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Opinião|Arbitragem e diferenças regionais

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Por Fernanda Bragança e Peter Sester

Entre os temas que envolvem a arbitragem no Brasil, a anulação da sentença arbitral é uma das questões mais candentes. O assunto é especialmente relevante em um país marcado por alta litigiosidade, em que os métodos adequados de resolução de conflitos são recentes e o contencioso judicial acaba por exercer influência na jurisdição arbitral.

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A recente pesquisa da FGV Justiça busca lançar luz sobre este fenômeno e, por meio de análise quantitativa e qualitativa, propor uma discussão mais aprofundada sobre o assunto. O estudo partiu de uma base de decisões judiciais compiladas pelo portal Jusbrasil proferidas entre 2018 e 2023. O resultado geral é favorável à arbitragem: a atuação do Poder Judiciário brasileiro, de forma amplamente majoritária, prestigia a decisão tomada em sede arbitral, o que confere segurança jurídica ao instituto e mostra o amadurecimento do sistema.

A pesquisa fez um levantamento da taxa de procedência das ações anulatórias de sentença arbitral, entre as Apelações e os Recursos Especiais julgados pelas Cortes estaduais e pelo Superior Tribunal de Justiça no período. Os números apontam para uma taxa de procedência (total ou parcial), em segunda instância, de 22,6%. Porém, quando se observam os resultados na esfera regional, há disparidades que merecem atenção.

As regiões Sul e Sudeste, que concentram um volume importante das arbitragens do país, contam com uma taxa de procedência inferior à média nacional. Para se ter uma ideia, o Tribunal de Justiça do Estado de Rio de Janeiro não anulou, em sede Apelação, nenhuma sentença arbitral no período.

Em Santa Catarina, onde o Tribunal de Justiça concentra o quarto maior volume de Apelações em ação anulatória de sentença arbitral, a taxa de procedência (no todo ou em parte) foi de 9,5%. No TJ do Paraná, que está na terceira posição, foi verificada uma taxa de 12%.

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O maior tribunal do país merece uma explicação mais detalhada. Além de ter duas câmaras reservadas de Direito Empresarial, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo detém sozinho, 25,14% do total das apelações em ação anulatória de sentença arbitral julgadas no período. A Corte é sobrecarregada pelos casos do sistema cooperativo Unimed, que são responsáveis por uma distorção dos números. Excluídos esses casos, para padronizar São Paulo com a situação de outros tribunais, a taxa de procedência (total ou parcial) seria de 17,5%, ou seja, bem abaixo da média nacional.

O Tribunal de Justiça do Estado de Goiás é um ponto fora da curva. O tribunal julgou 167 apelações em ação anulatória de sentença arbitral no período averiguado pela pesquisa, que correspondem a 46,65% do total. A taxa de procedência ficou no patamar de 15,6%. Em outras Cortes, como no Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, Tocantins, Pernambuco e Rondônia as decisões judiciais mantiveram a sentença arbitral na totalidade dos casos.

Uma constatação interessante foi o fato de que, nos Tribunais de Justiça dos estados do Acre, Roraima, Amapá, Maranhão, Piauí, Paraíba, Sergipe, Espírito Santo e Mato Grosso do Sul não foram identificadas decisões em sede de apelação em anulação de sentença arbitral no período analisado pela pesquisa.

Em razão de legislações recentes, como a Lei de Licitações, a Administração Pública insere cláusula de arbitragem com mais frequência. Nos três níveis federativos, as Procuradorias criam estruturas especializadas no contencioso arbitral. No período investigado, chamou a atenção o baixo número de apelações em ação anulatória de sentença arbitral que tiveram como parte o Poder Público. Esse dado é extremamente positivo na medida em que as arbitragens com entes estatais envolvem montantes cada vez mais vultuosos.

Entre as matérias que embasaram os procedimentos arbitrais que deram origem às Apelações e aos Recursos Especiais estão: cível, contratos do sistema cooperativo Unimed, empresarial, franquia, societário, energia e infraestrutura.

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Os fundamentos mais comuns que embasaram a anulação da sentença arbitral, em sede de apelação, são, nesta ordem: nulidade da convenção arbitral (art. 32, I da Lei 9.307, de 1996); extrapolação dos limites da convenção de arbitragem (art. 32, IV da Lei 9.307, de 1996) e violação aos princípios do contraditório, da igualdade das partes, da imparcialidade do árbitro e seu livre convencimento (art. 32, VIII da Lei 9.307, de 1996).

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A pesquisa identificou 51 Câmaras de arbitragem que geriram procedimentos arbitrais que resultaram em Apelação e Recurso Especial no STJ de 2018 a 2023.

No geral, é possível afirmar que, no Brasil, a arbitragem funciona bem tanto para o Poder Público quanto para o setor privado. O cenário é bastante promissor para que o Brasil alcance uma posição importante sede de arbitragens transnacionais.

Por outro lado, há muito o que avançar no que concerne ao acompanhamento das arbitragens, uma vez que os estudos ainda são escassos. No plano nacional, o estudo realizado pela FGV Justiça visa contribuir, de forma construtiva e propositiva, para o aperfeiçoamento do sistema de justiça brasileiro.

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Fernanda Bragança
Pesquisadora da FGV Justiça. Foto: Arquivo pessoal
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