BRASÍLIA - O Palácio do Planalto interferiu na disputa do Congresso e obteve importante vitória nesta segunda-feira, 1º, com a eleição do deputado Arthur Lira (Progressistas-AL) para a presidência da Câmara e Rodrigo Pacheco (DEM-RJ) ao comando do Senado. Lira conquistou 302 votos no primeiro turno, após uma disputa marcada por traições e denúncias de compra de votos. A escolha representa o triunfo do presidente Jair Bolsonaro, que venceu a queda de braço com o agora ex-presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Centrão. Réu em duas ações penais, Lira também é condenado por improbidade administrativa. O Supremo Tribunal Federal já firmou entendimento de que réus em ações penais não podem substituir o presidente e o vice interinamente.
Conhecido pela prática do “toma lá, dá cá”, o Centrão volta a ganhar protagonismo na cena política após cinco anos, desde que Eduardo Cunha (MDB-RJ) deixou a presidência da Câmara e foi para a prisão, em 2016. A eleição de Lira e Pacheco também significa um novo capítulo para o governo de Bolsonaro, que aposta em uma agenda mais conservadora do que liberal para conquistar novo mandato.
A nova configuração da cúpula do Congresso também muda a correlação de forças políticas para a disputa de 2022. Após quatro anos e sete meses à frente da Câmara, Maia sofreu uma derrota política ao não conseguir eleger Baleia Rossi (MDB-SP) como sucessor e ver o DEM, seu partido, se reaproximar de Bolsonaro. Baleia teve 145 votos.
“O plenário deve ser a voz de todos, e não a voz de um”, afirmou Lira, após a eleição. Seu primeiro ato, porém, foi anular uma decisão de Maia e dissolver o bloco de apoio a Baleia para a composição da Mesa Diretora da Câmara. Lira anunciou que um novo cálculo de proporcionalidade será feito hoje, o que pode excluir adversários da Mesa. Na noite desta segunda, partidos de oposição já falavam em “golpe”.
No Senado, Pacheco fez um discurso de pacificação e prometeu independência em relação ao Planalto. “Comprometo-me a ouvir todas as forças políticas”, afirmou o senador, que teve o apoio de Bolsonaro e de Davi Alcolumbre (DEM-AP), hoje ex-presidente do Senado.
O governo comemorou o resultado da disputa. Bolsonaro postou mensagem à noite nas redes sociais, informando sobre a eleição de Lira, junto com uma foto na qual ele aparece cumprimentando o deputado. Os dois estão sorridentes.
O desfecho da queda de braço no Congresso ameaça deixar cicatrizes no projeto de uma frente ampla de partidos, articulada por Maia e da qual o DEM fazia parte, para derrotar Bolsonaro. Agora o presidente quer ver a Câmara e o Senado com outra agenda: pautas armamentista e de costumes são prioridade. Bolsonaro está muito mais interessado nesses temas do que em privatizações e reforma administrativa. Lira e Pacheco também se comprometeram a barrar a criação de uma CPI para investigar falhas na condução da crise de covid-19.
A votação ocorreu em clima tenso na Câmara, com cabines apelidadas de “covidário”. Em seu discurso de despedida, Maia chorou. “A partir desta eleição, o passado ficou para trás e nós precisaremos, unidos – eu na planície, no plenário, com muito orgulho – com cada um de vocês, construir o futuro do Brasil. Não pelos próximos dois anos, mas para os próximos 20 anos”, disse Maia, tirando a máscara de proteção para enxugar as lágrimas.
Ao ocupar a tribuna da direita, antes de proclamado o resultado, Lira mandou recados a Maia, que estava a poucos metros de distância. “Por favor, olhem para a cadeira da presidência. Por acaso há aí um trono?”, provocou o candidato do Progressistas, insinuando que Maia se comportava como imperador. O trecho foi incluído de improviso no discurso. “A Câmara não pode continuar sendo a Câmara do ‘eu’. Tem de ser a Câmara do ‘nós’, insistiu ele.
Baleia, por sua vez, destacou reportagens do Estadão, mostrando que o governo interferiu na disputa do Congresso ao liberar, no fim de dezembro, R$ 3 bilhões em recursos “extras” do Ministério do Desenvolvimento Regional para 250 deputados e 35 senadores destinarem a obras em seus redutos. Presidente do MDB, Baleia disse que isso ocorria enquanto muitos estavam atrás de verbas para os municípios, “com o pires na mão”, e dinheiro para a saúde. “Que país é esse que não se sensibiliza com 220 mil mortes?”, perguntou Baleia, que ocupou a tribuna da esquerda.
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