BRASÍLIA — O tenente Osmar Crivelatti destoou do silêncio evocado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro na quinta-feira, 31, e prestou um longo depoimento para “esclarecer fatos”, nas palavras de seu advogado, sobre o possível esquema de desvio de joias presidenciais, pelo qual Bolsonaro e seus aliados são investigados na Polícia Federal na Operação Lucas 12:2.
“Como as investigações estão em curso e o processo está sob sigilo, nos manifestaremos apenas nos autos. Nesse momento, apenas reitero que o senhor Osmar Crivelatti continua à disposição dos órgãos de investigação, somente esclarecendo sobre fatos que tem conhecimento”, afirmou ao blog o advogado Flávio dos Santos Raupp, que também é capitão aposentado do Exército e amigo de Crivelatti desde os tempos na caserna.
Crivelatti foi um dos oito investigados no inquérito das joias que teve de comparecer à Polícia Federal para depoimento na quinta-feira, 31. Além do tenente, os investigadores queriam interrogar simultaneamente, em salas separadas, o ex-presidente Bolsonaro, a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro, o tenente-coronel Mauro Cid, o general Cesar Lourena Cid, o coronel Marcelo Câmara, e os advogados Fábio Wajngarten e Frederick Wassef.
Apenas Crivelatti, Mauro Cid e Cesar Cid responderam às perguntas dos policiais federais. Bolsonaro e os outros se apegaram a um parecer da Procuradoria-Geral da República (PGR), contrário à permanência das investigações no Supremo Tribunal Federal (STF), para alegar que só prestariam depoimento no foro adequado, algo que ainda não foi decidido pelo STF. Sob o comando de Augusto Aras, a PGR defendeu, ainda antes da deflagração da operação, que o inquérito fosse transferido para a primeira instância da Justiça Federal.
Militar do Exército, Crivelatti era um dos mais próximos ajudantes de ordens de Bolsonaro durante o seu governo e atualmente continua a trabalhar como um dos “assistentes” pessoais do ex-presidente em suas atividades diárias. A Polícia Federal investiga a participação de Crivelatti tanto na retirada de joias do acervo presidencial quanto na posterior “operação de resgate” para devolver os itens ao patrimônio federal.
Rolex retirado do acervo e revendido
Em 8 de junho do ano passado, Crivelatti retirou do acervo presidencial um conjunto de joias presentadas a Bolsonaro pela monarquia da Arábia Saudita. Esse conjunto foi chamado pela PF de “kit ouro branco” e continha um relógio Rolex, cravejado de diamantes, e outras peças de luxo (caneta cravejada com pedras brilhantes, abotoaduras de ouro branco, anel de ouro branco e rosário árabe de ouro branco).
A Polícia Federal descobriu que essas joias foram entregues naquele mês ao tenente-coronel Mauro Cid, que chefiava Crivelatti na equipe de ajudantes de ordens de Bolsonaro. Cid aproveitou uma viagem presidencial aos Estados Unidos para revender a um comerciante o Rolex e outro relógio da marca Patek Philippe (omitido do acervo oficial). Os dois itens foram vendidos em 13 de junho do ano passado por US$ 68 mil (quase R$ 350 mil na data da venda). Wassef alegou a jornalistas que pagou US$ 49 mil (cerca de R$ 250 mil) só pela recompra do Rolex em março deste ano. O Patek Philippe continua desaparecido mesmo depois de ordem do Tribunal de Contas da União (TCU) para que fosse devolvido ao patrimônio federal.
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