A Polícia Civil de São Paulo entregou ao Supremo Tribunal Federal dossiê de 168 páginas com informações e identificação de lideranças e patrocinadores de atos considerados antidemocráticos. O documento, produzido pelo Departamento de Inteligência da Polícia Civil, cita políticos do interior paulista apoiadores do presidente Jair Bolsonaro e indica até chaves PIX que estariam sendo usadas para financiar bloqueios de rodovias em todo o País.
O relatório da Polícia paulista, acompanhado de cópias de boletins de ocorrência registrados em várias regiões, foi levado ao STF, acatando determinação do ministro Alexandre de Moraes, e faz parte da extensa coleção de papéis com dados sobre manifestantes que já foi encaminhada à Corte pelas polícias de outros Estados.
Os agentes da Polícia de São Paulo citam um grupo do Telegram batizado 'Resistência Civil', no qual o representante de um 'movimento' chamado 'Brasil nas ruas' pede, em vídeo, doações para manter os atos em Brasília.
Segundo a corporação, o grupo foi identificado durante 'ações de coleta de dados em fontes abertas e redes sociais com o objetivo de identificar financiadores de atos antidemocráticos no entorno de instalações militares do Exército'.
A Polícia Civil simulou uma transferência para a chave PIX citada na gravação publicada no grupo 'Resistência Civil', chegando a uma empresa de nome Goiás Entretenimento.
Documento
LEIA O DOSSIÊOs agentes ainda citam um website do suposto grupo, ligado a Leandro Muniz Ribeiro, 'político conhecido como Leandro Fox, ligado ao partido Democracia Cristã'.
Em Bauru, os agentes que monitoravam grupos do Whatsapp sobre o bloqueio na rodovia Marechal Rondon destacaram uma foto na qual 'pode constar dados de pessoa que poderia estar coordenando/financiando a manifestação'.
A imagem registra um cartaz com a inscrição 'Brasil Colaboração', uma chave PIX e o nome Michele Gomes.
No relatório remetido ao STF, a Polícia Civil paulista, sob comando do delegado-geral Oswaldo Nico Gonçalves, cita o nome de outros políticos.
A corporação fez menção ao candidato a deputado estadual pelo Republicanos Eliton Sousa Leite. Segundo os agentes, 'o autointitulado presidente nacional do "Movimento Pra Frente Brasil' foi identificado como um dos representantes de bloqueio na rodovia Raposo Tavares, altura do km 620, em Presidente Venceslau.
Ainda de acordo com os policiais, também participaram do ato vereadores do município que não foram identificados.
O documento faz menção à ex-vereadora de Presidente Venceslau Lucimara da Silva Dias que, segundo a Polícia 'discursou nos atos em frente ao Tiro de Guerra do município e esteve presente nos demais atos, participando ativamente e convocando seguidores em redes sociais'.
Além disso, o relatório registra que a Delegacia de Polícia de Osvaldo Cruz abriu um inquérito, a pedido do Ministério Público, contra o vereador Luiz Ricardo Spada Bonfim, em razão de possível prática de atos antidemocráticos. A investigação se debruça sobre suposta incitação ao crime, apologia de criminoso e associação criminosa.
O dossiê elaborado pela Polícia Civil de São Paulo se soma aos levantamentos feitos pelas Polícias Militar e Civil e também pela Polícia Federal em outros Estados, além de informações apresentadas pelos Ministérios Públicos estaduais.
Como mostrou o Estadão, os documentos indicam o perfil dos líderes e financiadores dos protestos com mensagens antidemocráticas, citando políticos, policiais e ex-policiais, servidores públicos, sindicalistas, fazendeiros, empresários do agronegócio e donos de estandes de tiro.
Eles não são formalmente acusados de crimes, mas poderão ser investigados.
Além da identificação de possíveis líderes dos atos considerados antidemocráticos, a Polícia Civil de São Paulo levou ao Supremo todos os registros de ocorrência lavrados pela corporação em meio aos dias marcados pelos bloqueios de rodovias.
Os atos tiveram início logo após a vitória do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O relatório cita, por exemplo, a prisão em flagrante de um colecionador de armas, além de um episódio em que manifestantes jogaram pedra em um ônibus escolar com estudantes que declararam apoio a Lula.
A prisão em flagrante por porte ilegal de arma ocorreu durante ato na rodovia SP 225, em Santa Cruz do Rio Pardo, no interior paulista. O boletim de ocorrência registra que, em conversa com os manifestantes, os policiais observaram que o preso 'possuía volume na cintura', tendo informado que se tratava de uma pistola 9mm e alegando ter registro como Caçador, Atirador, Colecionador (CAC) - grupo que cresceu sob o governo Jair Bolsonaro.
Segundo a Polícia, apesar de possuir registro da arma de fogo, o manifestante não estava se dirigindo a algum clube de tiro, 'portanto estando em situação irregular estabelecida pela legislação'.
O homem foi liberado após pagar uma fiança de R$ 4,2 mil. A arma foi apreendida.
Em Jundiaí, um jovem de 18 anos compareceu à Delegacia para narrar que foi alvejado por uma pedra jogada por um apoiador de Bolsonaro contra o ônibus escolar no qual trafegava após ele e seus colegas fazerem o 'L do Lula'.
Ele contou que estava no ônibus, que passou perto de um quartel do Exército na cidade, onde um ato estava sendo realizado. Na ocasião, ele e seus colegas começaram a gritar 'Ei Bolsonaro, vai tomar no...' e fizeram o gesto em apoio ao presidente eleito.
Em seguida, de acordo com a vítima, foi lançada uma pedra que atingiu o vidro lateral do veículo. O rapaz teve o supercílio esquerdo cortado. Depois, quatro homens entraram no ônibus, ainda segundo o registro de ocorrência. O jovem disse ter filmado a ação do grupo.
Em outro relatório, a Polícia de São Paulo indicou que na última quinta-feira, 10, no trevo de Pacaembu - cidade do interior paulista - 'no gramado para além rodovia e acostamento, sem interdição ou bloqueio da via, poucas pessoas aposentadas estavam sob uma tenda com bandeira do Brasil e um cartaz 'SOS FFAA', 'fazendo churrasco''.
Já em Penápolis, no dia seguinte ao segundo turno, a Polícia registrou o relato de um caminhoneiro que disse ter sido perseguido 'após furar o bloqueio de apoiadores de Bolsonaro'.
Outro boletim de ocorrência juntado aos autos foi registrado a pedido de um trabalhador autônomo, que disse 'prestar serviço' como motorista de uma empresa de transporte e logística. Ele afirmou que, 'em sua atividade laboral foi obrigado a parar no local dos fatos devido à paralisação dos caminhoneiros'.
Relatou que, durante a noite, 'cerca de '20 indivíduos, munidos de paus e barras de ferro, fizeram um arrastão levando mercadorias de vários caminhões que estavam parados no local'.
COM A PALAVRA, LEANDRO FOX
A reportagem entrou em contato, via e-mail, com o político. O espaço está aberto para manifestações.
COM A PALAVRA, LUIZ RICARDO SPADA BONFIM
A reportagem entrou em contato, via e-mail, com o vereador. O espaço está aberto para manifestações.
COM A PALAVRA, OS CITADOS
A reportagem busca contato com os citados. O espaço está aberto para manifestações.
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