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Opinião|Estatizar empresas corruptas como sanção? Cuidado com a jabuticaba!

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convidado
Por Leopoldo Ubiratan Carreiro Pagotto

A partir de 2015, uma série de empresas envolvidas em investigações anticorrupção começou a enfrentar dificuldades financeiras quando o desmantelamento dos esquemas minou a credibilidade sobre a capacidade de honrar seus compromissos. Diante do prospecto da proibição de contratar com o Poder Público e das pesadas sanções previstas nas legislações brasileira e estrangeira, sua situação se agravou. Todas as empresas diminuíram de tamanho, algumas entraram em recuperação judicial, umas poucas foram à falência.

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Neste momento, surgiu uma tese um tanto peculiar quanto uma jabuticaba: por que não estatizar as empresas?

Desta forma, as empresas poderiam ser salvas, evitando-se a perda de empregos, preservando-se o know how e garantindo-se o ressarcimento do Poder Público pelos prejuízos causados. As empresas não seriam as culpadas pelos erros cometidos pelos seus proprietários e pelos seus diretores, de modo que a sociedade brasileira não deveria arcar com as dificuldades financeiras decorrentes da quebradeira generalizada. A cereja do bolo argumentativo se relacionava à punição: como as empresas eram vítimas de sua gestão irresponsável, apenas os seus proprietários seriam punidos com a perda da propriedade. Vida que segue!

A ideia ganhou força em eventos, palestras e artigos rapidamente. No clima político liberalizante vigente entre 2016 e 2022, a tese não logrou êxito na esfera governamental, ainda que tenha ganhado espaço para ser debatida nos meios especializados. Contudo, não foi apenas uma questão política que evitou o seu sucesso. O próprio mecanismo de autorregulação do mercado funcionou como deveria funcionar, o que ajudou a tirar o bode da sala.

Numa economia de mercado, empresas nascem, crescem e morrem. Empresas inovadoras surgem como furação e se tornam gigantescas. Por outro lado, empresas ineficientes de todos os portes, incapazes de atuar com eficiência, são excluídas todos os dias do mercado.

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Sem dúvida, a morte de empresas possui custos de transação para a economia e sociedade: contratos não podem ser cumpridos, obras são interrompidas, pessoas perdem seus empregos e o know how se desorganiza momentaneamente. Só que, num ambiente de liberdade econômica, os ganhos de uma economia eficiente rapidamente pagam os prejuízos da quebra da empresa. O empreendedorismo é rápido em identificar oportunidades e reorganizar os fatores que se desorganizaram. Havendo uma demanda por um certo serviço, surgirá alguém desejoso de ofertar aquele serviço.

Em certa medida, observando em retrospectiva, essa reorganização aconteceu em vários mercados brasileiros afetados. É verdade que muitos players ainda são os mesmos de 15 anos atrás: talvez, a intensidade não tenha sido tão severa, pois as sanções pararam de ser aplicadas ou foram menores do que se esperava. Mesmo assim, vários mercados parecem ter se modificado e os serviços continuam disponíveis como antes.

Agora, imagine-se se a tese jabuticaba tivesse sido vitoriosa.

Em primeiro lugar, as sanções deixariam de ter sido aplicadas, o que aumentaria ainda mais a sensação de impunidade. O Brasil já é um país no qual a confiança na efetividade dos contratos e no judiciário é baixa – por si só, este cenário já gera menos riqueza e prosperidade do que uma sociedade que honra contratos e possui um judiciário confiável.

Se nenhuma sanção em absoluto fosse imposta, as empresas não teriam incentivos para mudar práticas, nem mesmo para implementar o compliance. O risco de ser punido é importante para dissuadir a prática da corrupção. Com certeza, os retrocessos ocorridos durante a pandemia subverteram estes ganhos. Mesmo assim, existe latente a sensação de que o risco existe.

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Em segundo lugar, o argumento de que os custos de transação seriam altos demais também é equivocado. Ignora-se que a sociedade brasileira vinha pagando pela corrupção há décadas sem que ninguém significativo fosse punido. Multiplique-se o percentual de 3% de “comissão” dos contratos envolvidos no Petrolão por 10 ou 20 anos e surgirá o verdadeiro custo que o Brasil pagou. Isso sem falar nas oportunidades de negócios perdidas. Em outras palavras, desarticular a corrupção resultou num ganho de eficiência para o ambiente empresarial brasileiro, o qual se viu livre do “pagamento compulsório de participação”. As análises sobre os custos do combate à corrupção na última década simplesmente ignoram este aspecto.

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Esta jabuticaba somente surgiu porque existe um viés estatizante na sociedade brasileira, sempre disposta a enxergar no Estado uma solução milagrosa e sem custos. Há décadas, a visão estatizante equivocada tem gerado prejuízos ao país, onde muitos ainda acreditam que exista almoço grátis. Imaginar que a estatização melhoraria o setor parte de premissas que contradizem os melhores estudos anticorrupção – quanto mais participação estatal houver, maior será a corrupção na sociedade. Isso é mais sério quando se constata que o mercado pode fornecer e, de fato, já forneceu a uma solução totalmente aceitável para a reorganização de setores: empresas sairiam para que outras pudessem ocupar o espaço.

Seria bom que a tese não ganhasse força, apesar das inclinações estatizantes do governo atual.

Este texto reflete única e exclusivamente a opinião do(a) autor(a) e não representa a visão do Instituto Não Aceito Corrupção (Inac). Esta série é uma parceria entre o Blog do Fausto Macedo e o Instituto Não Aceito Corrupção. Os artigos têm publicação periódica

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Leopoldo Ubiratan Carreiro Pagotto
Advogado em compliance e anticorrupção, mestre e doutor em Direito Econômico pela USP, MSC in Regulation pela LSE. Foi presidente do Comitê Anticorrupção da IBA e, atualmente, é membro do Advisory Board da Integrity Initiatives Internacional
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