Auditoria do TCU rejeita defender ‘interesses privados’ de juízes que resistem à volta do presencial

Magistrados tentam evitar jornada presencial obrigatória nas comarcas, como mostrou o ‘Estadão’; Associação de juízes do Trabalho de Acre e Rondônia pediu parecer à Corte de Contas

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Foto do author Davi Medeiros
Atualização:

Juízes do Trabalho recorreram ao Tribunal de Contas da União em busca de um parecer para tentar driblar a decisão do Conselho Nacional de Justiça, que determinou o retorno ao trabalho presencial. Segundo os magistrados, a determinação do CNJ provoca “patente dano ao erário” e atinge a “eficiência” do Judiciário, mas a área técnica da Corte negou o parecer solicitado, argumentando que não caberia ao TCU defender “interesses privados” de magistrados. Em documento do fim do ano passado, os auditores afirmam não ter identificado qualquer irregularidade nas despesas resultantes da volta às comarcas.

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Como mostrou o Estadão, juízes e servidores da Justiça apresentaram uma série de recursos no CNJ contra um acórdão do colegiado que impôs como data limite para o retorno ao trabalho presencial a próxima quinta-feira, 16. Na prática, eles precisariam voltar a comparecer pelo menos três vezes por semana nas devidas repartições, embora ainda seja mantida a possibilidade de realização de audiências virtuais e adoção do teletrabalho em casos nos quais as ferramentas digitais signifiquem a ampliação do acesso à Justiça.

O Estadão apurou que, para além de reclamar da medida ao próprio CNJ, juízes tentaram usar o TCU para suspender a decisão do CNJ. À Corte, a Associação dos Magistrados do Trabalho da 14ª Região (Amatra que contempla Rondônia e Acre) afirmou que o teletrabalho proporcionou ampliação do acesso à Justiça. Mencionou, por exemplo, uma economia de 20% em despesas de custeio da Justiça do Trabalho.

“A eficiência da Administração Pública somente pode ser atingida mediante a prestação de serviço público de qualidade à totalidade das pessoas que dela dependem. A prestação do serviço jurisdicional na modalidade digital, por meio dos atendimentos ou realização das audiências telepresenciais, tem como pilar a aplicação do princípio da eficiência”, afirmou a Amatra 14. A entidade ainda citou a facilidade de atendimento em regiões de difícil acesso.

Avanço indevido

O pedido ainda não foi julgado, mas recebeu um duro parecer da área técnica do Tribunal de Contas. “Não é função do TCU atuar na defesa de interesses privados dos magistrados do Tribunal Regional do Trabalho da 14ª Região junto à administração, sob pena de representar avanço indevido nas atribuições que são próprias do CNJ, do Poder Judiciário ou da unidade jurisdicionada”, diz o relatório. Segundo auditores, a representação sequer deve ser considerada por não preencher requisitos legais, já que a associação não se encontra entre os “legitimados a representar” à Corte.

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O presidente do TCU, Bruno Dantas; auditores da Corte de contas rejeitaram atender a "interesses privados" de juízes do trabalho.  Foto: Reuters

Mesmo rejeitando preliminarmente o pedido, a auditoria também se manifestou sobre seu mérito. E afirmou que se deve “considerar que há atividades que, por sua natureza, podem ser adotadas na modalidade de teletrabalho”. “Em outros casos, órgãos públicos exercem atividades que demandam atendimento presencial, situação em que não podem ser realizadas em trabalho remoto, sob pena de dificultar o acesso dos operadores do direito, das partes e de testemunhas, causando prejuízo à efetiva prestação jurisdicional”.

A área técnica da Corte argumenta ainda que não “há irregularidade no eventual aumento de despesas provocado pelo retorno ao trabalho presencial de magistrados, uma vez que a administração deve levar em conta também a qualidade de serviços a serem ofertados aos cidadãos, bem como se as atividades inerentes ao cargo de magistrado exigem a sua presença no local de trabalho para o bom andamento das atividades por eles desempenhadas”. E completa: “Além disso, a presença física dos magistrados da Justiça do Trabalho nas unidades judiciárias decorre de imposição constitucional e da legislação vigente, conforme já mencionado”.

