi o Congresso brasileiro que escolheu em 1988 proporcionar amplas garantias na defesa do acusado. Agora competiria a esse mesmo Parlamento rever essa opção constitucional.
A divisão do placar de votação já sugere a legitimidade das duas interpretações. O problema é explicar isso para a maioria da população, que provavelmente verá a decisão tomada pelo STF como uma potencial capitulação ao combate à corrupção e à impunidade. Haverá uma grande reversão de expectativas, especialmente da percepção que se forjou nos últimos anos de que ninguém estaria acima da lei. A América Latina, em especial o Brasil, fez grandes avanços no fortalecimento das organizações de controle impondo limites a comportamentos desviantes e corruptos de elites políticas, burocráticas e empresariais.
Não será surpresa se essa frustração social se traduzir em mobilizações sociais semelhantes às que vêm ocorrendo em outros países vizinhos por também verem as suas expectativas de justiça e inclusão negligenciados pelas instituições. Mas com a iminente mudança na composição da Corte e da sua presidência, novas janelas de oportunidade poderão surgir e, quem sabe, ser aproveitadas.
* É PROFESSOR TITULAR DA FGV