Compreender os questionamentos de certas pessoas bem-intencionadas, que evitam participar da política ou que o fazem apenas de maneira pontual, é um desafio.
De fora, é fácil analisar friamente e apontar os motivos. No entanto, ao se depararem com as situações caóticas criadas pelos famosos políticos “flexíveis”, são esses que deturpam a realidade, inventam saídas fáceis e negociam acertos oriundos de benesses espúrias.
O bom político discursa de forma voraz, mas, ao assumir um cargo, se não colocar pessoas com a mesma sintonia, seu fracasso será ainda maior do que se um mau político estivesse no poder, pois suas expectativas frustradas serão mais evidentes.
Geralmente, os políticos flexíveis apresentam soluções ilusórias, baseadas em um mundo imaginário, apenas para encorajar o bom político a tomar uma decisão, sem que ele perceba o que há por trás da situação e sem conhecer a real intenção do político flexível.
A tão conhecida frase que afirma que “a melhor pessoa é aquela que se adapta” expressa, na verdade, um conceito de moral líquida ou ética à la carte. Na política, 100% das pessoas que pensam dessa forma possuem ideias equivocadas quanto à probidade.
Esses fatores estão ligados a conceitos weberianos de patrimonialismo ou, conforme o pensamento de Sérgio Buarque de Holanda, à cultura personalista. Um alinhamento entre esses dois pontos torna-se prático tanto na vontade patrimonialista quanto na cultura personalista.
A realidade brasileira é de difícil leitura, marcada por dicotomias entre dois extremos: o “jeitinho” e a corrupção. O político flexível é adepto ao jeitinho, que nada mais é do que uma forma de manipulação para, ao fim, recorrer ao outro extremo, que é a corrupção.
Por outro lado, percebemos que o bom político traz nuances da iniciativa privada para a gestão pública, buscando mesclar as experiências para obter sucesso na atividade-fim. Dessa forma, ao impor uma equipe equilibrada, pode-se chegar a um resultado mais próximo do bem-estar da população.
Como demonstrado, a corrupção dos políticos flexíveis é, além de inevitável, imprescindível para que ocorra uma transformação política. Sua presença é um dos principais fatores de degenerescência das entidades públicas, forçando o bom político a “acordar” e retomar o poder das mãos daqueles que pretendem utilizá-lo em proveito próprio.
Desde o surgimento das características políticas, encontramos exemplos a serem seguidos ou rejeitados. Assim, ao analisarmos o pensamento de Aristóteles, podemos compreender os malefícios de um político flexível.
Aristóteles deu continuidade aos ensinamentos de Platão, fazendo análises ulteriores às obras de seu mestre. Em A Política, mostra poucos pontos de semelhança entre os dois, quais sejam: os seis tipos de Governo em sua circularidade. A principal diferença segundo Aristóteles, é que um regime nunca se limita ao modelo governamental, puro e simplesmente. Para o filósofo uma monarquia nunca é apenas uma monarquia, por exemplo, pois o poder político é composto de vários membros, nunca estando restrito a uma só pessoa. Além de afirmar ser uma tarefa difícil taxar como ruim ou boa alguma ação política. Em suma, para Aristóteles o mundo político é muito mais complexo e intrincado, sendo necessárias observações mais aprofundadas para termos qualquer conclusão sobre os regimes (ARISTÓTELES, 1987, p. 77 et seq).
Em sentido similar, Maquiavel[1] (2000, p. 24) assevera que há três formas de governo que podem levar uma sociedade à perfeição: monárquico, aristocrático e popular. Sendo necessário que aqueles indivíduos que almejem estabelecer uma ordem social, escolham dentre esses três tipos, aquele que melhor convier com os objetivos.
Outros, [...] acham que há seis formas de governo, das quais três são essencialmente más; as três outras são em si boas, mas degeneram tão facilmente que podem também tornar-se perniciosas. Os bons governos são os que relacionei anteriormente; os maus, suas derivações. E se parecem tanto aos primeiros, aos quais correspondem, que podem com facilidade ser confundidos com eles[2].
Deste modo, para Maquiavel, monarquia se transforma em despotismo; aristocracia em oligarquia; e democracia em permissividade, sendo a corrupção igualmente inevitável. Segundo ele, todo legislador que adota para o Estado que vai fundar uma destas três formas boas de governo, não consegue mantê-la por muito tempo. “Não há o que a possa impedir de precipitar-se no tipo contrário, tal a semelhança entre a forma boa e a má”[3].
O bom político deve tomar decisões. Se permanecer silente e não promover mudanças pontuais para afastar os políticos flexíveis, correrá o risco de ser absorvido por esse sistema. Como diz a frase clássica: “MENTE VAZIA, OFICINA DO FLEXÍVEL”.
O preço de simplesmente remediar a situação com paliativos é tornar-se um “hipocondríaco político”. Por ser neófito no ramo, ele precisará mudar o jogo, deixando de remediar e passando a agir de forma incisiva, como um bisturi político. Caso contrário, será apenas mais um bom político até a posse, tornando-se depois um péssimo político e flexível, o que, na prática, é a mesma coisa.
O efeito dessa postura é o afastamento daqueles que poderiam trazer a realidade à tona e extirpar os flexíveis, pois estes são prejudiciais. Afinal, o político flexível não tem posicionamento, não sabe quem é e apenas possui más intenções.
[1] MAQUIAVEL, Nicolau, Discursos sobre a primeira década de Tito Lívio, Brasília, Editora UNB, 2000.
[2] ARISTÓTELES, A Política, disponível em: < http://pensamentosnomadas.wordpress.com/2013/03/15/ obra-completa-de-aristoteles-em-pdf/ > Acesso em: 21/02/2025.
[3] https://www.cidp.pt/revistas/rjlb/2015/6/2015_06_0567_0609.pdf.
Este texto reflete única e exclusivamente a opinião do(a) autor(a) e não representa a visão do Instituto Não Aceito Corrupção (Inac). Esta série é uma parceria entre o Blog do Fausto Macedo e o Instituto Não Aceito Corrupção. Os artigos têm publicação periódica