Assim como todo problema traz consigo a própria solução, a Covid-19 gerou medos e inseguranças, mas deixou uma certeza: o mundo nunca mais ser o mesmo. Resta-nos, portanto, reinventar a vida e a nós mesmos. No século XVIII, o filósofo prussiano Immanuel Kant assegurou que "toda reforma interior e toda mudança para melhor dependem exclusivamente da aplicação do nosso próprio esforço". Passados 300 anos, a máxima tornou-se princípio obrigatório para qualquer atividade humana. Particularmente, a afirmação vale para advogados, escritórios de advocacia e departamentos jurídicos.
A pandemia isolou e matou milhões de pessoas, mudou as relações de trabalho, fechou escritórios, impôs a construção de novas práticas empresariais, a valorização de funcionários e a utilização de tecnologias digitais. No chamado mundo BUNI (Brittle, Anxious, Nonlinear, Incomprehensible), ganha relevância a gestão de pessoas 4.0, na qual a regra é o trabalho remoto e híbrido.
Dados do IPEA revelam que, após a Covid-19, o home office tornou-se rotina para mais de 7 milhões de brasileiros - 9% dos 80 milhões dos ocupados. Pesquisa Citrix, especializada em soluções de trabalho digital, mostra que 69% dos entrevistados aprovam o trabalho remoto. Já um levantamento da FGV aponta que o home office deve crescer 30% no limiar do "novo normal".
Seja como for, a gestão de pessoas tem papel fundamental, já que plataformas digitais permitem realizar de reuniões profissionais a confraternizações virtuais. Com a automação de processos e o surgimento da Inteligência Artificial, tornou-se primordial desenvolver uma mediação estratégica no conjunto de técnicas e práticas que ultrapassam em muito o conceito de RH.
Softwares de gestão, controladoria jurídica e um manual detalhado de regras, rotinas, fluxos e procedimentos - tanto de advogados do setor técnico quanto da controladoria jurídica - são indispensáveis. Tendência crescente relaciona-se à conformidade com conceitos ligados ao compliance, como o ESG. Negócios comprometidos com melhores práticas de gestão têm operação mais sustentável e acabam gerando melhores resultados.
Segundo a FGV, o trabalho em casa promoveu aumento de 15% a 30% na produtividade. A busca por esse quesito e pela qualidade dos processos impõe capacitação e treinamento. Tal prática requer olhar empático em relação ao funcionário e busca da melhoria da qualidade. Organizações e seus líderes devem conhecer a subjetividade de seus funcionários, sua realidade de vida, dores, angústias, inseguranças.
Note-se a recente enquete feita pela Associação Americana de Psicologia, segundo a qual 66% dos entrevistados relataram que problemas de saúde mental prejudicaram seu desempenho profissional. Pesquisa da OAB aponta que as mudanças no dia a dia levaram mais da metade dos profissionais do Direito (57%) a sofrer algum tipo de distúrbio psicológico. Desde o início da pandemia 71% sofreram diminuição de salário. Dois a cada cinco trabalhadores do setor foram demitidos.
Treinamento em inteligência emocional, novas habilidades, valorização da diversidade e fomento da cultura inclusiva são essenciais para o engajamento e conexão das equipes. Escritórios familiarizados com boas práticas de gestão e inovações tecnológicas ultrapassarão, com mais facilidade, um passado sem volta e embarcarão no futuro que chegou antes do que esperávamos.
A tecnologia não vai mudar o Direito, mas a prestação de serviços jurídicos. Digitalização dos processos,uso de técnicas de ciência de dados e de inteligência artificial e plataformas de acordos e de automação de documentos jurídicos são a alavanca desta transformação. Mas há etapas a cumprir. Faz-se necessário eleger o sistema de gestão de cada escritório, processo e das atividades estratégicas. Temos que determinar o modelo ideal para satisfazer as múltiplas formas de encarar o trabalho para, então, ter o ambiente tecnológico organizado.
O sistema dos escritórios será a central de relacionamento e de organização das informações. A partir disso, a tendência é o aumento da conexão de outras ferramentas tecnológicas de assessoria em suas diversas atividades. Serão muitos os reflexos no Direito e grandes as oportunidades para os profissionais que se especializarem em sua área de atuação.
Crimes cibernéticos, adequação às leis e diretrizes de proteção de dados, novos modelos de contrato de trabalho e home office, direitos do consumidor com a expansão do e-commerce, open banking e pagamentos instantâneos, entre milhares de outras possibilidades. A tecnologia, aos poucos, vai barateando e se democratizando. Hoje, advogados autônomos, pequenos e médios escritórios já dispõem de ferramentas digitais modernas e acessíveis para encarar o desafio digital.
A pandemia também potencializou a utilização das redes sociais como importantes instrumentos de atuação frente a um competitivo mundo empresarial. No que tange aos escritórios de advocacia, o marketing jurídico venceu a estigmatização. Hoje é reconhecido como estratégia legítima e necessária.
Nos anos 2000, quando o Orkut e o iphone engatinhavam, o número de internautas não ultrapassava 3% da população brasileira. Atualmente, segundo dados do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), são 134 milhões de usuários - 74% da população com 10 anos ou mais.
Como forma de enfrentar a nova realidade e divulgar seu trabalho, estabelecer um relacionamento proveitoso e duradouro com o cliente e dispor de informações de melhor qualidade, o advogado passou a atuar e pensar "fora da caixa". Facebook, LinkedIn, Instagram vêm sendo adaptados a uma nova linguagem e oferecendo conteúdo diferenciado. Permite-se ao cliente que conheça o perfil do advogado, que por sua vez toma ciência de suas necessidades; estreita laços com o cliente corporativo e abre diálogo com um novo público.
Nesse mundo novo caberá aos escritórios e advogados aprofundar suas estratégias de diferenciação. Para tanto, das dezenas de áreas do Direito devem se capacitar para escolher seus nichos de negócios. Os grandes advogados têm visibilidade e precisam possuir uma visão clara sobre seu posicionamento em relação ao mercado. Pequenos e médios escritórios poderão ser beneficiados pelo caráter democrático das redes e do marketing digital. Direito, tecnologia, negócios e comunicação estão construindo uma relação indissolúvel.
De forma inovadora, a Fenalaw Digital Week, maior evento jurídico da América Latina, aborda todas essas mudanças e novidades do mundo jurídico. Serão cinco dias de evento, três salas simultâneas de palestras com mais de 200 palestrantes. Além disso, será possível visitar o estande de mais de 30 expositores, para conhecer as melhores ferramentas e soluções para o seu negócio. Tudo isso de forma 100% digital, de 2 a 6 de agosto. Inscreva-se: www.fenalaw.com.br.
Este artigo foi fruto de um esforço teórico empreendido conjuntamente com Ísis Fontenele, mestra em gestão de pessoas; Katia Macedo, advogada e engenheira; e Samantha Albini, advogada e consultora especializada em negócios jurídicos.
*Alexandre Zavaglia Coelho é advogado e membro do conselho consultivo da Fenalaw
*Maria Juliana do Prado Barbosa é diretora da Fenalaw
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