Celas superlotadas, racionamento de água e de insumos de higiene, falta de comida e de médicos e maus-tratos. Essa é a realidade que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) afirma ter encontrado nos presídios de Goiás.
Uma inspeção extraordinária foi realizada após dezenas denúncias de irregularidades aportarem no CNJ. O relatório final ainda está em produção, mas uma versão provisória, com as primeiras impressões de quem participou da auditoria, foi divulgado pelo Conselho Nacional de Justiça.
O documento fala em uma “prática sistematizada e normalizada de maus-tratos”, com balas de borracha e eletrochoques. Presos teriam relatado a existência de salas de tortura. O CNJ diz ter encontrado detentos isolados de outros presos com feridas visíveis. Alguns casos foram reportados para investigação.
”Fatos percebidos e constatados autorizam o Conselho Nacional de Justiça a apontar para um possível cenário de tortura endêmica nos estabelecimentos prisionais inspecionados”, afirma o relatório. “Também se aponta, com muita preocupação, a não-apuração ou a apuração deficitária de responsabilidades diante dos casos denunciados, inclusive se constatando que a apuração de denúncias de tortura e maus-tratos não possui transparência ou fluxos predefinidos.”
O Conselho Nacional de Justiça montou uma força-tarefa de 58 juízes e auxiliares para fazer pessoalmente a inspeção. Os servidores visitaram 19 dos 88 presídios ativos em Goiás e ouviram relatos de presos, funcionários penitenciários e organizações da sociedade civil. O corregedor nacional de Justiça, ministro Luís Felipe Salomão, participou do pente-fino.
O relato é que as unidades abrigam populações carcerárias muito acima da capacidade e que, frequentemente, as transferências dos presos são feitas informalmente, sem autorização do Poder Judiciário.
Outro ponto que chamou atenção dos servidores do CNJ é que muitos presos cumprem toda a pena em regime fechado, sem flexibilização para o semi-aberto ou o domiciliar, por exemplo.
Enquanto estão nos presídios, os presos passam até 22 horas “na tranca”, sem direito a banho de sol por um período maior do que duas horas. Em algumas penitenciárias, o banho de sol acontece apenas duas vezes por semana, segundo o Conselho Nacional de Justiça.
O documento afirma ainda que advogados enfrentam “burocracias e entraves administrativos heterodoxos” e têm dificuldade de conseguir contato reservado com os clientes presos. Também houve relatos de humilhação e agressão a criminalistas nos presídios.
O CNJ destaca a necessidade de contratar mais defensores públicos. Hoje são 130 no Estado, contra 594 promotores de Justiça no Ministério Público de Goiás. Para o Conselho Nacional de Justiça, a desproporção é “absoluta”.
COM A PALAVRA, A DIRETORIA DE ADMINISTRAÇÃO PENITENCIÁRIA DE GOIÁS
“A Diretoria-Geral recebeu o relatório preliminar do CNJ e já adotou providências em relação a todos os fatos apontados como necessários de intervenção urgente, como, por exemplo, a prestação de atendimentos médicos a determinados internos, realização de relatórios médicos, envio de documentos ao Tribunal de Justiça de Goiás e ao próprio CNJ, entre outras diligências.
É importante salientar que o CNJ não fez nenhuma denúncia, apenas relatou situações a partir de sua visitação. Dos fatos apontados, vários pontos já possuem tratativas para melhorias e resolução por parte da Secretaria de Estado da Segurança Pública (SSP) e da Diretoria-Geral de Administração Penitenciária (DGAP):
- Os novos contratos de alimentação preveem quatro refeições, além do aumento do quantitativo de alimentos diários para cada preso;
- As assistências médicas aos custodiados cresceram em mais de 50% nos últimos 12 meses e tendem a melhorar com a construção do Espaço Integrado de Saúde no Complexo Prisional de Aparecida de Goiânia, ofertando melhores condições de trabalho aos profissionais da saúde e ampliando os números de atendimentos. O projeto está orçado em R$ 7 milhões e se encontra em trâmite administrativo para a licitação ainda este ano.
- Todos os casos apontados pelo CNJ como eventuais torturas e maus-tratos aos custodiados estão sendo apurados pela corregedoria da DGAP, seguindo o devido processo legal. Foram instauradas, ao todo, três sindicâncias para apurar os casos indicados pelo relatório do CNJ na Casa de Prisão Provisória (CPP) de Aparecida de Goiânia, Feminino Consuelo Nasser e no Presídio Regional de Planaltina.
Vários são os investimentos nas melhorias das estruturas físicas das unidades, bem como a ampliação de vagas, podendo citar:
Obras de ampliação Penitenciária Coronel Odenir Guimarães (POG) e CPP, ambas do Complexo Prisional de Aparecida de Goiânia
Investimentos: R$ 107 milhões (em processo de início das obras)
Vagas: 1,6 mil
Reforma da POG
Investimentos: R$ 6 milhões (concluído)
Obra: Reforma todas das celas e acessos de dois blocos centrais da penitenciária, que não haviam sido reformados há mais de 40 anos.
Reforma da CPP
Investimento: R$ 4 milhões (em processo de início das obras)
Obra: Melhorias de todo o processo de ventilação, das estruturas físicas etc.
Construção do presídio de Novo Gama
As obras estão em fase adiantada e, em 10 meses, serão entregues mais 300 vagas no Entorno de Brasília. Investimento de R$ 17,8 milhões do Governo do Estado e Ministério da Justiça.
Construção de novos presídios (em processo de captação de recursos)
Catalão
Número de Vagas: 400 vagas
Área: 4.397,56 m²
Valor Previsto: R$ 35,2 milhões
Luziânia
Número de Vagas: 400 vagas
Área: 4.397,56 m²
Valor Previsto: R$ 35,2 milhões
Caldas Novas
Número de Vagas: 400 vagas
Área: 4.397,56 m²
Valor Previsto: R$ 35,2 milhões
Formosa
Número de Vagas: 400 vagas
Área: 4.397,56 m²
Valor Previsto: R$ 35,2 milhões
Por fim, cabe ressaltar que é missão da Polícia Pena de Goiás promover com qualidade a custódia e a ressocialização das pessoas com penas privativas de liberdade, restritivas de direitos e dos egressos do sistema prisional e busca tornar-se a melhor instituição de administração penitenciária do país.
No período entre 2019 e 2022, o Governo de Goiás investiu mais de R$ 111 milhões no sistema penitenciário goiano, recursos empregados na construção e reforma de unidades prisionais, compras de equipamentos de informática e hospitalares, armamento e munições, dentre outros.
Estes investimentos contribuíram para que a realidade do sistema penitenciário goiano tenha sido totalmente alterada, quando comparada ao período anterior.
Hoje, aproximadamente 4 mil presos trabalham no sistema penitenciário goiano. Por outro lado, mais de 3,4 mil custodiados estudam dentro das unidades prisionais.
Esses investimentos, aliados à dedicação do servidor penitenciário, geraram redução nos índices de criminalidade, dentro e fora da cadeia. Para se ter uma ideia, nos últimos quatro anos, houve apenas uma rebelião no sistema penitenciário goiano, em 2021, e sem vítimas fatais e rapidamente controlada pela Polícia Penal. Hoje, o controle é do Estado, como deve ser.”
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