Pelo menos 40 projetos de lei em tramitação no Congresso Nacional propõem mudanças na regulamentação das prisões preventivas. A maioria das propostas busca restringir garantias dos investigados.
A preventiva é uma modalidade de prisão que não tem prazo definido para sua vigência terminar. Ela é decretada nas hipóteses de tentativas de obstrução de investigação ou quando o suspeito oferece risco a testemunhas ou à sociedade e surgem indícios de que possa fugir ou destruir provas.
Um levantamento do escritório Campos & Antonioli Advogados Associados, compartilhado com o Estadão, identificou 24 projetos de lei sobre o assunto em tramitação na Câmara dos Deputados e 16 no Senado Federal - 38 textos têm por objetivo endurecer as prisões preventivas.
A maioria das propostas (12) busca flexibilizar a obrigação dos juízes de reverem periodicamente a necessidade de manutenção das prisões preventivas. O Código Penal determina que os magistrados analisem essas prisões a cada 90 dias.
O Projeto de Lei 619/2024, de autoria do deputado Eduardo Pazzuello (PL-RJ), que foi ministro da Saúde no governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), está entre os mais radicais. O texto busca extinguir a necessidade de justificar a prisão preventiva e a possibilidade de ela ser revogada.
Apenas um projeto de lei amplia as garantias do acusado ao sugerir a revisão periódica da prisão preventiva pelo juiz, independente de manifestação do Ministério Público ou da Polícia Judiciária.
Outros quatro projetos propõem ampliar as hipóteses para a decretação da preventiva. A legislação hoje autoriza a prisão preventiva para a “garantia da ordem pública, por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova de existência do crime e indícios suficientes da autoria”. Ela pode ser determinada em qualquer fase do inquérito policial ou da instrução criminal.
Um projeto apresentado pelo ministro Flávio Dino dias antes da posse no Supremo Tribunal Federal (STF), quando ele ainda não havia renunciado ao mandato no Senado Federal, propõe a criação de critérios objetivos para o juiz avaliar a periculosidade do investigado e justificar a decretação da prisão preventiva.
O texto foi aprovado pelos senadores na semana passada e segue agora para a Câmara. Os critérios são premeditação, suspeita de violência ou grave ameaça, participação em organização criminosa e possibilidade de reincidência, levando em conta a existência de outros inquéritos e ações penais em curso.
Para o criminalista Sérgio Rosenthal, mestre em Direito Penal pela Universidade de São Paulo (USP), a prisão preventiva deve ser reservada aos casos em que a liberdade do investigado traga “efetivo prejuízo” ao desenvolvimento da investigação ou da ação penal.
“Não se reduz a criminalidade por meio da decretação de prisões cautelares. Prender antes de julgar é uma medida extrema, que somente deve ocorrer nos casos em que isso seja comprovadamente imprescindível”, defende Rosenthal.
O criminalista Philip Antonioli, sócio do escritório responsável pelo levantamento, vai na mesma linha: “Endurecer penas de forma indiscriminada não contribui para a redução da violência.”
Leia também
O advogado Dinovan Dumas, especialista em Direito Penal Econômico, projeta que as propostas de reforma dificilmente serão eficientes se não levarem em consideração a aplicação da lei na ponta.
“Reformas que busquem apenas endurecer o sistema, sem considerar a eficácia e a justiça, podem resultar em mais problemas do que soluções, criando um sistema punitivo excessivo e ineficaz”, defende.
A maioria dos projetos foi apresentada depois da decisão do ministro Marco Aurélio Mello, aposentado do STF, que mandou soltar o traficante André do Rap, líder do Primeiro Comando da Capital (PCC), em outubro de 2020. A decisão gerou grande comoção e foi revista pelo STF. O traficante segue foragido.
Entre os partidos, o PL lidera as proposições, tanto na Câmara (7) quanto no Senado (4), seguido do União Brasil, com cinco projetos em tramitação na Câmara dos Deputados, e do PSB, com três propostas no Senado.
Veja o que propõem os projetos:
- Alteração da revisão a cada 90 dias;
- Ampliação da prisão preventiva para casos da Lei Maria da Penha;
- Ampliação das hipóteses para a decretação da prisão preventiva;
- Novos requisitos para a decretação da preventiva;
- Conversão da prisão em flagrante em preventiva;
- Hipóteses de vedação da preventiva.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.