Ao se aproximar o final do mandato do atual procurador-geral da República (PGR), questiona-se a necessidade da escolha do perfil adequado de um membro da carreira do Ministério Público Federal (MPF) na sucessão, sob a ótica de um Ministério Público (MP) imparcial, independente e equilibrado.
Embora não haja previsão constitucional da obrigatoriedade relacionada à escolha do procurador-geral entre um dos membros da lista tríplice, a tradição de sua observância foi inaugurada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2003, em harmonia com os princípios democráticos, republicanos, e da independência da instituição.
Caso um de seus integrantes seja o escolhido, espera-se que, na condição de PGR, conduza o MP, sob a visão de uma instituição equilibrada e independente, ou seja, livre de eventuais pressões externas ou políticas, por intermédio da atuação do Órgão de forma proativa na defesa do interesse público, mas com respeito aos princípios do devido processo legal.
Em relação aos respectivos candidatos, os membros da lista, em entrevista concedida à imprensa no mês de junho deste ano, manifestaram o intuito de conduzirem a PGR com equilíbrio nos requerimentos de medidas cautelares penais.
De outro lado, a manutenção da escolha do PGR entre os membros da carreira do MPF proporcionará benefícios à sociedade, considerando a histórica estruturação do Órgão na defesa do regime democrático, propositura de ações diretas de inconstitucionalidade, incidentes de deslocamento de competência para a Justiça Federal nas hipóteses de graves violações de direitos humanos, supervisão da legalidade nas eleições presidenciais (função da Procuradoria-Geral Eleitoral-PGE), sendo a persecução criminal apenas uma das suas atribuições.
No processo penal, embora exerça a função de titular da ação penal pública com a missão de requerer a condenação dos responsáveis pela perpetração de condutas criminosas, o MP pode postular a absolvição do acusado sempre que não houver elementos suficientes para a condenação ou quando as provas dos autos convergirem para a sua inocência, sendo bastante comuns os pedidos de absolvição feitos pelo próprio Órgão. Agindo desta forma, o Ministério Público protegerá os interesses legítimos da sociedade relativamente ao devido processo legal substancialmente justo. Diante dessa condição especial, a doutrina costuma classificar o Ministério Público como uma “parte imparcial”.
Em relação à atuação em matéria de saúde, o MP é detentor, entre outros, da relevante missão de pleitear o fornecimento de medicamentos registrados na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), mas ainda não disponibilizados no Sistema Único de Saúde (SUS).
Na esfera ambiental, incumbe ao Ministério Público a árdua missão de zelar pela manutenção do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e sustentável em favor de sua preservação para a geração atual e futura.
Por derradeiro, não se pode olvidar que o MP possui a relevante missão de tutelar direitos fundamentais, sobretudo quando incidir graves violações a direitos humanos.
Nesse sentido, após a recente notícia da famigerada tragédia do assassinato da líder quilombola Bernadete, a atuação do MPF teve início não apenas mediante requisição de inquérito à Polícia Federal, mas também por intermédio da atuação da Procuradoria Regional dos Direitos dos Cidadãos na Bahia (PRDC) no acompanhamento da regularidade das titulações e sugestão para criação de força de segurança especial para monitoramento de áreas sob conflito com povos e comunidades tradicionais, o que demonstra a relevante missão do Órgão na defesa dos direitos humanos (https://www.mpf.mp.br/ba/sala-de-imprensa/noticias-ba/caso-mae-bernadete-mpf-e-dpu-requerem adocao-de-medidas-urgentes-na-protecao-aos-territorios-quilombolas-na-bahia-a-governos-federal-e-estadual).
Por derradeiro, vale registrar que todos os membros da lista possuem histórico funcional e acadêmico voltados à defesa dos direitos fundamentais, levando à conclusão de que haverá condução da PGR sob o enfoque de tais temáticas, entre outras (https://midia.mpf.mp.br/biografiasub/biografias/luizafrischeisen.htm;https://www.anpr.org.br/images/2023/06/CURRICULO_2023_1.pdf; https://www.anpr.org.br/images/2023/06/Curriculo_Mario_Bonsaglia_-_atual.pdf ).
Assim, espera-se que o presidente da República escolha o próximo PGR entre um dos membros da carreira do MPF preferencialmente integrante da lista tríplice, à luz de uma instituição equilibrada, imparcial e independente.
*Leandro Bastos Nunes é procurador da República, articulista, professor de cursos do MPU (Ministério Público da União), especialista em Direito Penal e Processo Penal, além de autor e coautor de obras jurídicas
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