O ministro Luís Roberto Barroso, presidente do Supremo Tribunal Federal, saiu em defesa do ministro Alexandre de Moraes nesta quarta-feira, 14, classificando como uma ‘tempestade fictícia’ a divulgação de mensagens com pedidos, por parte do relator do inquérito das fake news, para produção de relatórios do Tribunal Superior Eleitoral sobre bolsonaristas.
“A ideia de que foram iniciativas tomadas à margem da lei é completamente equivocada. É uma desinformação jurídica”, afirmou durante a abertura da sessão plenária. Barroso sustentou que “não houve nenhuma circulação de dados e informações que não estivesse documentada adequadamente no processo”.
O ministro também destacou que todas as informações foram solicitadas quanto a pessoas que já eram investigadas, para instruir investigações que estavam em curso. “Em nenhuma hipótese, em nenhum caso, houve fishing expediction personalizada a qualquer pessoa aleatória”, afirmou.
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O presidente do STF indicou que, no caso em questão, o condutor do inquérito do STF era “por acaso” o presidente do TSE.
“A alegada informalidade é porque ninguém geralmente oficia para si próprio. Como as informações eram do presidente do TSE para o relator, elas não eram formalizadas no momento da solicitação, por isso havia algumas solicitações informais. Mas quando elas chegavam eram formalizadas e inseridas nos processo dada vista ao Ministério Público”, frisou.
Outro ponto destacado por Barroso foi o fato de todas as informações solicitadas por Moraes serem públicas e requeridas ao órgão do TSE que fazia o acompanhamento de redes sociais.
“Não houve aqui nenhum tipo de investigação de natureza policial ou que dependesse sequer de reserva judicial. Era o acompanhamento de dados e informações, notícias e postagens em redes sociais, para verificar se havia alguma conduta criminosa ou algum conduta que estava sendo investigada no âmbito dos inquéritos”, ponderou.
Ouça as conversas entre o juiz auxiliar do gabinete de Moraes e o perito do TSE:
Ecoando nota divulgada pelo gabinete de Moraes nesta terça-feira, 13, o ministro destacou o poder de polícia do Tribunal Superior Eleitoral, indicando que basta o indício de “alguma coisa errada” para que a Corte o exerça. Barroso explicou que a Corte eleitoral tem o dever jurídico de atuar sempre que haja circulação de desinformação com risco ao sistema eleitoral e à democracia.
Além disso, ao abordar os ‘ataques injustos e impróprios a Moraes’, o presidente da Corte máxima quis destacar o contexto dos inquéritos em curso no STF – “Para que não se faça um revisionismo histórico abstraindo do que estávamos vivendo naquela conjuntura de risco grave para a democracia”.
O ministro citou uma série de situações verificadas em 2022, como os acampamentos bolsonaristas que pediam golpe de estado, o bloqueio de estradas após o segundo turno, a depredação da sede da Polícia Federal no dia da diplomação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a ameaça de bomba no aeroporto de Brasília.
Também mencionou episódios em que os ministros do STF foram “cercados por centenas de pessoas com ameaça de agressão” e as “inúmeras ameaças de morte” a cada um dos magistrados. “Passamos a andar com segurança pelos sucessivos riscos que passamos a correr”, apontou, citando ainda um episódio em que uma “turba” tentou virar uma van em que estavam os magistrados, em Nova York.
“Vivíamos uma conjuntura tensa e de gravíssimas ameaças à democracia, às instituições e às pessoas. Portanto é preciso levar em conta que as decisões eram tomadas em uma conjuntura extremamente adversa, em que se fazia uma campanha falsa, fraudulenta, contra as urnas eletrônicas, a legitimidade do processo eleitoral e a posse do presidente eleito”, ponderou.
