Os chamados “cursinhos” surgiram para o preparo de candidatos aos vestibulares, nos tempos em que se precisava disputar uma vaga na Universidade. Até o curso de Direito – imagine-se! – exigia cursinho preparatório. Também houve iniciativa de “cursinho” para o ingresso no segundo grau. O chamado “Vestibulinho”.
Mas eram propostas surgidas de professores idealistas, que queriam ajudar o alunado a ultrapassar barreiras. Houve quem mantivesse “cursinho” gratuito, na garagem da casa do professor. Puro altruísmo.
A empresa dos “Cursinhos” surgiu com a febre dos concursos de ingresso às carreiras jurídicas estatais. Partindo do pressuposto de que o bacharelado é um curso fácil, do qual se extrai um diploma seja ou não um bom aluno, alguns visionários enxergaram a possibilidade de concentrar os cinco anos em treinamento árduo dos candidatos à Magistratura e Ministério Público. Estas duas, principalmente.
Tornaram-se grandes empresas. E eram – ou são ainda? – muito eficientes. Garantiram a aprovação. Multiplicaram seus alunos. Estabeleceram franquias. Fizeram de seus donos empresários milionários.
É muito bom que haja empresas encarregadas de fazer alguém aprender. Nem sempre, a de fazer alguém decorar. Saber de cor toda a legislação, doutrina e jurisprudência produzida no Brasil não significa oferecer à sociedade um excelente profissional.
Agora, reformulam-se os “cursinhos” para fazer frente a um novo desafio, que é uma excelente oportunidade de faturar. A criação do curso unificado para a prova preambular de quem queira se tornar magistrado no Brasil. Anúncio do CNJ, que já elogiei e critiquei. É muito bom haver apuração de um mínimo. Todavia, mais decoreba de nada vale. Como avaliar sensibilidade, empatia, capacidade de comunicação, de adaptar-se ao inesperado, o respeito ao ser humano, compaixão, saber colocar-se no lugar do outro, em um curso preparatório?
Também o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos instituiu o seu CNU – Concurso Nacional Unificado. As 6.640 vagas para vinte e um órgãos do governo federal, sejam Ministérios, seja o IBGE, serão disputadas por aqueles que vencerem as questões distribuídas em oito blocos temáticos. Conteúdos similares direcionarão candidatos com vocação para certas áreas, mantida a possibilidade de disputa de mais de uma vaga em um único bloco.
Pensa-se, com isso, em conferir celeridade ao recrutamento de milhares de servidores públicos. A ideia é de boa inspiração. Mas poderia ser feito algo ainda melhor.
O Brasil, que gasta tanto com Fundos Eleitorais, Partidários, multiplica as emendas parlamentares para que o dinheiro do povo seja aplicado em escolhas do eleito, poderia criar uma Escola Nacional de Administração. Funciona na França e por ela passam todos os que pretendam trabalhar para o poder público.
Também os candidatos a cargos eletivos deveriam passar por ela. Um mínimo de conhecimento da máquina pública, de teoria geral do estado, de psicologia, de sociologia, de direito administrativo, de trato com o semelhante, deveria ser atributo de quem pretenda obter sua remuneração a partir do dinheiro do povo sofrido e extenuado de ofertar o fruto de seu trabalho para a voracidade do fisco.
Enquanto não se cria a Escola Nacional de Administração e Gestão Pública, ou qualquer outro nome que ela teria, aquelas verbas destinadas aos Partidos Políticos para manterem seus institutos de formação da cidadania poderiam ofertar essa formação. Não tenho tido conhecimento de que tais organismos estejam a funcionar como deveriam.
O constituinte de 1988 acenou com uma democracia participativa, diante da fragilidade da democracia representativa, em que é raro alguém se sentir efetivamente representado. E se não houver uma educação política, um aprendizado a cuidar da coisa pública, a se interessar pela exação e lisura no trato do dinheiro suado que é tirado da população por um pesado sistema tributário, não se chegará sequer a mera aproximação com esse ideal utópico.
Falei em “cursinhos”, porque esse o nome pelo qual são conhecidos. Alguns são cursos maiúsculos, verdadeiros cursões. Mas o apelido é que pega, não o nome técnico. Enfim, pensemos sobre o tema. É nossa obrigação cidadã.
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