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Opinião | A decisão do STF e os limites à solicitação de relatórios de inteligência ao Coaf

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Por Ana Carolina Piovesana e Ilana Martins Luz
Atualização:

No último dia 2 de abril, a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que o Ministério Público (MP) e Autoridades Policiais podem solicitar Relatórios de Inteligência Financeira (RIFs) ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF), sem autorização judicial.

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O precedente foi firmado no julgamento de uma reclamação ajuizada MP do Pará contra decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que considerou ilícita a requisição de RIFs sem ordem do Poder Judiciário.

Os RIFs são documentos elaborados pelo COAF a partir de informações de operações atípicas enviadas por instituições financeiras e outros setores obrigados por lei a colaborar com a política de prevenção à lavagem de dinheiro. Podem ser de duas espécies: (a) ofício ou espontâneos, difundidos às autoridades de investigação por iniciativa do próprio COAF; (b) intercâmbio, não previstos em lei, solicitados ao COAF pelo MP e polícia, quando há investigação instaurada.

Em 2021, o Plenário do STF autorizou o COAF a compartilhar RIFs de forma espontânea, sem prévia autorização da Justiça. A grande discussão atualmente era sobre a possibilidade, ou não, de que tais relatórios fossem solicitados diretamente pelos órgãos de persecução penal.

A 1ª Turma do STF declarou que o compartilhamento de RIFs de intercâmbio sem ordem judicial também seria possível. Os Ministros ressaltaram, contudo, que a solicitação de relatórios ao COAF, embora legítima, não poderia ser generalizada, demandando o preenchimento de requisitos, como a existência de investigação formal, a necessidade de transmissão dos pedidos por canais oficiais e a indicação da causa e dos motivos que embasam o requerimento.

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A posição firmada no último julgamento, por se tratar de decisão de uma das Turmas, e não do Plenário do STF, não encerra as discussões. A decisão também não aprofunda em questões essenciais que mereciam regulamentação expressa pela lei.

O primeiro ponto que merece reflexão é a legitimidade para solicitar tais RIFs. Hoje, qualquer autoridade da Polícia Civil ou Federal ou representante do MP pode, indiscriminadamente, requerer tais dados. A multiplicidade de agentes é disfuncional e gera distorções em matéria de competência, transparência e controle do fluxo de informações.

O próprio COAF afirmou que, em 2023, foram elaborados 16 mil RIFs espontâneos e 22 mil de intercâmbio, o que aponta para a necessidade de controle mais detalhado nesta última hipótese, notadamente porque um único RIF pode conter dados de dezenas de pessoas.

Os RIFs contemplam informações sensíveis dos cidadãos, de forma que o melhor seria que o tema fosse tratado em lei específica, com a previsão de controle administrativo para filtrar pedidos que apresentem requisitos suficientes para o intercâmbio de informações.

Outro ponto relevante se refere aos fundamentos utilizados para as solicitações. São frequentes inquéritos em que os RIFs são a primeira diligência requerida após a portaria de instauração, sem que haja qualquer ato prévio apontando indícios de lavagem de dinheiro.

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Não é admissível banalizar tais solicitações. Como bem ressaltou o Ministro Alexandre de Morais, “não se pode dizer: UIF, investigue alguém a partir de tais dados. Não. Mas: UIF, o que você tem em relação a isso?”. É preciso que as autoridades apontem quem está sendo investigado, bem como os elementos que já existem sobre a possível ocorrência de um crime. Nas palavras da Ministra Cármen Lúcia, “é preciso saber para que se entrega, a quem se entrega, por que se entrega”.

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É necessário, ainda, delimitar o lapso temporal e os sujeitos que serão mencionados nos RIFs. Não raras vezes, são enviadas pelo COAF todas as operações tidas como suspeitas de uma determinada pessoa física/jurídica por longos períodos, além de operações realizadas com sujeitos que relação alguma possuem com a investigação, mas que são atraídos sem justificativa para o seu centro.

Para além, é fundamental que todas as comunicações entre a Polícia, o Ministério Público e o COAF sejam documentadas nas investigações e franqueadas à defesa, possibilitando questionamentos se verificada qualquer ilegalidade.

Por fim, é necessário um controle da utilização posterior dos RIFs, que não são prova criminal e não podem embasar medidas cautelares, de modo que são ilegítimas investigações que seguem um mesmo roteiro: portaria de instauração, requerimento de RIFs e pedido de quebra de sigilo ou até mesmo medidas de busca e apreensão.

A fixação de balizas é essencial para evitar devassas indiscriminadas dos dados sigilosos dos cidadãos, afastando a realização de investigações secretas e pescaria probatória. Impor limites às solicitações ao COAF é medida urgente, que traz benefícios para a legitimidade das investigações criminais e, por consequência, para a sociedade.

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Ana Carolina Piovesana
Advogada criminal, especialista em Direito Penal Econômico pela FGV, sócia do Oliveira Lima & Dall’Acqua Advogados
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