Sem ‘direito adquirido’ e questionamento a servidores no exterior

Dentro do Tribunal de Contas da União, o presidente da Corte, Bruno Dantas limitou o teletrabalho e estão em andamento, no próprio TCU, processos que apuram infrações de servidores que se mudaram para o exterior sem a devida autorização.

A partir de uma proposta de Dantas, no ano passado, a Corte de Contas também fez um levantamento sobre “adoção indiscriminada do regime trabalho pelas entidades públicas”. Ao pedir a abertura do processo, o presidente do TCU ressaltou que o trabalho remoto “de maneira nenhuma pode ser considerado direito adquirido dos servidores de qualquer instituição”.

Durante o levantamento, em um universo de 200 mil servidores do governo federal, a fiscalização identificou que 76% estavam em regime presencial, 9,5% em teletrabalho parcial, 8,9% em teletrabalho total, e pelo menos 137 servidores estavam no exterior.

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O relator do processo na Corte, Jorge Oliveira, afirmou que “há um gritante quadro de desobediência das regras estabelecidas (...) no que se refere ao teletrabalho”. O ministro ainda criticou a falta de transparência na designação do trabalho remoto e cobrou punição a quem desrespeitar as regras. “Como se vê, de pouco valem as normas, se não há consequências para o descumprimento delas. É preciso cuidar disso”, disse.

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Nesta segunda-feira, 13, a Federação Nacional dos Trabalhadores do Judiciário Federal e Ministério Público da União (Fenajufe) divulgou nota reiterando críticas ao CNJ e pedindo aumento do prazo para o retorno às atividades presenciais. A entidade afirmou que vai recorrer ao colegiado para flexibilizar a decisão, considerada rígida. “. “O CNJ deu um prazo muito curto para o retorno ao trabalho presencial e restringiu de forma burocrática o número de servidores que poderiam manter o trabalho híbrido, em patamares piores do que antes da pandemia, afetando a autonomia dos Tribunais Regionais”, disse a federação.

Auditoria

Ao final do julgamento, os ministros decidiram notificar órgãos do governo federal e abrir uma auditoria sobre o teletrabalho no funcionalismo no primeiro semestre de 2023. No acórdão, os ministros fizeram recomendações para que os órgãos da União não admitam considerar a atividade em trabalho remoto como eventuais “considerem, como premissa de trabalho, que o teletrabalho é uma ferramenta de gestão e deve estar conectada com as peculiaridades da atuação de cada instituição, bem como com os resultados almejados e o interesse público a ser efetivamente alcançado, não constituindo, portanto, direito adquirido dos servidores públicos”. O julgamento foi realizado em novembro do ano passado.

Procurada, a Amatra-14 afirmou que as audiências via internet trazem imensas vantagens para os jurisdicionados” em Estados como Acre e Rondônia. “Com o devido respeito aos que pensam de forma contrária, o que importa ao jurisdicionado é ter acesso ao Poder Judiciário e receber a prestação jurisdicional dentro do menor tempo possível, e é isso que tem acontecido no TRT 14, com economia considerável de recursos, conforme apontado na petição ao TCU e sem perda da qualidade. A propósito, no próprio site do CNJ, Justiça em Números, constata-se que o teletrabalho garantiu uma economia na ordem de 50 bilhões, considerando a soma de todos os tribunais do país”, disse a entidade.

Em nota nesta terça-feira, 14, a Amatra da 2ª Região ponderou que a quantidade de juízes alvos de procedimentos por ausência nas comarcas é baixa em comparação ao número total de magistrados no País. A entidade também argumentou que o teletrabalho incrementou a produtividade do Judiciário. “Destaca-se o fenômeno da modernização das ferramentas processuais, tornando o Poder Judiciário acessível aos jurisdicionados e advogados de qualquer lugar, por meio do processo eletrônico, do alvará eletrônico, do balcão virtual e das audiências telepresenciais”, diz a nota.

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