‘Apadrinhado’ do deputado Júnior Mano (PSB), o prefeito eleito Carlos Alberto Queiroz, o ‘Bebeto do Choró’ - foragido da Justiça - protagonizou uma situação “furtiva” quando foi alvo de buscas no início da investigação que agora lhe imputa suposta ligação com um grupo criminoso responsável por ‘intricado esquema eleitoral’ no Ceará. Ao ser abordado pela Polícia Federal, na orla de Fortaleza, o prefeito arremessou seu celular, por cima de uma cerca, direto no espelho d’água de um edifício. O Estadão busca contato com a defesa de Bebeto e com o deputado.
A PF vê no gesto de Bebeto “tentativa evidente de ocultar provas e dificultar o acesso a informações potencialmente comprometedores à investigação”. A artimanha, no entanto, acabou frustrada - os investigadores recuperaram o celular de Bebeto.
As mensagens, com citação a seu padrinho político, fizeram a investigação ser remetida para o Supremo Tribunal Federal. O inquérito está no gabinete do ministro Gilmar Mendes, decano da Corte.
Júnior Mano, ex-PL, agora no PSB, estaria ‘diretamente envolvido’, segundo a PF, em desvio de emendas parlamentares para ‘alimentar esquema de compra de votos e consolidar sua base de apoio político’. Sob a tutela de ‘Bebeto do Choró’ o esquema se espalhou ao menos por 51 municípios do sertão cearense, dizem os investigadores.
A ofensiva do grupo de Bebeto para ganhar as eleições em dezenas de cidades cearenses foi revelado à Polícia Federal e ao Ministério Público Eleitoral pela ex-prefeita de Canindé, Rosário Ximenes. Ela contou detalhes do esquema de lavagem de dinheiro de emendas parlamentares para compra de votos. Rosário disse ao Estadão que durante as eleições foi ameaçada de morte. “As ameaças continuam chegando, vou pedir proteção à polícia.”
O Estadão mostrou que a PF chegou a um vigia, Maurício Gomes Coelho, com salário de R$ 2,4 mil, que constituiu uma empresa, MK Serviços em Construção e Transporte Escolar Ltda, com capital social de R$ 8,5 milhões. Maurício seria ‘laranja’ de ‘Bebeto do Choró’. A MK firmou contratos no valor global de R$ 318,9 milhões com ao menos 51 prefeituras.
A conduta “furtiva” de ‘Bebeto do Choró’ ocorreu durante a Operação Camisa 7, aberta em 4 de outubro, véspera do primeiro turno das eleições municipais de 2024. Em meio à tramitação do inquérito, que o envolve no esquema de desvio e lavagem de dinheiro de emendas parlamentares, Bebeto se sagrou vencedor na disputa à prefeitura de Choró com 5.971 votos.
O prefeito eleito, no entanto, teve a posse suspensa pela Justiça Eleitoral, no dia em que deveria assumir o mandato, justamente após a PF encontrar diálogos atribuídos a ele - inclusive um áudio em que “reclama do preço a pagar pelos votos, indicando que estava muito caro”.
Bebeto chegou a ser diplomado por procuração no último dia 14. Seu filho compareceu à cerimônia no Tribunal Regional Eleitoral para que o pai não fosse capturado pela PF.
O arremesso do celular de Bebeto ao espelho d’água foi flagrado por câmeras de segurança do prédio. Agentes federais haviam passado inicialmente na casa do prefeito, às 6hs, mas foram informados que Bebeto estaria ‘fazendo atividades físicas’ na Avenida Beira Mar. Os policiais, então, se dirigiram ao local.
Quando chegou à orla, a PF avistou o carro de Bebeto e se colocou em vigilância, esperando o retorno do político a seu veículo. Minutos depois, Bebeto foi avistado. Ele estava acompanhado de Cleidiane de Queiroz Pereira, sua irmã, que também é investigada. Assim que os agentes o abordaram, Bebeto arremessou o celular em uma tentativa de destruir evidências, segundo a PF.
Os agentes logo recuperaram o aparelho, que não sofreu danos aparentes apesar do impacto. A PF pediu a Bebeto a senha do dispositivo. Ele negou. Peritos federais têm especialização na técnica de abrir a memória de celulares e resgatar seu conteúdo.
O prefeito e sua irmã foram conduzidos ao apartamento onde moram para o cumprimento da ordem de busca. Lá, os federais apreenderam documentos, R$ 14,5 mil em espécie e manuscritos com anotações ‘suspeitas’.
Ao mesmo tempo, outra equipe da PF vasculhou um endereço ligado a Cleidiane, a sede de uma empresa de locação de veículos. No local, a PF encontrou pastas com documentos referentes a contratos com prefeituras cearenses. A PF recolheu algumas pastas, agendas e um computador.
COM A PALAVRA, ‘BEBETO DO CHORÓ’ E O DEPUTADO JÚNIOR MANO
A reportagem do Estadão busca contato com o prefeito foragido e com o deputado Júnior Mano. O espaço está aberto para manifestações (pepita.ortega@estadao.com; fausto.macedo@estadao.com)
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