Uma proposta de plebiscito, a ser realizado durante as eleições de 2026, sobre o retorno do regime de monarquia parlamentarista no Brasil, foi apresentada como Ideia Legislativa no portal e-Cidadania do Senado Federal. Ao alcançar mais de 20 mil apoios, a ideia foi transformada na Sugestão SUG 9/2024 e enviada à Comissão de Direitos Humanos do Senado para análise.
Propostas desse gênero não são novidade no Congresso. Os proponentes provavelmente imaginam a possibilidade de rediscutir a introdução de uma monarquia parlamentarista no país, executando uma verdadeira operação de revisão do plebiscito de 1993, cuja convocação foi realizada pelo próprio poder constituinte originário em razão de um impasse entre as forças da constituinte.
Assim, o art. 2º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), da Constituição de 1988, determinava a celebração de um plebiscito no dia 7 de setembro de 1993 para que o eleitorado escolhesse a forma e o sistema de governo. Impende notar, contudo, que a Emenda Constitucional nº 2, promulgada em 25 de agosto de 1992, antecipou o plebiscito para o dia 21 de abril de 1993.
Na referida consulta popular, a opção pela Monarquia obteve 6.790.751 votos (10,13%), enquanto a República recebeu a esmagadora maioria, com 43.881.747 votos (65,48%). Na segunda questão apresentada, 36.685.630 eleitores (54,75%) escolheram o presidencialismo, enquanto 16.415.586 (24,50%) apoiaram o parlamentarismo. Se nesse primeiro momento histórico aceitou-se como constitucional a discussão popular sobre a adoção de um regime monárquico, hoje tal cenário desapareceu por completo.
Não negamos a legitimidade e a constitucionalidade de um plebiscito para debater e decidir quanto à alteração do sistema ou regime de governo, isto é, se o país será presidencialista ou parlamentarista. O principal problema da proposta está em considerar possível, mediante mudança constitucional, ainda que autorizada por plebiscito, o retorno da Monarquia.
Na Sugestão legislativa apresentada, argumenta-se que “em países como Espanha, Inglaterra e Dinamarca, o parlamentarismo monárquico tem se mostrado efetivo; os índices de corrupção são baixos e os investimentos públicos são altos, porque o partido eleito pelo povo tem mais autonomia para governar em um sistema parlamentarista. No caso, trocaríamos o atual sistema de governo, elegeríamos um partido e o primeiro-ministro, e o imperador seria a unidade.”
Ao analisar essa fundamentação, convém focar na questão constitucional de fundo e deixar de lado a pobreza dos argumentos políticos trazidos. Com a monarquia, passaríamos a ter um imperador. Para fazer jus a um regime monárquico, esse imperador seria irresponsável e somente substituído por via hereditária. Não poderia ser um chefe de Estado pela graça do povo.
O direito de voto, a responsabilidade política, o princípio republicano e a democracia são cláusulas pétreas. A monarquia viola todos esses preceitos fundamentais. Pouco adianta citar países desenvolvidos e monárquicos como se fossem bons exemplos. Ninguém precisa baixar a cabeça para os exemplos do Norte. Mesmo nesses países, há muito tempo vozes importantes da sociedade e movimentos sociais questionam a legitimidade democrática dos chefes de Estado hereditários.
Portanto, o legislador ordinário não está autorizado a convocar um plebiscito sobre esse tema, e nenhuma alteração constitucional pode ser concretizada nesse sentido. O retorno do imperador seria o enterro da democracia; se isso ocorrer, poderemos gritar: A Constituição está morta, viva o Rei!
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