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‘Amigo do Og’: assessor de ministro do STJ vazou a lobista dados sigilosos de venda de sentenças

Segundo a Polícia Federal, Rodrigo Falcão de Oliveira Andrade, afastado das funções no gabinete do ministro Og Fernandes, do Superior Tribunal de Justiça, teria repassado informações sensíveis de uma nova etapa da Operação Faroeste, investigação que mira desembargadores do Tribunal de Justiça da Bahia por sentenças ilícitas; STF e STJ negam envolvimento de ministros com o caso; Estadão busca contato com assessor

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Foto do author Pepita Ortega
Foto do author Fausto Macedo
Atualização:

A Polícia Federal suspeita que Rodrigo Falcão de Oliveira Andrade, chefe de gabinete do ministro Og Fernandes, do Superior Tribunal de Justiça, vazou para o lobista de sentenças Andreson Oliveira Gonçalves, preso nesta terça, 26, informações sigilosas sobre a Operação Faroeste - investigação aberta em 2019 sobre esquema de corrupção que teria sido instalado no Tribunal de Justiça da Bahia, com decisões ilícitas que permitiram grilagem de cerca de 360 mil hectares de terras no oeste do Estado.

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O Estadão busca contato com Rodrigo Falcão que, por ordem do ministro Cristiano Zanin, do Supremo Tribunal Federal, foi afastado do cargo. O espaço está aberto para manifestações.

O Supremo Tribunal Federal informou que, até o momento, não há “elementos sobre o envolvimento de magistrados de tribunais superiores no caso”. O STJ nega a ligação de ministros com venda de sentenças e destaca que sua investigação aponta para quatro servidores. Sobre a operação, o STJ afirmou que “não irá se manifestar, pois se trata de uma investigação que tramita sob sigilo no Supremo Tribunal Federal”.

As suspeitas sobre Falcão partem de um diálogo de Andreson com o advogado Roberto Zampieri – apontado como o ‘lobista dos tribunais’, assassinado a tiros na frente de seu escritório no ano passado em Cuiabá. Na conversa eles trataram da abertura de uma das fases da Operação Faroeste, em março de 2020.

O primeiro capítulo da grande ofensiva que virou no avesso o Tribunal de Justiça da Bahia foi deflagrado em 2019. Seus desdobramentos e reflexos seguem até hoje. Em meio às investigações, uma desembargadora do Tribunal de Justiça da Bahia fez delação premiada e apontou 23 colegas de toga, dos quais 12 desembargadores e onze juízes de primeiro grau e, ainda, onze advogados, todos supostamente envolvidos em decisões ilegais.

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Fachada do STJ, em Brasília. Foto: Divulgação

Andreson relatou a Zampieri que ficou sabendo da nova fase ostensiva da investigação da Polícia Federal a partir do ‘amigo do og’, uma possível referência a Rodrigo Falcão de Oliveira Andrade, então chefe de gabinete do ministro Og Fernandes, relator da Operação Faroeste do Superior Tribunal de Justiça.

Em seguida, Andreson repassou a Zampieri a decisão de Og que instaurou nova etapa da Faroeste, embora o caso estivesse sob segredo de Justiça.

Nesta terça, 26, quatro anos após a conversa com Zampieri, tanto Andreson quanto Rodrigo Falcão foram alvos da Operação Sisamnes, deflagrada por ordem do ministro do Supremo Tribunal Cristiano Zanin. O alvo principal da Sisamnes são desembargadores do Tribunal de Justiça de Mato Grosso que tinham, segundo o Conselho Nacional de Justiça, ‘amizade íntima’ com Zampieri.

Também por determinação de Zanin, três assessores de gabinetes de ministros do STJ foram afastados das funções - Rodrigo Falcão, Márcio José Toledo Pinto, que foi assessor nos gabinetes das ministras Maria Isabel Gallotti e Nancy Andrighi, e Daimler Alberto de Campos, chefe de gabinete de Gallotti.

Andreson foi preso preventivamente, apontado como chefe de um ‘ousado e verdadeiro comércio de sentenças’ no STJ.

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Segundo os investigadores, ele é suspeito de negociar e intermediar decisões em pelo menos doze processos distintos no Superior Tribunal de Justiça, oriundos dos Tribunais estaduais de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, São Paulo, Rio Grande do Sul e Distrito Federal.

