A delegada da Polícia Federal Silvia Amelia da Fonseca foi exonerada nesta quarta-feira, 10, do cargo de diretora do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI). A demissão, assinada pelo ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, foi vista dentro da PF como uma represália ao andamento do processo de extradição do youtuber bolsonarista Allan dos Santos, do canal Terça Livre.
Em nota, o Ministério da Justiça e Segurança Pública afirmou que a troca de Amélia faz de "parte de ajustes naturais de equipe da nova gestão da Secretaria Nacional de Justiça", ligada à pasta. A Secretaria Nacional de Justiça é chefiada por Vicente Santini. Homem de confiança dos Bolsonaro, Santini foi secretário adjunto de governo até janeiro de 2020, quando foi exonerado por usar um voo da FAB para viajar à Índia. Depois, passou pelo Meio Ambiente e pela Secretaria-Geral da Presidência da República na condição de assessor.
O processo de extradição é um rito para dar cumprimento a decisões judiciais. A princípio, cabe ao DRCI apenas cumprir a ordem, além de outros procedimentos de cooperação com autoridades estrangeiras, como, por exemplo, para a recuperação de dinheiro bloqueado por suspeita de lavagem no exterior. Casos emblemáticos da Operação Lava Jato, como a descoberta das contas na suíça de Eduardo Cunha, ocorreram a partir de comunicações de autoridades suíças ao DRCI. O ministério não afirmou quem será o próximo titular do cargo.
Milícias digitais. No caso de Allan dos Santos, ele é alvo de um mandado de prisão e extradição do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). A decisão se deu no âmbito do inquérito das milícias digitais. O ministro acolheu um pedido da PF, que recebeu parecer contrário da Procuradoria-Geral da República. Em seu pedido, a delegada Denisse Rosas Ribeiro afirmou que Santos integra organização criminosa voltada à prática dos crimes de ameaça, incitação à prática de crimes, calúnia, difamação, injúria e outros, com o objetivo de auferir vantagem econômica oriunda da monetização e de doações e tendo como consequência a desestabilização do Estado Democrático de Direito".
Na PF, segundo apurou o Estadão, a ação foi interpretada como mais uma investida do governo em aparelhar os órgãos ligados à investigações. Um caso lembrado é o do delegado-geral Paulo Maiurino, que, pouco tempo depois de assumir o cargo, propôs a retirada da autonomia de delegados para investigar autoridades, em investigações mais sensíveis. A ideia é que estes procedimentos sejam controlados pela cúpula da PF. Pessoas próximas de Maiurino, porém, afirmam que esta centralização é necessária para que ao menos a cúpula tenha conhecimento destas investigações mais relevantes. Também afirmam haver exageros nas críticas à proposta.
Na semana passada, o presidente Jair Bolsonaro prestou depoimento no inquérito que investiga se ele tentou interferir nos trabalhos da Polícia Federal. Na oitiva, ele negou interferência na corporação e disse que o ex-ministro Sérgio Moro vinculou mudanças à indicação para o STF. A investida do presidente para tirar o então chefe da PF foi o pivô da crise que levou à saída do ex-juiz da Lava Jato do governo.
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.