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Acordo contratual por emoji: no Brasil vale?

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Por Giovana Monte
 Foto: Reprodução

Na semana passada circulou a notícia de que o emoji de 'joinha' foi considerado, pelo Juiz TJ Keene do Tribunal de Justiça de Saskatchewan no Canadá, como acordo contratual. A informação gerou um certo alvoroço. Será que devemos ter cuidado ao conversarmos sobre acordos pelos aplicativos de mensagens?

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É evidente que as normas, os costumes e a própria legislação devem seguir o ritmo da tecnologia e da nova realidade da sociedade, já que atualmente sentimentos e interesses são de fato expressados diariamente por pequenos rostos e gestos, os tais emojis, disponíveis nos teclados dos smartphones.

Foi justamente focado nesta nova realidade que o Juiz TJ Keene reconheceu um emoji como acordo comercial. Na verdade, é um aceite implícito ou tácito.

O aceite tácito é reconhecido em diversos Países como uma forma válida de manifestação de vontade contratual, desde que as circunstâncias indiquem claramente a intenção de aceitar os termos propostos.

Por exemplo, nos Estados Unidos, a Uniform Commercial Code (UCC), que é uma lei adotada por todos os estados norte-americanos, estabelece que o aceite pode ser expresso ou implícito, desde que a conduta da parte que recebeu a oferta seja consistente com a aceitação.

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Giovana Monte. Foto: Divulgação

Na União Europeia, o aceite implícito também é reconhecido em muitos Países membros. A Diretiva 2011/83/UE, que trata dos direitos dos consumidores, estabelece que o aceite pode ser expresso ou tácito, desde que a conduta do consumidor indique claramente sua intenção de aceitar a oferta.

E no Brasil, como a nova realidade digital pode impactar no acordo contratual?

Em nosso País há muito já temos a previsão da aceitação tácita, antes, inclusive, do Código Civil de 2002.

O Código Civil de 1916, já previa tanto a resolução da obrigação por manifestação tácita (artigo 116, Parágrafo Único CC/16), quanto a manifestação de vontade nos contratos (artigo 1.079 CC/16).

O atual Código Civil, apenas manteve o princípio da liberdade de forma (artigo 107 do CC/02) aos contratos. Então, salvo quando a lei requerer expressamente forma especial, a declaração de vontade, segundo a legislação Brasileira, pode operar de forma expressa, tácita ou mesmo pelo silêncio (artigo 111 do CC/02).

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Todavia, em que pese a abrangência e flexibilidade para a declaração de vontade, é necessário que o acordo, apresentado por meios digitais, siga os requisitos legais para o tornar válido. Ou seja, para que um contrato seja válido é necessário que: haja o consentimento das partes; o objeto do contrato seja lícito; e, por fim, que haja forma prescrita ou não proibida em lei.

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É importante ressaltar que no Brasil existem alguns tipos de contratos que exigem formalidades específicas, como a forma escrita (ex.: contratos imobiliários, contratos de trabalho) ou a assinatura das partes (contratos bancários, contratos de seguros), para sua validade. O que impossibilitaria o reconhecimento da aceitação tácita.

Assim, no caso de contratos celebrados por meio de aplicativos de conversas, é importante que as partes tenham clareza e concordância quanto aos termos e condições do contrato.

Lembrando que, no Brasil, as conversas realizadas por meio de aplicativos de mensagens podem ter validade jurídica, desde que atendam a certos requisitos legais. As conversas podem ser consideradas como meio de prova em processos judiciais ou administrativos, desde que sejam autênticas e não violem direitos fundamentais.

A Lei nº 11.419/2006, que dispõe sobre a informatização do processo judicial, estabelece que os documentos eletrônicos têm a mesma validade jurídica que os documentos físicos, desde que seja garantida a sua autenticidade. Portanto, as conversas em aplicativos podem ser consideradas como documentos eletrônicos e, se autênticas, podem ser utilizadas como prova.

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Para garantir a autenticidade das conversas, é importante que as partes envolvidas possam comprovar a integridade e a autoria das mensagens. Isso pode ser feito por meio de capturas de tela, registros de conversas, certificados digitais ou outros meios que demonstrem a autenticidade das mensagens.

No entanto, não se pode olvidar que a validade jurídica das conversas em aplicativos pode ser questionada em casos específicos, como quando há suspeita de adulteração das mensagens ou quando são violados direitos fundamentais, como a privacidade e o sigilo das comunicações.

Em conclusão, no Brasil a nova realidade digital também impacta na forma como os contratos são acordados.

A legislação brasileira não impõe restrições à utilização de aplicativos como meio de manifestação da vontade contratual. Ou seja, nos mesmos moldes da aplicação pelo Juiz TJ Keene, no Brasil também é possível que seja reconhecido como válido os acordos contratuais realizados por meio de conversas em aplicativos, sendo assim, caminhamos para o reconhecimento de 'emojis' como aceite de contratual.

Fique claro que, que, conforme também apresentado pelo Juiz TJ Keene do Tribunal de Justiça de Saskatchewan no Canadá, há a necessidade, além da declaração tácita, a inexistência de comportamento contrário a essa mesma aceitação.

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*Giovana Monte, especialista em Direito Civil

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