BRASÍLIA - O anúncio do presidente Jair Bolsonaro em uma "live", na noite de quinta-feira, 14, de que haveria mudança no protocolo do governo em relação à cloroquina foi a gota d’água para a saída de Nelson Teich do Ministério da Saúde. Os dois conversaram na quinta-feira, 14, e não houve acordo sobre o tema. Mais tarde, na "live", Bolsonaro insistiu no tema, o que desagradou muito ao ministro. O médico oncologista confidenciou a amigos que naquele momento já havia chegado ao seu limite e que tinha um nome a zelar.
Quando, na manhã desta sexta-feira, o presidente disse que a pasta passaria, a partir de hoje, recomendar o uso do medicamento logo no início do tratamento de pacientes da covid-19, o desfecho já estava desenhado. A conversa que os dois tiveram no Palácio do Planalto durou cerca de 15 minutos. Foi o tempo de Teich pedir demissão e, em seguida, ser informado que o general Eduardo Pazzuelo, número dois da Saúde, assumiria apenas de forma interina, enquanto Bolsonaro procura um sucessor para o cargo, que terá de "falar a sua língua".
Desde o fim de semana, o agora ex-ministro dava sinais aos seus interlocutores mais próximos de que as dificuldades enfrentadas no Ministério da Saúde aumentavam dia a dia e que sua saída estava próxima. Na terça-feira, a temperatura subiu quando o presidente incluiu academias e salões de beleza ente atividades essenciais, liberando-as da quarentena. Mas o "caldo entornou" mesmo com a "live" de quinta à noite, quando anunciou a mudança de protocolo sobre a cloroquina.
Teich chegou a consultar pesquisadores nos últimos dias sobre os estudos envolvendo a droga. Foi aconselhado a não acatar a ideia. Com base nisso, o então ministro decidiu publicar um Twitter alertando para os efeitos colaterais do medicamentos e que sua prescrição só deveria ocorrer em comum acordo entre médico e paciente. A postagem, obviamente, não agradou a Bolsonaro.
Embora haja no governo quem torça para Pazuello ficar no cargo, o militar não é unanimidade. Auxiliares do presidente entendem que não seria bom, em um momento de pandemia, nomear alguém com perfil técnico para o cargo. Por isso, há conversas sobre nomes de médicos militares e de políticos.
Os que defendem o segundo grupo argumentam que alguém com bom trânsito no meio político poderia ajudar a angariar apoio ao governo no Congresso. Mesmo que seja alguém a algum partido, segundo estes auxiliares, não haveria problemas sobre "loteamento", pois a pasta já estaria "blindada" por militares, que passaram a ocupas postos estratégicos desde a semana passada, como revelou o Estadão.
Logo após o anúncio da demissão, a médica Nise Yamagushi esteve no Palácio do Planalto. Ela participou de uma cerimônia que teve a presença de Bolsonaro. Interlocutores do presidente, porém, negam que a presença da imunologista - que é defensora da cloroquina - tenha a ver com a sucessão de Teich.
No entanto, nenhum nome foi descartado. Dra. Nise, como é chamada, tem o apoio das redes bolsonaristas. Outro citado é o almirante Luiz Froes, diretor de Saúde da Marinha.
O nome do ex-ministro da Cidadania e deputado federal Osmar Terra (MDB-RS), que sempre se apresenta como candidato ao cargo, foi lembrado por um auxiliar como alguém que "fala a mesma língua" do presidente.
Na avaliação de um interlocutor do presidente, a nova crise envolvendo a saúde deve passar tão logo Bolsonaro encontre um nome para o cargo.
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