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Como a Justiça protege os animais de estimação

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Por Regina Beatriz Tavares da Silva
Regina Beatriz Tavares da Silva. Foto: Divulgação 

Em decisão recente do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), deste ano, foi fixada a obrigação de o ex-companheiro pagar as despesas dos animais de estimação adotados unilateralmente por ele e deixados sob os cuidados de sua ex-companheira.

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O casal se separou após ter convivido por quatro anos, período em que foram adotados pelo companheiro três cães, que acabaram ficando sob os cuidados da companheira. Após perder o emprego e ser despejado, voltou a residir com a antiga companheira até se reestabelecer.

Passados seis meses, o réu deixou novamente a casa, sem os três cachorros que adotou unilateralmente e não ofereceu qualquer tipo de suporte financeiro à ex-companheira. A autora, que criou laços afetivos com os animais, solicitou o pagamento do auxílio financeiro.

O auxílio para o sustento dos animais foi fixado em 15% do valor do salário-mínimo para cada um dos três cães adotados pelo ex-companheiro, o que equivaleu a 50% das despesas dos animais, com o direito assegurado a ele de visitar os animais (10ª Câmara de Direito Privado, relator desembargador Jair de Souza, votando no mesmo sentido os desembargadores Coelho Mendes e José Aparício Coelho Prado Neto).

A decisão sobre guarda e sustento de animais não é inédita, mas mostra a tendência da justiça em preocupar-se cada vez mais em proteger os pets, conforme determina a Constituiçao de 1988.

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Em outro julgamento do ano de 2016, foi ajuizada uma ação pelo ex-marido para a regulamentação de visitas a um gato que ficou na posse da mulher, embora o pet tivesse sido adquirido pelo casal durante o casamento. O gato, por ser um animal territorialista, mereceria o tratamento diferenciado que lhe foi conferido no caso, sem guarda alternada ou mudanças constantes de casa, mas passando alguns dias na casa do ex-marido e vivendo a maior parte do tempo na residência da ex- esposa (TJSP, 1ª Câmara de Direito Privado, relatora desembargadora Christine Santini, votando no mesmo sentido os desembargadores Claudio Godoy e Alcides Leopoldo e Silva Júnior).

Outro interessante acórdão foi proferido pelo TJSP em 2020. O cão Rody tinha sido adquirido por um casal, em comunhão de bens. Na disputa pela guarda, Rody não foi considerado como coisa a ser partilhada, como havia decidido um juiz de primeira instância, mas, sim, como um "senciente" (que percebe pelos sentidos), tendo regulamentada sua guarda alternada entre o ex-casal, atribuindo a cada um o direito de ter a guarda do animal em semanas alternadas.

No Brasil não há lei que regulamente a posse e o auxílio no sustento dos pets após a separação do casal. Por outro lado, aumentam a cada dia os litígios judiciais de disputa da posse ou guarda dos animais e para fixação do auxílio para o seu sustento.

Os animais de estimação e seus tutores, diante da falta de regulamentação legal, têm no Poder Judiciário as decisões mais variadas sobre a temática.

Claro, não podemos confundir animal com ser humano. No entanto, de acordo com os valores de uma nova era, não podemos esquecer da ligação afetiva que existe com os animais domésticos.

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O pensamento correto dos tribunais é de que o animal não pode ser objeto de partilha, como se fosse uma coisa. Há sentimentos envolvidos, o chamado afeto, que é recíproco, ou seja, do ex-casal pelo animal e do animal pelo marido e pela mulher. A proteção judicial deve ser voltada, portanto, às pessoas e aos pets.

A Constituição Federal, em seu art. 225, dispõe que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e que, para a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público proteger a fauna e a flora, vedando-se, ainda, qualquer prática que coloque em risco sua função ecológica, provoque a extinção de espécies ou submeta os animais a crueldade. Está aí, portanto, o fundamento constitucional da proteção dos animais no Brasil, inclusive dos pets.

*Regina Beatriz Tavares da Silva, pós-doutora em Direito da Bioética pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, doutora e mestre pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Fundadora e presidente da Associação de Direito de Família e das Sucessões (ADFAS). Advogada, fundadora e sócia de Regina Beatriz Tavares da Silva Sociedade de Advogados (RBTSSA)

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