Segundo Barroso, todos os atos praticados por Moraes se deram no “cumprimento do dever”. “Nós que o acompanhamos de perto sabemos o custo pessoal e a coragem moral e física que exigiu enfrentar esse tipo de movimentação antidemocrática. Ninguém imagina a tensão, o desconforto e a coragem que é preciso para se opor ao extremismo e sua tentativa de intimar. Parte da reação que nós enfrentamos é porque não nos deixamos intimidar. Não podemos rever a história, esquecer do que passou e do que tivemos que enfrentar, ciclos de atraso que já achávamos que tínhamos superado”, afirmou, em aceno a Moraes.
O presidente do STF diz que a Corte ‘não tem nada a esconder’ e não se acha ‘imune a visões críticas’. Barroso sustentou que a preocupação dos ministros é com ‘interpretações equivocadas’, destacando o comprometimento dos magistrados com a Constituição, a busca da verdade possível e com a democracia.
‘Nada anormal’, diz Gilmar Mendes, que afasta comparações com a Lava Jato
Logo após o pronunciamento de Barroso, o decano do STF, Gilmar Mendes afastou qualquer comparação do caso com os métodos da Operação Lava Jato, classificando tal paralelo como “irresponsável e sem a menor correlação fática”. Segundo decano, tal tentativa de comparação é “uma tentativa desesperada de desacreditar o Supremo Tribunal Federal, em busca de fins obscuros relacionados a impunidade dos golpistas”
Gilmar afirmou que a atuação de Moraes é “pautada pela legalidade, pelo respeito aos direitos e garantias individuais e pelo compromisso inegociável com a verdade”. Para Gilmar, a Corte deve “repelir com altivez” a crítica sobre os pedidos de relatórios feitos por Moraes. Em sua avaliação, está em curso “uma tentativa de reconstrução, com uma nova roupagem, de teses de defesa dos investigados que, há muito, procuram deslegitimar a atuação do relator nessas investigações”.
Segundo Gilmar, é dever de Moraes determinar a apuração de atos criminosos que cheguem ao seu conhecimento. O decano afirmou que o relator tem o “dever funcional de atuar proativamente para apurar qualquer notícia de ilícito relacionada ao objeto das investigações que seja trazida ao seu conhecimento”. Não há “nada de anormal ou heterodoxo” em tal atuação por parte de Moraes, frisou.
“No caso, o gabinete de um Ministro do STF encarregado de apurar notícias falsas solicitou - ainda que por meios mais céleres, diante da urgência que é inerente à atuação em meio ao processo eleitoral – que os órgãos do TSE desempenhassem as funções para as quais foram criados: o registro, em relatório oficial, de informações sobre notícias falsas que circulavam amplamente nas redes sociais e atentavam contra o equilíbrio das eleições. Tudo isso acompanhado pelo eminente Procurador-Geral da República, que acompanha e se manifesta em todos os inquéritos que tramitam nesta Corte”, ponderou.
Na avaliação do decano, não é estranho que servidores do gabinete de Moraes tenham pedido, “pelos canais institucionais adequados”, relatórios sobre “notícias falsas que eram públicas e circulavam livremente pelas redes sociais”.
“Esses relatórios – isso deve ser enfatizado - não promoveram quebras dos sigilos dos réus nem invadiram sua privacidade. Ao contrário: tais levantamentos apenas identificaram notícias públicas, divulgadas voluntariamente pelos investigados em suas redes sociais. A ideia era somente registrar dados relevantes sobre possíveis divulgações criminosas - como data e horário de divulgação, o conteúdo da mensagem e seu endereço eletrônico (URL) -, para impedir que elas fossem convenientemente apagadas pelos investigados a fim de frustrar o trabalho dos investigadores”, frisou o decano.
‘Houve abertura de oportunidade para atuação do Ministério Público’, diz Gonet
O procurador-geral da República Paulo Gonet entoou a manifestação de Barroso e afirmou que, onde era cabível a intervenção do órgão ou da Procuradoria-Geral-Eleitoral, “houve a abertura de oportunidade para atuação” do Ministério Público. “Nessas oportunidades, pude verificar as marcas de coragem, diligência, assertividade e retidão nas decisões e no modo de Moraes conduzir os inquéritos”, indicou.
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