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Opinião | A advocacia e a magistratura

O saudado Ministro José de Jesus Filho ressaltou que nenhuma formação é completa sem a ética. Um magistrado ético inspira confiança e respeito, enquanto um advogado ético fortalece o papel da justiça e promove um diálogo construtivo com o Judiciário

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convidado
Por Romero Ferraz Filho

A magistratura e a advocacia, embora exerçam funções distintas no sistema de justiça, estão intrinsecamente conectadas por uma missão comum: garantir o equilíbrio social e a proteção dos direitos fundamentais. A leitura do texto “A Profissão de Magistrado”, do saudoso Ministro aposentado José de Jesus Filho, do Superior Tribunal de Justiça, que reflete sobre a formação e os desafios da magistratura, mesmo após décadas, oferece importantes insights para ambos os campos (magistratura e advocacia) especialmente no que diz respeito à colaboração necessária para uma justiça efetiva.

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Se o magistrado é descrito como “a viva voz do Direito” em uma sociedade marcada por desigualdades e tensões, onde ecoa com intensidade crescente o clamor público movido por emoções intensas, o advogado é aquele que, com dedicação, leva ao juiz os conflitos, interpreta a norma em favor de seu constituinte e busca assegurar que a justiça seja alcançada, com o difícil desafio de equilibrar as expectativas sociais com os princípios fundamentais do devido processo legal e da imparcialidade. É impossível pensar em uma magistratura eficiente sem uma advocacia atuante, ética e bem-preparada.

No dia a dia do sistema judicial, o advogado não é apenas um defensor de causas individuais, mas um aliado do magistrado na construção de decisões justas. Cabe ao advogado apresentar argumentos sólidos, contribuir para o esclarecimento dos fatos e, em muitos casos, participar ativamente na busca pela pacificação social, seja por meio da mediação, da conciliação ou do litígio, a permitir decisões que vão além da letra fria da lei.

O texto destaca que o magistrado, além de dominar o Direito, precisa transitar por áreas como filosofia, sociologia e psicologia. Esses conhecimentos permitem que ele interprete a norma de forma sensível e contextualizada, considerando as necessidades e complexidades da sociedade contemporânea, resistindo à influência das vozes externas que, muitas vezes, exigem soluções que podem contrariar os direitos fundamentais do acusado. Esse preparo é fundamental para que o juiz compreenda as múltiplas dimensões dos casos que lhe são apresentados e possa decidir com justiça e equidade. Como disse, recentemente, o Ministro Benedito Gonçalves do Superior Tribunal de Justiça, “um bom juiz deve ter sensibilidade social”.

Para o advogado, compreender essa ampla formação do magistrado é essencial ao desempenho de seu papel enquanto defensor da garantia de direitos do acusado, o que muitas vezes significa atuar contra as várias opiniões públicas desfavoráveis. Ao abordar temas jurídicos perante um juiz, a argumentação deve levar em conta não apenas aspectos técnicos, mas também os impactos sociais e humanos das decisões judiciais, a fim de permitir ao juiz que permaneça fiel à sua função de garantir um julgamento justo, mesmo em meio ao clamor popular. A sinergia entre advocacia e magistratura depende, em grande medida, dessa compreensão mútua.

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O saudado Ministro José de Jesus Filho ressaltou, ainda, que nenhuma formação é completa sem a ética. Esse princípio é especialmente relevante para a relação entre advogados e magistrados. Um magistrado ético inspira confiança e respeito, enquanto um advogado ético fortalece o papel da justiça e promove um diálogo construtivo com o Judiciário.

A interação entre ambos deve ser marcada pelo respeito recíproco, pela busca conjunta pela verdade e pelo compromisso com o Estado Democrático de Direito. Qualquer comportamento que comprometa esses valores afeta não apenas o caso concreto, mas a percepção pública da justiça como um todo.
Outro ponto destacado no texto é a necessidade de o magistrado ser um observador atento da realidade social. Ele deve conhecer os dramas e as desigualdades que permeiam os casos que julga. Nesse aspecto, o advogado desempenha um papel crucial ao trazer ao magistrado os anseios e desafios enfrentados pelas partes, sempre garantindo que a justiça seja feita de maneira equilibrada e responsável, sem ceder às paixões do clamor público.

Enquanto o magistrado interpreta a lei à luz da realidade, o advogado tem o dever de dar voz a quem busca a justiça. Essa interação fortalece o sistema jurídico e contribui para decisões que não apenas resolvem conflitos, mas também promovem a paz social.

Na sua percepção, a magistratura é uma vocação que exige dedicação, sensibilidade e preparo técnico. Mas seu pleno funcionamento depende de uma advocacia igualmente comprometida, que reconheça o papel do juiz como guardião da justiça e colabore para a construção de um sistema jurídico mais humano e eficiente.

Portanto, tanto magistrados quanto advogados compartilham uma mesma responsabilidade: ser instrumentos de justiça em uma sociedade que clama por equilíbrio e inclusão. A formação, a ética e a cooperação entre essas duas profissões são os alicerces de um Judiciário que inspire confiança e esperança para todos, reafirmando a força e a legitimidade do Estado de Direito.

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Foto do autor Romero Ferraz Filho
Romero Ferraz Filhosaiba mais

Romero Ferraz Filho
Advogado criminalista, bacharel em Direito pela Universidade Salgado de Oliveira (UNIVERSO, Goiânia), especialista em Ciências Criminais pela Rede LFG de Ensino e pós-graduado Lato Sensu em Delação Premiada FGV Direito SP. Foto: Arquivo pessoal
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