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7 de dezembro: aniversário do Código Penal Brasileiro

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Por Adib Abdouni
Adib Abdouni. FOTO: DIVULGAÇÃO  Foto: Estadão

O Código Penal Brasileiro completa este mês oito décadas de aplicação, cuja longeva vigência é criticada por significativa parcela da sociedade, ante o sentimento de impunidade que decorre do recrudescimento da atividade criminosa no país, sem que haja uma aparente força estatal, de caráter punitivo e de dissuasão do cometimento de delitos, com base na legislação penal, apta a refreá-lo.

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Instituído no ordenamento jurídico por meio do Decreto-Lei 2848/40, o Código Penal entrou em vigor em primeiro de janeiro de 1942, sob a perspectiva de atualizar aquele de 1890, a fim de contemplar novas figuras delituosas nascidas com os progressos industriais e técnicos daquela época, que contava com uma população de pouco mais de quarenta e dois milhões de habitantes.

Qualificado como arcaico nos dias de hoje, naquele momento histórico o projeto legislativo era coincidente com a maioria das codificações penais modernas, dissociadas de políticas extremadas em matéria penal, de modo a inclinar-se para uma política de conciliação ou de transação.

Isso sem distanciar-se da compreensão de que a responsabilidade penal continuava a ter por fundamento a responsabilidade moral, que pressupõe no autor do crime, contemporaneamente à ação ou omissão, a capacidade de entendimento e a liberdade de vontade no cometimento do crime.

Passados pouco mais de vinte anos de sua vigência, surgiram novas tentativas de elaboração de um novo Código Penal, notabilizado pelo anteprojeto do professor Nelson Hungria, que, a princípio, entraria em vigor em janeiro de 1970, mas que restou protelado, sob a conveniência de ingressar simultaneamente em vigor com o novo Código de Processo Penal e a Lei de Execução Penal, cujos anteprojetos encontravam-se em elaboração, como pressuposto de eficácia da Justiça Criminal, o que, por razões de ordem político-jurídico de então, não se concretizou.

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Porém, a pressão pela reforma do sistema penal brasileiro e pela modernização de suas leis constitutivas, possibilitou que em 1984, fosse editada a Lei 7209/84, dedicada, ao menos, a alterar a Parte Geral do Código Penal.

A precedência dada à reforma da Parte Geral do Código antecipou a adoção de uma nova política criminal e possibilitou a implementação das reformas do sistema sem suscitar questões de ordem prática, a exemplo da aplicação da lei penal, da definição de crime, da imputabilidade penal, dos efeitos da condenação, da reabilitação, da extinção da punibilidade, entre outros temas gerais.

Em constante evolução, seguiram-se, na década de noventa e nos anos dois mil, alterações pontuais do sistema penal brasileiro, com a finalidade de atualizar suas leis constitutivas, que, no interesse de segurança dos cidadãos e da estabilidade dos direitos, então se intentavam.

Exemplo disso é a Lei de Crimes Hediondos (Lei 8.072/1990), que definiu um rol de crimes graves que passaram a ter punição específica mais rígida (como o sequestro e o estupro), definindo-os - além da prática da tortura, do tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e o terrorismo - como insuscetíveis de fiança, anistia, graça e indulto, devendo a condenação ser cumprida integralmente em regime fechado.

De igual modo, pode-se citar a Lei 12.015/2009 que pune os crimes sexuais, extinguindo o crime de atentado violento ao pudor e equipará-lo ao crime de estupro, assim como a Lei 11.340/06 (Lei Maria da Penha) que representou um avanço significativo para a efetiva implementação de mecanismos de combate da violência doméstica e familiar contra a mulher, cujos efeitos didáticos e preventivos restaram aperfeiçoados pela política criminal do Estado ao alterar, em 2015, o artigo 121 do Código Penal, com o fito de prever o feminicídio como circunstância qualificadora do crime de homicídio, na hipótese em que o delito é cometido contra a mulher por razões de sê-la do sexo feminino, com menosprezo ou discriminação à sua condição feminina.

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Mais recentemente, a Lei 13.964/19 (Lei anti-crime), trouxe importante capacidade de inibir a ocorrência dos crimes cometidos contra a Administração Pública decorrente dos delitos de corrupção ativa, passiva e peculato, face ao endurecimento do cumprimento da pena desses crimes, com fixação do regime inicial fechado, a impedir que o condenado seja rapidamente posto em liberdade ou inicie sua permanência no cárcere em regime mais brando.

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Porém, apesar desses inegáveis aperfeiçoamentos, o fato insofismável é que legislação criminal - observado seu núcleo principal datado de 1940 -, permanece incapaz de conferir resposta penal suficiente e eficaz às exigências da sociedade brasileira, a exigir o esforço contínuo do legislador na compatibilização das reprimendas penais à contemporaneidade de nossas vidas em sociedade.

De fato, a pressão dos índices de criminalidade e suas novas espécies, a constância da medida repressiva como resposta básica ao delito, a rejeição social dos apenados e seus reflexos no incremento da reincidência, a sofisticação tecnológica, que altera a fisionomia da criminalidade contemporânea, são fatores que exigem o aprimoramento dos instrumentos jurídicos de contenção do crime.

Noutras palavras, o avanço científico e tecnológico impõe a inserção, na esfera punitiva, de condutas lesivas ao interesse social, como versões novas da atividade econômica e financeira ou de atividades predatórias da natureza.

Importante marco na reformulação do nosso Direito Penal, além de caminho seguro para a modernização da nossa Justiça Criminal, é o Projeto de Lei do Senado n° 236, de 2012, cuja tramitação, infelizmente, se arrasta há anos no Congresso Nacional, a tonar algumas de suas propostas iniciais até mesmo defasadas.

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Enfim, a reformulação do Código Penal é uma necessidade incontornável, para que melhor reflita a evolução da sociedade brasileira, indubitavelmente democrática, ante a realidade dos novos costumes, comportamentos das pessoas e das diferenças da legislação penal implementadas desde 1940 que não representam mais os valores sociais que experimentaram significativas transformações e que não toleram práticas discriminatórias em relação ao gênero, etnias ou religiosas, de sorte que um novo texto normativo possa apresentar-se como um efetivo e atual instrumento de combate à criminalidade e melhora da segurança pública.

*Adib Abdouni, advogado criminalista

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