Ao detalhar as suspeitas que recaem sobre Andreson e os assessores de gabinetes de ministros do STJ, a Polícia Federal resgatou diálogos do lobista de sentenças e seu colega Zampieri, ocorridos em março e abril de 2020.

Segundo os investigadores, esses contatos, pela via WatsApp, mostram que Andreson “estabelecia uma relação consideravelmente próxima com um “amigo lotado” no gabinete do ministro Og Fernandes. Ele estaria repassando informações sigilosas do processo.

“O amigo vai me passar, são 3 procedimentos. Um INQ Uma PET e um PBAC. O pedido de bloqueio de bens e a prisão dele está em um expediente avulso. Uma QBSING. Quando fechar o amigo lá vai mandar da forma que temos que fazer”, escreveu Andreson em certa ocasião.

Em uma conversa, é citado um ‘Rodrigo’. A PF vê indícios de que seja uma referência a Rodrigo Falcão de Oliveira Andrade, então chefe de gabinete do ministro. Na época, havia apenas um servidor com esse nome no gabinete de Og Fernandes.

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Zampieri: “Andreson, ele é mesmo? Apareceu isso nas gravações?”

Andreson: “O delegado falou, aí Rodrigo mandou tirar da escuta, mas está arquivado em expediente avulso. Vou pegar para você ver”.

Zampieri: “Saiu decisão?”

Andreson: “Lógico. Está na mão. Tudo certo. Indeferiu todos os pedidos de revogação de prisão”.

Faroeste

No dia 24 de março de 2020, a PF abriu a quinta fase da Operação Faroeste e prendeu a desembargadora Sandra Inês Moraes Rusciolelli Azevedo, que posteriormente veio a ser a primeira desembargadora a fechar um acordo de delação no Brasil. Ao todo, ela citou 68 nomes, entre magistrados, advogados, empresários e até políticos. No último dia 17, o ministro Og Fernandes, do STJ, rescindiu a delação da magistrada.

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No início do mês, o Superior Tribunal de Justiça tornou a magistrada ré por corrupção, organização criminosa e lavagem de dinheiro em um outro caso conectado ao esquema de venda de sentenças. Isso porque a ação penal também atinge o advogado Vanderlei Chilante, também delator da Faroeste.

A desembargadora Sandra Inês Moraes Rusciolelli Azevedo. Foto: Nei Pinto / TJBA

Enquanto corriam as investigações sobre o esquema de venda de sentenças na Bahia, Chilante representava, no Tribunal de Justiça de Mato Grosso, a família do homem que veio a ser indiciado como o mandante do assassinato de Zampieri, o advogado com estreitas relações com magistrados.

Zampieri atuava em uma ação de disputa de terras que tramita há mais de 35 anos. A Polícia Civil de Mato Grosso acredita que a atuação de Zampieri nesse processo e sua ‘amizade íntima’ com um desembargador que atuou no caso teriam sido o pivô do assassinato.

Acesso

A Polícia Federal fez diligências junto à Presidência do Superior Tribunal de Justiça atrás de informações sobre o acesso interno ao processo citado por Andreson e encontrou as digitais de Rodrigo Falcão na véspera da mensagem em que Andreson encaminhou a decisão sigilosa de Og Fernandes.

Ao analisar o caso, o ministro Cristiano Zanin entendeu que as informações eram suficientes para autorizar buscas na casa de Rodrigo Falcão, de modo a aprofundar as investigações sobre seu suposto envolvimento na empreitada.

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Histórico

Não é a primeira vez que a PF constata que Andreson teve acesso a processos sigilosos do STJ. O inquérito da Operação Ultima Ratio, investigação sobre suposta venda de sentenças no Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, que também expôs a atuação de Andreson, indica que ele compartilhou com o desembargador Marcos José de Brito Rodrigues, da Corte estadual, documentos de um inquérito e de uma ação penal sigilosos que tramitam no tribunal superior.

O ministro Francisco Falcão - que foi relator da Operação Última Ratio no STJ antes dos autos serem remetidos para o Supremo Tribunal Federal - classificou como de “extrema gravidade” o fato de o lobista repassar ao desembargador dados referentes a um processo fechado e da alçada do Superior Tribunal de Justiça. O ministro assinalou que Andreson “não figura como investigado naqueles autos”.

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