Ao ganhar status de autarquia, a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), órgão que fiscaliza o tratamento de dados pessoais no Brasil, deixará de integrar a estrutura da Presidência da República.
A mudança consta em medida provisória assinada pelo presidente Jair Bolsonaro (PL) e publicada na segunda-feira, 13, no Diário Oficial da União. O texto diz que a agência passará a ter "autonomia técnica e decisória".
A ANPD foi criada em 2018, na esteira da aprovação da Lei Geral da Proteção de Dados (LGPD), como uma instância de supervisão da legislação. Outra atribuição é ajudar na criação de diretrizes para a política nacional de proteção de dados. Na época, uma das principais críticas ao projeto de lei foi justamente a vinculação do órgão técnico ao Planalto, o que na avaliação de especialistas poderia abrir caminho para interferências.
Advogados ouvidos pelo Estadão vêem com bons olhos a reestruturação. O entendimento é que a mudança ajuda a blindar a ANPD.
"A Autoridade Nacional de Proteção de Dados passa a ter os mesmos níveis de independência que outras agências brasileiras, como a Anatel, Anvisa e o Banco Central, com estruturas administrativa e financeira independentes" explica a advogada Antonielle Freitas, especialista em proteção de dados do escritório Viseu Advogados.
Segundo Nádia Cunha, coordenadora da área de Contratos e Compliance em Proteção de Dados do escritório Jorge Advogados Associados, a mudança já era aguardada. "Essa transformação segue o já adotado pela União Europeia, por exemplo, que possui organismos independentes", observa.
A advogada lembra ainda que a própria União está sujeita à fiscalização da ANPD e que a mudança traz mais independência para a atuação junto ao setor público. "A autonomia para executar todas as suas atribuições, inclusive em face do poder público, certamente trará uma atuação mais efetiva da Agência Nacional de Proteção de Dados", pontua.
Na avaliação de Marcelo Cárgano, advogado da área de Direito Digital do escritório Abe Advogados, as mudanças "não encerram a questão da independência da ANPD". "A MP recupera em parte o previsto no projeto de lei original da LGPD", explica.
Cárgano avalia que a independência é importante sobretudo em ano eleitoral. "Poderá a ANPD regulamentar de forma plenamente independente a aplicação da LGPD no contexto de eleições, por exemplo, estando vinculada à Presidência da República?", questiona.
A transferência, no entanto, não é automática. A MP prevê um período de transição, que ainda precisa ser determinado por ato administrativo, para o encerramento do apoio da Secretaria-Geral da Presidência da República à ANPD. O Congresso ainda precisa chancelar a mudança.
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