Cabe aqui um breve retrospecto da legislação sobre o tema, partindo-se da norma anteriormente vigente, mais especificamente do artigo 20 e respectivos parágrafos, do Código de Processo Civil de 1973.
Estabelecia o então CPC que a sentença condenará o vencido a pagar ao vencedor as despesas que antecipou e os honorários advocatícios, os quais serão fixados entre o mínimo de dez por cento (10%) e o máximo de vinte por cento (20%) sobre o valor da condenação (artigo 20, parágrafo 3º, CPC de 1973).
O parágrafo 4º do mesmo diploma, por sua vez, estabelecia regra específica para os casos em que fosse vencida a Fazenda Pública e nas execuções: os honorários serão fixados consoante apreciação equitativa do juiz.
Tal circunstância ensejou, por muito tempo, situação diferenciada entre as partes, pois, enquanto o particular poderia ser condenado em até 20% do valor da condenação, a Fazenda Pública contava com a apreciação equitativa do juiz em relação aos honorários a pagar, quando vencida, o que na prática e no mais das vezes significava a fixação de valores irrisórios em favor da parte vencedora.
É bem verdade que os defensores dessa dicotomia podiam, como de fato puderam, justifica-la pela supremacia do interesse público ao particular, o qual restaria protegido pela impossibilidade de condenações significativas nas demandas em que fosse vencida a Fazenda Pública.
Mas também é verdade que essa diferenciação muitas vezes estimulava - ou, no mínimo, não evitava - que demandas fossem propostas pela Fazenda Pública sem que cuidados mínimos fossem adotados, como, por exemplo, a verificação da certeza e/ou exigibilidade do crédito. Essa foi a realidade desde 1973, especialmente em relação a inúmeras execuções fiscais ajuizadas, até o advento do NCPC.
O Novo Código, por sua vez, veio inovar nessa matéria, ao veicular norma que equipara as situações, dispondo que nas causas em que a Fazenda Pública for parte - sem distinção se vencida ou vencedora - serão aplicados percentuais sobre o valor da condenação para a apuração dos honorários devidos, os quais diminuem em proporção inversa à evolução dos valores envolvidos. Como exemplo, passamos a ter a aplicação de honorários entre 1% e 3% para a faixa superior a 100 mil salários.
Note-se que, de plano, podemos verificar três alterações importantes: os percentuais serão aplicados independentemente de quem for vencedor ou vencido (se a Fazenda Pública ou a parte contrária); os percentuais, ao menos para as faixas mais elevadas, são consideravelmente inferiores aos 10% a 20% antes praticados; e elimina-se a possibilidade de aplicação equitativa pelo juiz por regra objetiva de apuração de honorários.
Na perspectiva daquele que litiga contra a Fazenda Pública essa alteração traz um sopro de esperança, no sentido de que as condenações nas causas em que obtém êxito lhe sejam mais compatíveis com o esforço e a responsabilidade verificados em discussões mais complexas e/ou de elevada monta, algo improvável no passado.
Já na perspectiva da Fazenda Pública, não há dúvida que a nova regra afasta - ou deveria afastar - a base legal para a exigência de honorários de sucumbência na ordem de 20%, algo absolutamente corriqueiro nas execuções fiscais, tanto no âmbito federal como estadual.
Nada mais razoável que, com o advento do artigo 85, parágrafo 3º, do NCPC, a exigência dos 20% a título de honorários de sucumbência em toda e qualquer execução fiscal não mais ocorra por parte da Fazenda Pública. Infelizmente, passados alguns meses no início da vigência do NCPC, o particular ainda enfrenta, sistematicamente, a inclusão desse elevado percentual nas execuções fiscais recém ajuizadas, sem que o Poder Judiciário, por ora, repudie tal procedimento por se mostrar claramente ilegal.
Além disso, é também razoável esperar-se que, mesmo nas execuções fiscais ainda em curso e sem decisão prolatada quando do início da vigência do NCPC, o Poder Judiciário venha a aplicar a nova regra, reduzindo os honorários aos novos patamares se vencida a Fazenda Pública, algo que não entendemos possível em relação às demandas já decididas quando em vigor o NCPC.
Tanto em uma hipótese como em outra, devemos observar como o Poder Judiciário se comportará em relação à matéria. Se adotará a linha que nos parece a prestigiada pelo NCPC - qual seja, no sentido de afastar a dicotomia antes existente, equiparando os riscos do litígio independentemente de quem é a parte vencida e estabelecendo regra objetiva de fixação de honorários - ou se continuará a sobrepor o interesse da Fazenda Pública ao do particular, ainda que sem base legal para tanto.
Essa é, sem dúvida, uma entre as várias matérias em relação às quais a rápida e efetiva manifestação do Judiciário é não só adequada, como extremamente necessária. Espera-se que a interpretação oriunda das Cortes consagre os valores que pretendeu privilegiar o NCPC, dentre os quais a equidade entre as partes do processo.
* Glaucia M. Lauletta Frascino é sócia do escritório Mattos Filho
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