Foto do(a) blog

Notícias e artigos do mundo do Direito: a rotina da Polícia, Ministério Público e Tribunais

Opinião | Corte no orçamento da educação paulista é retrocesso inconstitucional

A constituinte paulista legou ao povo um texto corajoso e arrojado em 1989. A PEC aprovada impõe seu apequenamento, sob frágil argumentação

PUBLICIDADE

convidados
Por Maria Izabel Azevedo Noronha e Élida Graziane Pinto
Atualização:

A Assembleia Legislativa de São Paulo aprovou, em 27 de novembro, Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que reduz a vinculação do orçamento paulista na Educação de 30% para 25%, o que significa uma perda de quase 11 bilhões de reais/ano.

PUBLICIDADE

A medida representa flagrante retrocesso, a impactar a vida de quase 4 milhões de estudantes, 234 mil profissionais da Educação, em 5.545 escolas estaduais.

Se apresentada aos eleitores dos deputados favoráveis à proposta, certamente seria reprovada. Educação pública diz respeito não apenas ao interesse das comunidades escolares. É pilar estruturante de projeto de nação e não por outro motivo figura como primeiro direito social consagrado no art. 6º da Constituição Federal.

A PEC é inconstitucional por violar o princípio da proibição de retrocesso, que impõe ao Executivo e ao Legislativo se absterem de revogar direitos já assegurados. Tal princípio vincula-se ao princípio da dignidade humana e, também, à diretriz de máxima efetividade dos direitos fundamentais, corolários do Estado Democrático de Direito. Não se pode ignorar que o direito à Educação é um direito social universal, insuscetível de manipulação orçamentária que restrinja sua efetividade.

O patamar de 30% da receita paulista nunca foi plenamente aplicado em manutenção e desenvolvimento do ensino. Em 2023, quase 8% do orçamento da Educação de São Paulo foi utilizado para cobrir rombo na previdência. É de se questionar, ainda, se o Estado não está, ao reduzir as despesas obrigatórias, reconhecendo a sua incompetência em executar o próprio orçamento, enquanto faltam investimentos urgentes.

Publicidade

Em 2023, apenas 39% das escolas do estado tinham rede wi-fi. Estudo encomendado pela APEOESP ao Instituto de Arquitetos do Brasil – seção São Paulo e ao DIEESE, em 2020, na pandemia da COVID-19, indicou que 80% das escolas não têm mais de 2 banheiros para os alunos, 13% não têm quadra ou ginásio e 11% não têm pátio para atividades ao ar livre.

Além disso, segundo dados do Ideb de 2023, São Paulo teve queda no desempenho dos estudantes do ensino médio, indo a 4,2 pontos, próximo da média nacional (4,1), e distante de Goiás, com 4,8. Os resultados das provas do Saeb do mesmo ano indicaram piora no desempenho dos alunos paulistas em português e matemática. As médias, respectivamente de 264,66 e 274,43, foram as menores desde 2017.

Tamanho é o retrocesso na expectativa de aprendizagem, que os egressos do ensino médio da rede pública paulista podem vir a demandar em juízo o direito à reparação do dano coletivo que têm suportado pela baixa qualidade do ensino no Estado mais rico da federação.

Sequer se alcançou o cumprimento das metas do Plano Estadual de Educação. A meta 17, por exemplo, comete ao Estado o dever de valorizar os profissionais do magistério de forma a equiparar, até o 6º ano de vigência do (2022) seu rendimento ao dos demais profissionais com escolaridade equivalente. A defasagem, naquele ano, foi de cerca de 25%.

A constituinte paulista legou ao povo um texto corajoso e arrojado em 1989. A PEC aprovada impõe seu apequenamento, sob frágil argumentação. Recursos para a Saúde podem vir da revisão de renúncias fiscais, muitas concedidas contra a Constituição Federal e a Lei de Responsabilidade Fiscal.

Publicidade

Que não se esqueça que se USP, UNESP e UNICAMP hoje são referências mundiais, foi porque o Estado de São Paulo lhes garantiu autonomia financeira. Por isso, com a aprovação da PEC, é certo que a ALESP abraçou o retrocesso muito antes de o estado alcançar indicadores educacionais de vanguarda.

Convidados deste artigo

Foto do autor Maria Izabel Azevedo Noronha
Maria Izabel Azevedo Noronhasaiba mais
Foto do autor Élida Graziane Pinto
Élida Graziane Pintosaiba mais

Maria Izabel Azevedo Noronha
Deputada estadual (PT-SP) e segunda presidente da APEOESP. Foto: José Antônio Teixeira/Alesp
Conteúdo

As informações e opiniões formadas neste artigo são de responsabilidade única do autor.
Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Estadão.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.